II

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 Um dia inteiro de caminhada. Ao chegar em uma das pequenas casinhas idênticas do campus onde seria sua nova residência, só pôde se deitar, já considerando faltar seu primeiro dia.

 Céus, Sakusa já não tinha mais cabeça para nada. Ele só queria dormir e acordar desse pesadelo terrível. Fechou seus os olhos, deixando os pensamentos o possuírem.

 O que ele tinha no dia seguinte mesmo? Oh, ele tinha um plantão no hospital. É mesmo, a equipe estava precisando de gente de novo, e Sakusa já era um médico veterano, muito confiável e competente. Sim, ele estaria muito ocupado no próximo dia... Onde acordaria em sua cama... Acordaria bem...

 Sakusa acordou com um leve toque em sua porta, tão tímido que fora quase inaudível, então se levantou mal-humorado e foi atender a porta. Não que ele não fosse uma pessoa matinal ou algo assim, ele só odiava ser acordado, principalmente quando seu corpo todo estava dolorido e ele continuava naquele jogo.

- Senhor Sakusa? M-me desculpe acordá-lo! Sou Hitoka Yachi, aluna da Academia. - Demorou alguns segundos para Sakusa processar aquela luz ofuscante do sol e as palavras rápidas saindo da boca de uma garota de cabelos loiros a sua frente.

- Hm, prazer... Em que posso ajudar? - Ele se lembrou de ser gentil e ofereceu sua mão, que foi apertada tão fracamente que ele quase não sentiu o toque da garota.

- Fui enviada para ajudá-lo a se encontrar na Academia. D-desculpe a intromissão! E-eu só achei que poderíamos ir um pouco cedo para eu poder te mostrar alguns lugares, se o senhor desejar. - A garota despejou todas aquelas palavras nele, quase sem pausas entre elas. Sakusa ficou tonto.

- Eu acho que... - Espere. Yachi? Hitoka Yachi? Por Deus.

 A tímida Yachi, pesquisadora da Academia e futura melhor amiga da protagonista. Se ele não estivesse enganado, Yachi trabalhava como enfermeira por conta de sua bolsa, e seu real motivo para estar na Academia era pesquisar sobre alguma coisa importante para a história. Sinceramente, ele não tinha prestado muita atenção nisso quando leu sobre a personagem.

 Sakusa esfregou os olhos, tentando focar no rosto da jovem, que o olhava em expectativa.

- Deixe-me só... Hm, eu acabei de acordar e... - Sakusa coça a nuca.

 Ele estava realmente sem jeito. Nunca foi de socializar com qualquer um, seu círculo de amigos era reduzido por esse motivo.

- S-sem problemas! - Ela ficou com as bochechas rosadas, o que era, para todos os efeitos, muito fofo. Mesmo que não se interessasse por garotas, ele entendia objetivamente o motivo do fascínio que a maioria dos rapazes tinha por elas.

 Sakusa não se demorou ao se lavar em algo que os desenvolvedores juram não ser um chuveiro elétrico, mas sim um aparato mágico que esquenta e libera água. Seu corpo, para a surpresa de Sakusa, era idêntico ao original. Além disso, reparou em como aquele poder parecia... silencioso.

 Talvez receoso em aparecer de novo devido a reação de Kiyoomi ao percebê-lo. Ótimo, pelo menos ele não teria que se incomodar com aquilo, pelo menos não por agora.

 Felizmente, seu dormitório inteiro parecia preparado para todas as suas necessidades, visto que tinha até mesmo trocas de roupas de seu tamanho, além de um armário com alguns lanches. Tudo muito conveniente, mas Sakusa não reclamaria disso.

 Ele vestiu o uniforme da Academia, surpreso pela qualidade da costura. Em sua vida, Sakusa não poderia dizer que vivia de forma abastada, mais por sua personalidade do que qualquer coisa, porque tinha um bom salário como médico. Entretanto, ainda assim era estranho ter um estilo de vida da alta sociedade, como era conhecida a Academia.

