27. A traidora.

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Os mortos estavam comendo sua carne. Alice não podia sentir a dor dos dentes podres em contato com a sua pele, arrancando pedaços e fazendo o sangue jorrar, mas ela sabia que sua sentença tinha sido assinada, viu isso quando Rick pegou o filho nos braços e enviou seu último olhar de “sinto muito” antes de partir.

Alice estava morta, tudo se encontrava vazio e sem propósito. Mais uma vez, ela tinha perdido tudo o que mais importava, tinham lhe tirado um pedaço de seu coração. Ela não conseguia mais respirar e não sabia como se manter viva ou como incentivar seu coração a continuar pulsando com tantos pedaços em falta. Alice estava morta. Completamente e totalmente sem vida.

Alice já tinha “morrido” algumas vezes antes: Quando percebeu que sua mãe nunca iria buscá-la no orfanato, quando aceitou que seus pais adotivos deviam estar mortos, quando causou a morte de Joel e também quando perdeu Ethan. Mas a morte naqueles momentos tinha sido dolorosa, apodreceu seus órgãos e espremeu seu coração até que seu único reflexo fosse implorar para que a dor acabasse.

Dessa vez, a morte tinha lhe atingindo da maneira mais cruel possível: com o vazio. Alice não conseguia sentir absolutamente nada, seu corpo e sua mente estavam adormecidos. Nada doía, nada a deixava triste ou com raiva. Tudo era vazio, um enorme e torturante vazio que a fazia esperar por nada mais, nada menos que a morte. Ela queria morrer, seu subconsciente implorava por isso mais do que tudo no mundo, mas ainda assim a morte não veio, -afinal, o mundo nunca tinha sido justo com ela- em seu lugar, um grito estridente e agonizante de criança a atingiu tão profundamente que ela seus ossos doeram apesar de sua incapacidade de sentir dor.

Alice agora estava viva, o desespero em seu corpo comprovava isso. Os gritos de Maeve estavam-na mantendo naquele estado.

Os mortos estavam atrás de Maeve e ela não tinha como se defender, era uma presa fácil, rodeada por centenas de predadores. Alice não podia protegê-la dessa vez, não podia salvá-la contra todos aqueles monstros e as duas sabiam disso.

Foi então que tudo se provou contrário. Alice se moveu em direção á garotinha e os mortos que a rodeavam se afastaram. A cada passo em direção à Maeve que Alice dava, mais uma dezena de mortos-vivos abria caminho para sua passagem. Eles não pareciam respeitosos ou com medo, mas sim enojados. Fugiam de Alice como se ela fosse uma doença da qual eles não queriam se infectar. Irônico considerando que eles quem eram os doentes, muito mais irônico ainda considerando que a pouco, queriam sua carne.

De qualquer forma, não importava o que era o causador do afastamento dos mortos, estava sendo extremamente útil para Alice. Ela então agarrou Maeve pelo braço e puxou contra si antes que um dos monstros enfiasse os dentes podres no belo rosto da garota. O ato fez o morto-vivo encarar Alice, os olhos de um tom amarelo doente cheios de ódio.

– É, seu monte de carne podre, eu quem mando aqui. – Berrou Alice, encarando o bicho de volta. Ela se sentiu um pouco louca naquele momento, mas de que importava? Ela era louca mesmo. – Maeve, eu vou te levar para um lugar seguro, ok? Mas você precisa ficar comigo o tempo inteiro.

– E os monstros?

– Eles não vão encostar em você. – Alice garantiu. – Confia em mim?

– Sim, eu confio, Ali. – A pequena Maeve assentiu, então Alice começou a andar, guiando a garotinha até a enfermaria enquanto quase todos os mortos abriram caminho para elas passarem.

E os que não abriam caminho? Alice os matava com brutalidade, irritada com suas tentativas falhas de tentarem tirar dela a única coisa que importava naquele momento.

Quando finalmente alcançaram a enfermaria, não precisaram nem ao menos bater na porta, porque Denise já a tinha aberto. A mulher as puxou para dentro com tanta urgência que quase caíram no chão.

𝐋𝐞'𝐑𝐨𝐮𝐱 - 𝐂𝐚𝐫𝐥 𝐆𝐫𝐢𝐦𝐞𝐬.Onde histórias criam vida. Descubra agora