Acordo naquele sábado com uma onda de energia que há tempos não ocorria. Se estivesse no Rio, pegaria o carro, iria para a praia junto de Diná e deixaria o som do mar e o gosto de maresia acalmar meu coração acelerado.
02:54 - Sen. Simone Tebet - M... - "Duas colheres de camomila, uma colher de mel. 🍵"
A mensagem de Simone pela manhã me deixa com um sorriso bobo durante todo o dia. Inacreditável que a mulher fez um chá quase três horas da manhã.
Não resisto em responder que anotei suas dicas.
Depois do café da manhã e de ler o jornal como faço todos os dias, junto minhas chaves e rumo ao supermercado, decorando no caminho a lista de compras.
Decido, com a grande sorte de Simone gostar de italiano, a fazer um macarrão que aperfeiçoei ao longo do tempo com tomates de diversas variações.
Exclua o marido dela, por favor.
Não resisto em comprar a camomila como sua mensagem disse e muito menos o mel, colocando-os no carrinho. Compro um vinho, um manjericão fresco para o molho e um pote de sorvete de chocolate que parece uma delícia.
Em poucas horas estou em casa, o apartamento se enche de música para afastar a solidão e quando vejo o sol sumindo por minha sacada, envio uma mensagem para Simone.
"A localização é esta, você já está autorizada a subir. O número é o 708. Você sabe, jantar italiano não espera. 20h. 😅"
Aos poucos começo a preparar a cozinha, limpo o balcão da ilha e deixo todos os tomates limpos e picados em tigelas separadas.
Com tudo pré preparado, tomo um longo banho, visto meu jeans de ficar em casa, relaxo os pés contra o piso frio e frente ao espelho, penteio os fios tão claros de meu cabelo.
É, a idade chega. E quem diria que um homem, adultos e tão vivido como eu pudesse sentir emoções novas como um adolescente, um jovem se apaixonando como pela primeira vez.
Admitir aos meus próprios pensamentos que isso com Simone passa de atração, é capaz de fazer um rebuliço em meu estômago e uma desordem gigantesca em minha cabeça.
Só não se perca no meio do caminho, peço a mim mesmo com gentileza pelo reflexo.
Visto a camisa as pressas, abro as janelas da varanda um pouco mais e mergulho na tarefa de fazer um jantar decente, agradável e inesquecível para minha querida.
Naquela manhã, acordo com o gosto de camomila na boca. A imagem de uma Simone se vendo fora do corpo me assusta, me fazendo observar o redor do quarto e logo o celular, confirmando que o que vi, não foi uma ilusão.
Hoje, nesta noite, eu seria de Alessandro.
Isso já era um fato consumado. Mas não era isso que me assustava, ou que me deixava com todos os cabelos pelo corpo eriçados... Era o não saber como eu seria, como meu corpo se comportaria, se eu saberia... Sentir.
Era estranho se desconhecer.
Acredito, em uma grande metáfora, que eu era uma flor, abrindo, florindo, colocando pétala por pétala para ver o sol e de repente fui amarrada, impedida de crescer.
Meu medo ia de despertar dentro de mim um ser que não pudesse controlar, uma pessoa que não conheço o bastante ou pior, uma total desconhecida. Como seria a minha vida, o casulo que criei? Desmoronaria eu mesma?
Levantei da cama quando o fel se formou em minha língua. Decidi por um banho.
Quando liguei o interruptor das luzes, meu celular vibrou na cabeceira e não pude evitar regressar para ver o que era. E era ele.
Havia uma mensagem de Alessandro na tela de meu celular.
07:25 - Dep. Alessandro Molon - Anotado ✍️✌️
Senti rugir dentro de mim o ser adormecido.
Naquela manhã optei por uma chuveirada rápida, prender os cabelos em um coque e cozinhar.
Durante a tarde, me empolguei vendo fotos antigas de minhas filhas, da época de faculdade, um pouco de minha própria história.
Procurei formas de esconder a solidão com uma solitude sincera.
Ao fim da tarde, me deliciei com um fio de Luz na persiana, o filete de sol tocando-me as bochechas em um banho de flores e óleos.
Com um roupão, dedilhei as roupas na arara, agarrei o vestido marrom com força contra mim. Teria que ser esse.
Destaquei com cuidado as etiquetas de uma lingerie comum, o que eu realmente usava durante o dia na mesma cor do vestido e sem conseguir evitar, puxei as meias sete oitavos pelas coxas, suavizando qualquer coisa que me incomode por ali. Encaro meu reflexo de corpo inteiro no espelho. Não me gosto. Bem, me gosto, mas... Branca demais, flácida demais, com manchas demais...
O brilho dourado em minha mão reflete contra o espelho e meu olhar para diretamente lá. Estico minha própria mão, observo a aliança brilhar na luz amarela e me pergunto, vale além do material?
A maneira como ela desliza fácil para fora me surpreende. Não dói, não machuca, e o desenho ainda mais pálido deixado como rastro por ela me faz ofegar. Esfrego uma mão na outra, seguro o ouro em mua das palmas e o aperto, soltando-o em seguida na borda do espelho deixando quilos de uma condenação e desatando as amarras de uma fera.
Frente ao espelho novamente, encaro meu reflexo e respiro fundo, o brilho em minha pupila intenso e profundo.
Eu via, rugindo, gritando, a fera que insistia em despertar e ao lado dela, uma mulher controlada que já não sabia mais a controlar. Era o fim do mundo. O céu cairia sobre mim.
O vibrar contra a bancada de mármore me mostra a tela acessa, uma nova mensagem dele, sempre galanteador e alegre, com seu endereço e o horário que me espera.
E quase uma hora depois, encaro minhas bochechas rosadas novamente no reflexo, nem a pouca maquiagem escondendo o rubor contra a pele.
Perfumo meus pulsos e abaixo da orelha com meu perfume habitual, fecho os olhos e respiro fundo.
Se acalme, Falo pra mim mesma. Você não é mais uma adolescente, Simone, suspira minha cabeça. Giro a chave na porta, chamo o motorista e lhe envio a localização.
Agora é tarde demais para recuar. Já não consigo parar de correr... E como previsto, parece ser em direção a ele.
Dentro do carro, as luzes brilhando intensas nas ruas de Brasília parece um bálsamo. A luz sem calor mesmo assim faz minha pele brilhar, um ardor similar ao queimar do sol. Não posso deixar de sorrir e revirar os olhos... O que sinto se chama ansiedade, e queima como brasa dentro de mim, implorando por uma única lufada de ar para queimar inteira.
É assustador.
Quando chegamos em poucos minutos na localização, coço meu dedo onde minha aliança deveria estar. O que parece um porteiro sorri pra mim, me abre o portão e me deseja boa noite. Ele me acompanha porta a dentro, pressiona o botão do elevador e eu apenas agradeço honesta.
Dentro do cubículo, mal conseguia respirar.
Parecia tão calor.
Poucos andares, não é o fim do mundo.
Em um fechar de olhos, uma Simone esvoaçante parece correr sem olhar pra trás.
A Simone do lado de fora respira fundo com o plim do elevador, sussurra, baixo como uma prece, o seu desejo mais insano.
Corra, Simone... Não pare de correr.
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Em Nome do Argumento - Simone e Alessandro - Simolon
Fiksi PenggemarDentre as quatros paredes prestes a desabar de um casamento já em ruínas, Simone escuta atenta a confissão do marido sobre a quebra de uma única promessa feita entre os dois. Diferente da imagem pacífica que a sociedade tem sobre ela, o sangue da m...