 Kiyoomi se perguntou quando ele havia começado a pensar racionalmente sobre essa loucura que estava acontecendo com ele.

 Talvez na caminhada até a Academia, que ficava ao lado dos alojamentos. Ou antes ainda, ao trocar algumas palavras com Yachi sobre a viagem que fizera de sua vila até o campus e descobrir que a garota era uma boa pessoa. Ele havia pulado a maioria dos diálogos com ela por não a ter achado muito interessante, mas agora ele meio que se arrependia.

 A Academia era quase que um castelo. Sakusa nunca foi muito de filmes de fantasia, mas sabia de onde vinham essas referências. Ainda assim, a estrutura era imponente, e Sakusa se sentiu medroso ao enfrentar aqueles quilômetros de torres e corredores e salas e...

- Ela é linda, não é? Eu também me apaixonei de primeira vista. - Yachi falou de forma sincera, apreciando o ambiente.

 Alguns estudantes passaram por eles, mas parecia bem pouco movimentado. Eles passaram pela entrada, a qual levava a um jardim interior que, em poucas palavras, era gigante. Ligados a esse jardim, haviam corredores pela direita, esquerda e pelo meio, passando pelo centro dele, o qual continha uma ponte, que se mantinha por cima de um lago, e então ia até o outro lado do jardim, onde havia uma grande escadaria, e o encontro dos caminhos dos dois extremos.

- Sabe, a botânica é muito apreciada hoje em dia.

 "Você sabia que todas as plantas daqui foram cultivadas por estudantes?" Sakusa se lembrou da próxima fala dela.

- Você sabia que todas as plantas daqui foram cultivadas por estudantes? - Deuses, isso era bizarro.

- Hmm. - Sakusa tentou não parecer muito assombrado.

 Yachi o guiou pelo corredor que passava ao lado do grande jardim, deduzindo que Sakusa não estava muito interessado nele.

- Estas são as primeiras salas de pesquisa. São laboratórios públicos que você pode usar a vontade, caso marcar um horário. - Yachi seguiu em frente ao passar por algumas portas de vidro. Sakusa conseguiu um olhar de dentro das salas, e imediatamente se arrependeu ao se deparar com algum experimento que um aluno estava fazendo, que aparentemente explodiu.

- ...Isso é muito normal, na verdade. - Yachi hesitou. - Bem, a biblioteca do primeiro andar a direita, assim como todos os equipamentos daqui, são destinados a pesquisas envolvendo feitiços e química no geral.

 Ela então passou por um aro, ignorando uma saída para fora do castelo, a qual Sakusa se lembrou ser a entrada para os jardins externos, e então eles estão na parte de trás da entrada principal. Sakusa percebeu que eles deram a volta ao se deparar com as escadas. Aquilo tudo era apenas a parte leste do primeiro andar. Céus, Sakusa poderia passar semanas dentro desse castelo e não se entediaria por um segundo. Não que ele quisesse ou pretendesse fazer isso, é claro.

 Yachi de repente parou e pegou algo de dentro do seu bolso. Ela olhou para o pequeno relógio e arregalou os olhos.

- Puxa vida! Eu nem reparei no horário! Vamos, vamos, é hora do reitor fazer seu discurso. Por aqui. - Então ela subiu as escadas intermináveis, e Sakusa não viu escolha senão segui-la.

 Aquilo era estranho. Sakusa tinha certeza de que havia tempo o suficiente para que o primeiro passeio mostrasse a protagonista a parte oeste da Academia. Talvez... Sakusa havia se demorado até começar de fato o passeio com Yachi.

 Sakusa havia mudado pequenos detalhes da história, e ele não sabia como se sentir sobre isso. Bem, porque ele parecia importar para os acontecimentos.

 Mal, porque não parecia mais um sonho.

Acordei em um jogo otome mesmo sendo homem!Onde histórias criam vida. Descubra agora