Capítulo 21: Pegar a estrada

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(Ricardo)

11h:01min – Domingo

Mal consegui dormir depois do que houve de madrugada.

Sei que em algum momento, o que eu fiz foi um tipo de gatilho pra Mandy. Só queria saber o que foi, pra eu não fazer mais.

Fiquei acariciando seus cachos, tentando buscar sozinho respostas para a atitude arisca que a Amanda teve.

Parte de mim soube o que poderia ter lhe acontecido, mas era demais para digerir, pra suportar, principalmente quando uma das últimas coisas que a Amanda falou pra mim foi que estava suja, que precisava de outro banho.

Mas não deixei-a sair de perto de mim e, com a permissão dela, peguei-a no colo e coloquei-a gentilmente sobre a cama de casal. Ela estava tão frágil, toda encolhida sobre o colchão que eu não conseguiria me manter distante, mesmo que fosse um desejo dela.

Sendo assim, fiquei com ela o tempo todo. Velando o sono da Mandy, que por incrível que pareça adormeceu nos meus braços enquanto chorava baixinho.

Foi terrível vê-la tão desestabilizada daquela maneira. Algo a apavorou e a enojou.

Não consegui discernir se era nela mesma ou com relação a quem ela viu no meu lugar. Só queria poder ajudá-la de alguma forma, tirar um pouco da dor que carrega.

Entretanto, eu sabia que não devia forçar a barra, essa conversa tinha que partir dela. Quando se sentisse segura e pronta pra isso.

É tão difícil pensar nisso enquanto a olho.

Desde de que acordou a Mandy sequer olhou para mim. Mesmo que eu tenha dito que ela não tinha porquê se envergonhar, não adiantou.

Então, olhá-la ao meu lado na mesa de café da manhã da chácara dos tios, com várias pessoas em volta e notar o quanto a Amanda parece tensa, inquieta, distraída, desconfortável e constrangida, parte o meu coração.

O silêncio estava insuportável.

Não somente entre nós dois, mas parece que toda a família resolveu se silenciar. Não sei se é costume deles comerem sem trocar ideia, mas eu precisava falar algo. Estava incomodado demais.

Levei um pouco de bolo de laranja com cobertura açucarada até a boca e resmunguei satisfeito, ganhando toda atenção pra mim.

— Está delicioso! Quem fez? — questionei, curioso.

Vi de soslaio a Mandy relaxar um pouco na cadeira, aliviada. O clima ao menos agora pode ficar mais agradável, assim eu espero.

— Eu. — Dona Viviane ergueu o indicador e sorriu orgulhosamente.

— A tia e a vovó são excelentes doceiras. Elas têm um negócio próprio em Paulínia. — Amanda falou docemente, ganhando um sorrisinho carinhoso das duas mulheres a nossa frente. — E você prima, como andam as coisas?

Tamy limpou a boca com um guardanapo e pareceu imensamente feliz por ter a atenção da Mandy voltada pra ela.

— Ando fazendo alguns trabalhos voluntários na região. Venho ensinando as modalidades de dança que aprendi ao longo dos meus 29 anos para crianças dos abrigos de Campinas. — ela falou, orgulhosa.

— E tem sido uma motivação pra você? Pra ficar distante do que você falou comigo noite passada? — resolvi puxar assunto também, o que pareceu surpreender todos na mesa.

— Sem dúvidas. Me mantém afastada de coisas que só me afundam. — Tamires olhou significativamente para a Amanda e elas pareciam conversar pelo olhar.

Minha doce melodiaOnde histórias criam vida. Descubra agora