12. O amigo.

93 5 4
                                    

- Alice, volta aqui! - Gritou Daryl enquanto andava em passos rápidos na minha direção.

Continuei andando. Afinal, o que ele poderia querer comigo? O que qualquer um deles poderia querer comigo depois de me ver daquele jeito, fazendo aquelas coisas?

Eu lembrava muito bem do meu primeiro dia no orfanato. Estava usando um vestido azul bebê com rendinhas delicadas na barra e nas mangas, o cabelo em duas tranças e amarrado na ponta com fitinhas azuis. O disfarce perfeito para um pequeno monstrinho.

Lembro de como as moças do orfanato e as crianças -em especial Helena, a mais velha de todas- ficaram felizes com a minha chegada e não pararam de me admirar naquele vestido bonito e penteado fofo. Mas também me lembro de como durou pouco.

"Ruiva maluca", "Chucky", "Ruiva assassina", "Maluquinha", "Louca de pedra", esses eram apenas alguns dos muitos apelidos que surgiram dentro do orfanato e se espalharam até chegarem nas vizinhanças e na escola. Depois de algumas semanas, todos me tratavam como uma doença. Eu era desprezível e quem não me odiava, tinha medo de mim.

Aos seis anos cometi o meu primeiro ato de agressão oficial. Jesper Evencard tinha cantado para Minnie, uma das minhas irmãs do orfanato -que inclusive me odiava como todas as outras- uma música autoral que dizia: "Menina macaco, cara de carvão. Gentinha igual você deveria ir pra prisão". Talvez não fosse culpa só dele, talvez fosse apenas o reflexo de seus pais ou algum parente, mas naquele momento aquilo não importou. Eu peguei uma pedra e bati em sua têmpora três vezes. A pedra era pequena, então não causou tanto dano além da cascata de sangue que escorreu pelo seu rosto.

Apenas alguns minutos depois eu já estava na delegacia ouvindo um sermão sobre como era errado machucar as pessoas.

Idiotice! Eu pensei enquanto ouvia o sermão infinito. Jesper que tinha começado.

Mas se eu soubesse naquela época que aquela agressão acarretaria em outros confrontos e esses confrontos me dariam uma segunda voz na cabeça, eu não teria ignorado as palavras daqueles policiais.

Oito dias depois, Kate Willows me empurrou do balanço do parquinho. E apesar de todos terem visto que ela quem tinha começado, eu fui a única punida por empurrar de volta.

Mais e mais casos como esses aconteceram, alguns tão graves que renderam não só uma longa conversa com os policiais e minhas responsáveis do orfanato, mas também idas constantes ao psicólogo.

Ele não me ajudava, é claro. Acho que ouvir seu psicólogo dizer que você era mentalmente desequilibrada e que precisava de tratamento intenso enquanto você ainda era só uma garota de 6 anos não era a melhor forma de ajudar ninguém a melhorar.

Com os históricos de agressões e surtos de raiva sem fim, eu rapidamente me tornei a criança menos provável de ser adotada e aquilo só serviu como combustível para toda raiva que eu sentia. Era doloroso saber que além da minha mãe ter me deixado, outras pessoas também nunca iriam me querer. E apesar de ser totalmente culpa minha, eu não conseguia mudar como eu era. Eu era assim, tinha nascido assim. Eles não podiam me curar, nem diminuir a dor que eu sentia por ter sido abandonada.

Mas quando minha quase mãe adotiva apareceu com seu sorriso bonito, sua pose confiante e sua personalidade que a fazia parecer um pouco mais louca que eu, a raiva diminuiu um pouco. É claro que ainda ocorriam agressões, mas menos recorrentes e naquela época, quando aconteciam, ela me defendia.

Isso fez com que todos pensassem que eu tinha alguma salvação. Até eu mesma pensei isso! Mas nunca pude descobrir se a possibilidade era real.

De qualquer forma, acho que não era, afinal, eu tinha experimentado o gosto de ter uma família, o cuidado e amor de Joel e Ethan e ainda assim eu continuava sendo quem eu sempre fui: uma garota louca, impulsiva, explosiva e cruel. A garota que todos tinham medo ou odiavam.

𝐋𝐞'𝐑𝐨𝐮𝐱 - 𝐂𝐚𝐫𝐥 𝐆𝐫𝐢𝐦𝐞𝐬.Onde histórias criam vida. Descubra agora