Capítulo 4

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Outono de 2022

Os raios de sol, ainda tímidos e pouco convincentes, tentavam ganhar alguma vantagem sobre as nuvens escuras e carregadas da noite chuvosa, e Walkiria já estava no seu pátio alongando as pernas para a corrida habitual pelo vale. Respirou profundamente e agradeceu pela enésima vez por estar ali. Nada tinha sido fácil e parecia que à medida que evoluía, as coisas ficavam ainda mais difíceis, mas a satisfação de ter chegado ali, de ver seu sonho tornando-se na mais perfeita das realidades, superava qualquer obstáculo. Ela estava mais forte e firme e sabia que para manter viva a sua realização, teria de muitas vezes, transformar-se numa fera incompreendida, mas sempre valeria a pena.

--Zuri, ei Zuri...- Procurava seu vira-lata e fiel companheiro de corridas matinais e não só, mas dele nem sinal. – Está bem, vou sozinha.

Desceu a ladeira onde ficava seu loft e embrenhou-se pela área social do seu tesouro. Era assim que se referia a Pedras do Vale, seu pequeno hotel na serra de Rui Vaz. Àquela hora, ainda tudo era muito calmo e o que se ouvia eram os seus passos no chão de pedrinhas e os passarinhos na sua melodia matinal. Podia correr por meia hora e voltar a tempo de ajudar Diana no mise en place do café da manhã. No hotel, tinham optado por servir apenas o café da manhã e um lanche tradicional aos hóspedes. Talvez, mais para a frente, poderiam pensar num serviço de pensão completa, mas por ora, era a melhor opção. Os quartos eram todos equipados com cook top e outras facilidades para quem quisesse confecionar as próprias refeições. Na vila tinha alguns restaurantes bons e assim todos se ajudavam.

Saindo dos limites de Pedras do Vale, subiu em direção ao Monte Txota. O ar puro da montanha era sempre um aperitivo a mais para suas corridas. Pelo caminho, cruzou com alguns locais que estavam na lida do campo, bem como turistas que também adoravam uma caminhada madrugadora. Fez o seu percurso normal e ao atingir a meta, notou que melhorara seu condicionamento físico. Sorriu feliz, afinal, não fosse a corrida e o saco de boxe que tinha instalado no meio do seu pátio, não teria tempo para praticar qualquer desporto. O dia-a-dia no hotel era quase sempre desafiador, e era seu principal foco na vida. Todo o resto vinha em segundo plano e isso muitas vezes, quase sempre, lhe causava dissabores, mas seguiria no seu ritmo que com certeza, chegaria a bom porto.

Meia hora mais tarde, entrou nos limites do hotel e a passos largos, dirigiu-se á cozinha. Lá estava Diana às voltas com suas preparações deliciosas. Walkiria suspirou de satisfação. Mais uma escolha acertada, apostar nos jovens recém-formados e que os estabelecimentos da capital não absorviam por não terem experiência.

--Bom dia, Diana!

--Bom dia, dona Wiki. Já estou com as tarefas bem alinhadas.

Realmente, pela cozinha já se distinguia os aromas maravilhosos dos preparados de Diana. O cheiro de café fresco e bolo no forno, ah, que bálsamo.

--Tratas tão bem esses hóspedes que eles têm dificuldade em sair da mesa de café. E nós daqui, precisamos ter cuidado para não pecar pela gula. Eu, já perdi a conta da lista dos meus pecados.

A moça riu muito, enquanto seguia frenética nos seus preparos. Walkiria, prontamente, ajudou com a decoração campestre que sempre tinham o cuidado de dispor nas mesas.

--Bom dia, dona Wiki.

--Bom dia, Luís. Chegaste cedo...

--Ah, consegui uma boleia e não quis perder a oportunidade. Vou lá ajudar a Diana e depois volto para cá.

Walkiria sorriu enquanto terminava a última mesa. Luís, o atendente de sala, assim como Diana, era recém-formado da escola de hotelaria e morador do interior. Sua equipa era muito boa. Ainda bem.

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