Capítulo 19: Gota d'água

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(Amanda)

22h:14min – Sábado

Não podia sequer ficar brava com o Rick. Ele não está tão errado assim, mas sei que se ele soubesse de tudo pelo que passei, o pensamento dele mudaria.

Eu só não estou pronta pra falar sobre isso com outra pessoa, ainda não. É intimo demais, é perturbador demais.

Um dia quem sabe eu consiga, mas agora a única coisa que eu posso fazer, é abrir coisas que estão dentro do meu ambiente seguro. Dentro do que acho confortável e fácil de digerir e processar.

— Sei que está querendo me ajudar e que na sua visão talvez fosse mais fácil se eu colocasse tudo que guardo pra fora. Só que não dá. Acho que só posso te dizer que o Osmar acha que eu devo algo a ele, algum tipo de satisfação, só porque "cuidou" de mim depois da morte dos meus pais. — faço questão de fazer as aspas, porque ele pode ter me dado um lar, porém, não foi cuidadoso comigo de maneira nenhuma.

A minha tia, a minha avó e a Tamy, sim. Elas foram amáveis, gentis, me acolheram bem. Se preocupavam comigo de verdade. Eu devo a elas, não ao Osmar.

— Na verdade, eu tinha as mulheres da minha vida pra fazer isso no lugar dele. Só que eu aprendi na marra a me virar sozinha. A me cuidar sozinha, a lutar da maneira que eu podia pra lidar com tudo de ruim que eu havia passado. — expliquei baixinho enquanto chutava a grama.

Eu não conseguia olhá-lo agora, porque eu estava um pouco envergonhada e de certa forma exposta por estar falando sobre a minha vida pessoal.

Não sou de fazer isso nem com as minhas amigas.

Ricardo está tendo uma parte de mim que eu se quer permiti que as minhas amigas tivessem, ele está tendo a sorte de eu estar desabafando, porque viu pessoalmente a tensão desagradável lá na festa.

Caso não tivesse presenciado nada, eu ainda estaria na defensiva, sem falar um A sobre a minha vida.

— Então, você meio que é a guerreira que luta contra seus próprios demônios, é isso? — Rick perguntou com curiosidade e quando me forcei a olhá-lo, ele estava com um sorrisinho tranquilo no rosto.

Mal sabe ele o quanto de tempo eu venho gastando da minha vida travando essa batalha.

— Diariamente, meu caro. Se eu não enfrentá-los com as minhas próprias mãos, quem os enfrentaria por mim? — falei óbvia e dei de ombros ao voltar o meu olhar para o céu estrelado e para a lua minguante.

— Eu, definitivamente. — Rick soou tão convicto e eu tive que olhá-lo com a testa franzida. — O que? Eu não me importaria de sair com alguns arranhões se for para ajudá-la.

Acabei rindo baixinho do seu semblante descontraído.

Ricardo está com aquele olhar típico de um garotinho, que acha mesmo ter a capacidade de passar por cima dos desafios mais complexos, só pra salvar a donzela em perigo.

— Isso só funciona nos livros e nos filmes. A vida real não é assim, infelizmente. — digo com pesar e observo os vagalumes.

Parecem estrelas alcançáveis, é tão lindo de se ver. Ver todo o brilho vindo deles. Queria poder ter o meu brilho de volta.

— Posso fazer uma pergunta pessoal? — Rick parecia bem inseguro quanto a isso e eu apenas assenti, esperando pelo que viria a seguir. — Se for doloroso demais, não precisa dizer nada. Só queria saber como eram os seus pais.

Tento puxar na memória todas as boas lembranças que tenho deles. Tudo que ainda conseguia lembrar com clareza.

— Eles eram incríveis. Dona Liliane vivia contando histórias para mim antes de eu dormir, era extremamente doce, carinhosa, esperançosa e o Seu Manoel me incentivava no que dizia respeito a música, no que dizia respeito as minhas inseguranças, sempre enaltecia a minha força. Os dois eram os meus heróis. — sorrio com a lembrança.

Minha doce melodiaOnde histórias criam vida. Descubra agora