XIII

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 Sakusa se espreguiçou, procurando forças para ir à Academia no estado que estava. Não apenas psicologicamente, seu corpo ainda reclamava pela agitação do dia anterior.

 Ele foi até a bancada buscar algo para comer até perceber algo diferente em sua mesa. Como estava distraído com Motoya, não havia reparado na pequena cesta com pães e frutas, com um pequeno bilhete dentro. Sakusa levantou uma sobrancelha, deduzindo quem deveria ter deixado o café da manhã.

 "Omi, desculpe por sair cedo. Tome o dia de hoje para descansar, amanhã nos veremos para sua primeira aula!"

 Ele não havia concordado com isso. Porém, seu coração acelerado não queria discordar do convite. De irritação, ele disse a si mesmo, enquanto mordia impacientemente um sanduíche.

 Durante seu café da manhã "irritado", Sakusa percebeu que ele precisaria de um plano. Ele não sabia se o vilão iria agir da mesma forma que o jogo, mas ele estava certo de que ele existia e que estava planejando alguma coisa. Talvez ele conversasse com Atsumu sobre isso... ou Ushijima, que deveria ter sido a primeira sugestão de seu cérebro idiota. Agora, como ele poderia dizer que sabia do futuro catastrófico de Lovellin sem parecer um pirado? Ushijima seria do tipo que respeitosamente o internaria. Atsumu provavelmente o levaria a sério, mas isso se deve porque ele também é um pirado.

 Existiam videntes nesse mundo? Sakusa poderia inventar essa tendência, mas ele não seria capaz de sustentar essa mentira por muito tempo, até porque ele sabia os acontecimentos de apenas daqui a um ano, mais ou menos. Pelo seus conhecimentos, não haviam magos com prazo de validade, e ele não queria ter que explicar para o Rei e a Rainha que depois de um tempo ele não serviria para nada.

 Ok, nada de vidência.

 Então, o jeito seria dar sugestões bem convenientes nos momentos certos. Não para que o achassem um gênio estrategista, apenas o suficiente para evitar o pior. Porém, como diabos ele faria isso?

 Antes que pudesse matar mais seus neurônios, Sakusa ouve uma batida em sua porta. Motoya havia esquecido algo...? Ele da uma olhada na bancada e não encontra nada, então da de ombros e atende a porta.

– Sim?

– Senhor Sakusa. Fico feliz que está bem. – O tom do capitão foi de alívio.

– ...Ushijima. – Sakusa cumprimenta, de repente muito envergonhado pelo sua roupa, que foi a primeira coisa que tinha achado antes de atender Motoya e era um pouco... bem, era um pijama.

– Perdoe-me por aparecer tão cedo. O senhor Kageyama me contou dos acontecimentos da noite passada, e eu recebi um relatório do príncipe pela manhã que... – Ele franze o cenho e balança a cabeça, se cortando no meio de sua fala. – Vim verificar se você estava bem.

– Hm... eu estou. – Deuses, Sakusa se sentia terrivelmente tímido.

 Era fácil falar com Ushijima quando ele tinha plena certeza de que voltaria para casa. Agora, ele sabia que suas falas tinham peso, que a impressão que causava era a que ficava. A pressão e o nervosismo se fizeram presentes, criando um sentimento ruim no coração de Sakusa.

– Talvez você queira ir para a Academia? Eu te acompanho, se não se importar. – Ushijima, sempre protetor, sempre prestativo.

 Kiyoomi queria chamar Ushijima para dentro, mas seu alojamento estava uma bagunça para seus parâmetros, e ele... bom, ele estava vivo. E bem, provavelmente.

– Me dê um minuto. – Então Sakusa fecha a porta antes de pensar que isso seria rude.

 Ele não se importou, entretanto, se lançando para seu quarto para se arrumar rapidamente com as roupas da Academia. Ele talvez não devesse se sentir ansioso, mas nada tirava de sua cabeça que ele teria uma espécie de encontro com o capitão. Sakusa merecia se sentir animado uma vez ou outra.

 A caminhada, no entanto, não apenas matou como enterrou e cuspiu em cima de sua animosidade. O que Sakusa achou que seria um andar tranquilo até a Academia, com ligeiros comentários e um clima gostoso, parecia mais um interrogatório. Ushijima pareceu ter achado a oportunidade perfeita para perguntar sobre detalhes da noite passada, usando um tom que provavelmente foi ensinado pela guarda, um que apenas Sakusa pudesse ouvir. Somado a sua cara neutra de sempre, Ushijima poderia estar falando amenidades e ninguém saberia.

