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Harry estava sentado em um pequeno banco de pedra. As mãos apoiadas ao lado do corpo e um olhar distante, de diversos modos.

Enquanto esperava que alguns parentes de Sara se juntassem a ele para a cerimônia de funeral, o pensamento persistente em sua mente causava nele uma comoção diferente.

Ao longo do tempo, ele nunca se imaginou nessa situação.

Harry era um jovem nascido e criado em favela, e por mais que soubesse que perdas eram parte de seu futuro incerto, ele não imaginava que aquilo era o que havia sido reservado a ele.

E não dizia somente em relação a Sara.

Perder sua melhor amiga era não apenas difícil, era impossível de se aceitar, embora ele soubesse que uma situação como aquela poderia ocorrer, como de fato sucedeu.

Não era difícil compreender a sua morte, mas certamente a ideia de que quem primeiramente o apoiou e fez planos junto a ele, por toda uma vida, não o veria cumprir seus sonhos e nem poderia alcançar os seus próprios.

Sara era tão adequada à realidade e otimista de que em algum momento eles viveriam uma fase melhor, uma vida tranquila, que Harry fielmente acreditou que estaria ao seu lado sempre.

No entanto, embora os últimos dias que levou para compreender a perda, embora não a tenha feito de modo ideal, ele também pode concluir algo.

Até o momento em que sofreu esta real perda, ele não tinha ideia, ou ao menos não a levou em sério, de que a sua vida estava girando e girando, em uma mesma velocidade inquieta, como se tudo estivesse se repetindo infinitamente.

E não dizia por falta de emoções, mas sim que, embora ele e Louis tivessem feito planos alguns próprios, e ele mesmo tivesse planos para si, não sabia dizer em que momento os acontecimentos pararam de ter algum sentido real e se tornaram sucessões que ele unicamente se limitou a aceitar.

Seu objetivo sempre foi abandonar aquela vida no complexo e poder construir-se fora daquela realidade, mas após a chegada de Louis em sua vida de fato, parecia ter fixado-se naquele lugar de modo eterno.

Harry o amava e amava todo seu cuidado e tudo o que Louis fez por ele, cada pequeno detalhe de amor que foi demonstrado de maneira real, mas ele não conseguia entender em que momento os acontecimentos da vida de Louis se misturaram a sua, o fazendo perder a noção de rumo e tempo.

Seus objetivos e ideias não eram as mesmas e ele sempre soube disso.

Mas na tentativa de ambos se adequarem um ao outro, com propósito de ficarem juntos, todas as questões momentâneas foram empurradas "com a barriga". As coisas sucederam e pessoas vieram para sua vida sem que ele asimilasse e tivesse um entendimento sobre aquilo.

E agora se sentia sem rumo.

Era como se estivesse eternamente vivendo os últimos meses.

Ou como se sua vida fosse uma história de trinta e seis capítulos, onde o final estava próximo e ele ainda não havia se encontrado.

Porque na realidade, os fatos surgem na vida de alguém, sem ordem e rumo, e tendem a aceitá-lo sem realmente ter uma pretensão de um futuro. E às vezes a percepção de tempo é deixada.

E recobrada de modo brusco onde se é obrigado a pôr os pés no chão. No caso de Harry, aquela perda o trouxe a realidade de fato.

Se sentia confuso agora.

Ele ergueu a cabeça, vagamente observando um grupo de pessoas conversando na área coberta. Ainda era cedo pela manhã.

Harry suspirou profundamente, seu olhar a todo momento analisando os rostos, cada expressão que contava algo diferente sobre o momento.

COMPLEXO 18Onde histórias criam vida. Descubra agora