- VI - LINO

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Lino passava as anotações dos papéis para o computador. Lúcia, uma mulher alta de cabelo moreno, entrou e caminhou até ele.

— Vai comer alguma coisa, enquanto isso deixa eu checar essa última parte.

Lino se levantou, a envolveu pela cintura e a beijou. Ele dizia a Lúcia que ela havia se tornado a segunda mulher mais importante de toda a vida dele. Ela perguntou quem era a primeira, e ele disse: minha mãe.

Ela compreendeu.

— Deve ter sido muito difícil pra você superar a perda dela sendo tão pequeno. Você até hoje não é de falar muito, nem de tocar no assunto. Às vezes penso que você já esqueceu.

Enquanto Lúcia falava, os olhos de Lino, por duas vezes, desceram se desviando do rosto para o pescoço dela. Ele passou a língua sobre o lábio inferior, contendo o fio de saliva que deslizava contra a sua vontade. Ouviu ela terminar de falar e permaneceu sem disfarçar seu desejo inconsciente por cada uma das jugulares. Com seu olhar vazio, parte dele voltou a si, ele precisava dar uma resposta.

— Eu nunca vou me esquecer quando aquele carro virou na esquina e parou do nosso lado. Ela estava ao telefone falando com alguém, parecia que já sabia, estava ansiosa. Os homens desceram e a levaram. Fiquei desesperado, sem saber o que fazer ali sozinho na rua, então fui andando para um ponto de ônibus. Encontrei um homem e pedi que ele ligasse para a polícia. Eu não me preocupei em decorar a placa do carro. Ele ficou comigo no ponto de ônibus tentando me acalmar, disse ter um filho da minha idade, então o carro de polícia chegou, e aí veio a adoção.

— Você não me contou que tinha ido para outra família.

— Eu pedi para eles me devolverem. Durou poucos dias. Acreditava que ela ia voltar, que me procuraria no orfanato e que viveríamos juntos de novo.

Lino ameaçou entrar em prantos, Lúcia disse se aproximando:

— Seja forte, você sempre terá a mim.

Ela o abraçou.

Ele pôde sentir o cheiro dela de forma perigosamente próxima.

— Sempre. — ela repetiu o confortando.

Lino estava na faculdade sentado na segunda fileira. Absorto, olhou para sua própria mão, ela suava. Um calafrio percorreu sua espinha.

Saindo da aula, encontrou Lúcia em um corredor. Contou a ela que na última noite os pesadelos haviam sido mais conturbados.

— Minha visão fica turva às vezes, um pouco de tontura. — ele se queixou.

— Você acha que consegue dirigir até em casa? — Lúcia perguntou.

— Consigo.

— Minha última aula hoje é para a turma de biologia. Devo chegar à noite.

— Pegou essa turma pelo quarto período seguido.

Ela sorriu.

— Assim você não consegue mesmo esconder seu favoritismo. — Lino brincou.

— Eles já sabem que são meus favoritos, deixei claro que a cada período eles têm me surpreendido, disse a eles que espero que eles não me decepcionem e que não quebrem o rito. — Lúcia falou sorrindo.

— E eu não fui suficientemente bom pra você mudar seu favoritismo para o pessoal da nuclear?

— Não me faça achar que suas dores são uma desculpa pra você ser mimado hoje.

— Você faz eu esquecer a dor por um momento.

— Entendi. — Ela sorriu novamente.

— Pede um táxi, assim fico menos preocupada.

Lino assentiu com a cabeça.

Eles se abraçaram brevemente sem trocar palavras, partiram cada um para um lado. Após dar alguns passos, Lino olhou para trás, Lúcia estava se afastando, ele viu que ela também olhava, mandou um beijo, que foi retribuído.

O sol ressaltava tons loiros em seu cabelo. Caminhou pela calçada até que chegou ao semáforo onde aguardou. Estudantes passavam atrás dele em diferentes direções. As árvores criavam uma sombra em frente ao prédio de tons alaranjados, repleto de janelas de batentes brancos, a grama escura crescia entre as frestas do pavimento. Os jovens conversavam sentados em bancos de concreto sob as árvores.

— Lino! — Um colega se aproximava correndo por trás dele

Ele se virou.

O rapaz desacelerou e parou perto dele.

— Oi, então. Eu vim te avisar que estão acabando as vagas pra visita à Angra. Você vai querer ir?

Lino olhou para o alto, indeciso, pensando se não estaria ocupado naquele dia.

— Você tem o convite? — perguntou.

O rapaz mostrou a Lino uma folha, ele a pegou e olhando rapidamente percebeu ser um formulário para preencher seus dados.

— Então tá fechado. Eu vou. — Ele se despediu enquanto fazia sinal ao táxi que se aproximava.

Em sua casa, escrevia sentado na mesa próxima à janela. Feixes de luz entravam através da cortina rendada da sala, propiciando uma iluminação confortável.

"Após dias de transtorno causado pela obra nas tubulações sobre a catedral do Rio, passado um mês, hoje os motoristas encontram um trânsito melhor. E também é notícia: A aprovação do governo aumentou vinte por cento em relação ao último levantamento, dados indicam que as pessoas estão se sentindo mais felizes na região central do Rio de Janeiro." O repórter falou na TV ao fundo.

Sobre o braço do sofá, logo atrás de Lino, havia uma revista. Lia-se na capa: CORREIO TERRÁQUEO — "Por que o Brasil precisa de tanto urânio?" Lino leu em um dos subtítulos ao folhear a revista sentado no sofá.

Lúcia entrou e largou a bolsa na cadeira mais próxima. Se dirigiu ao sofá em que Lino estava. Eles ficaram ali conversando sobre os sonhos conturbados que ele vinha tendo. Ela queria saber os detalhes, fazia perguntas. O celular na mão. Dizia como já não se lembrava quando foi que o que sentia por ele se tornou algo tão intenso.

— Eu me lembro. Pra mim, foi no exato momento em que nasci. — Ele romanceou. — A verdade é que estava tudo escrito, que um dia eu e você estaríamos aqui, juntos. Eu já nasci te amando, e continuarei te amando até o último dia da minha vida.

Eles se envolveram.

Uma parte de Lino julgou se o aroma dela era suficiente recompensa, ou se deveria divorciar-se dela em troca do prazer vermelho que percorria aquelas veias.

O noticiário prosseguiu com uma enxurrada de informações: "A seca continua em Manaus e nas regiões vizinhas ao estado do Amazonas."

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