 Além disso, a companhia parecia mais como uma escolta, mesmo sendo plena luz do dia e tivessem várias pessoas nas ruas. Algumas cumprimentavam Ushijima, com sorrisos obviamente cortejadores, e o capitão respondia a todos pelo nome com um aceno de cabeça. Sakusa nem conseguiu se sentir enciumado porque essas pessoas, na verdade, eram sua folga da enxurrada de perguntas que Ushijima o fazia.

 Sakusa fingiu se sentir aliviado, se sentir protegido por ele. Ele estava ficando bom em fingir, de qualquer forma. Não deveria haver tanto mal, talvez algum dia ele mesmo acreditasse nas próprias mentiras.

 E foi com esse pensamento que se separou de Ushijima, que apenas acenou com sua cabeça em despedida e entrou na Academia.

 Ele achou que seria mais fácil, pra ser sincero, mas aguentar todas as perguntas de preocupação de seus colegas foi complicado, mesmo que tenha esquentado um pouco seu coração vê-los felizes que ele estava bem. Exceto por Kageyama e Hinata, que ficaram atrás da pequena multidão, lançando olhares furtivos e culpados. Hinata fazia uma leve carícia no braço de Kageyama, tentando acalmar os dois.

 Depois de Sakusa ter pensado que conseguiu escapar de todos, ele esbarra com os dois no corredor.

– Viemos pedir desculpas. – Eles falaram simultaneamente, se olhando depois e ficando vermelhos.

 Era fofo demais para Kiyoomi aguentar.

– Vocês não... eu não os culpo pelo que aconteceu. – Sakusa não sabia o quanto ele deveria revelar para seus colegas, mas ele definitivamente não os deixaria se sentirem culpados. – Aconteceria de qualquer forma, foi só um... gatilho de algo ruim que aconteceu.

 Os olhos dos dois se arregalam. Hinata parecia estar quase lacrimejando.

– Nós não sabíamos! D-desculpe, senhor Sakusa!

 Kiyoomi suspira ao perceber que eles ignoraram o que ele havia dito antes e se preocuparam na pior parte.

– Está tudo bem, vocês foram legais em me deixar participar de sua aula e acabou acontecendo um acidente. No fim, foi bom que tenha sido cedo. – Eles franzem as sobrancelhas, os movimentos tão espelhados que se fosse outro momento Sakusa acharia graça. Convivência era algo engraçado. – De novo: está tudo bem.

– Mesmo? – Kageyama fala, a voz alterada.

– Sim. – Então Hinata sorri e o abraça e ok, talvez seja demais, mas ele parecia se sentir melhor com isso, então Sakusa fez uma exceção e deixou que Hinata o segurasse por um segundo antes que Kageyama o puxasse de volta.

– Não seja idiota, Shoyo! Deixa ele em paz!

– Ei! Não fique com ciúmes, Tobio. – Hinata faz beicinho, o que parece irritar mais ainda Kageyama.

 Sakusa encontra nessa cena mais íntima do que ele aguenta a chance de ir embora, então o faz, deixando a dupla sozinha. Os dois pareciam mais aliviados de qualquer forma, então tudo bem.

 Kiyoomi poderia se sentir mal por não ir às aulas, mas ele tinha literalmente uma carta real que o dava permissão para descansar. Ele não estava com cabeça para estudar, e, bem, a Academia os dava liberdade de escolher como utilizar seu espaço, o que Sakusa o fez com a atividade que mais encheu seus olhos naquela manhã: explorar.

 Ele descobriu a existência de outras bibliotecas menores do que a principal, com conteúdos específicos de cada região do castelo. Sakusa respondeu timidamente aos cumprimentos de alguns alunos que os reconheceram pelos corredores, e Sakusa descobre que ele pode muito bem viver assim. Viver naquele lugar. Ele só precisava descobrir como.

 Como continuar a estudar na Academia quando Atsumu descobrir por si próprio que Sakusa era um desastre com magia e que ele não merecia metade do investimento de sua família. Como derrotar um maldito supervilão e salvar Lovellin. Como descobrir o que seu coração ansiava a cada segundo que passava naquele lugar. Uma amizade? Um amor? Uma... vida?

 Mas, principalmente, como perdoar a si mesmo por estar nessa situação e ter escolhido ficar, assim como se desfazer do sentimento de traição a sua antiga vida.

 Ele descobriria. Provavelmente.

Acordei em um jogo otome mesmo sendo homem!Onde histórias criam vida. Descubra agora