- VII - Elizabeth

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Desde que deixara a escola, manteve suas memórias, com sua então colega de classe, guardadas para que o destino os colocasse no caminho de uma aventura.

As trocas de olhares após se encontrarem na AEB foram tão inevitáveis quanto aos passeios ao lago recheado de peixes-prateados, que deixava mais bela a paisagem do gramado envolto por um cobertor de enormes árvores latifoliadas de um verde-escuro. Que fazia as folhas que vez ou outra se desprendiam dos galhos contrastarem com o verde-claro do tapete, no qual eles se sentiam confortáveis ao se deitarem, e até mesmo rolarem abraçados.

Após alguns contratempos, a gravidez de sua amada fez com que Diego tivesse que reencontrá-la, coisa que os dois desejavam em silêncio, com medo de que os pavores trazidos pela condição de Diego pudessem afetá-la, além dos estragos que haviam feito aos dois. O término se deu após constatarem que o perigo seria sempre constante. Onde quer que Diego fosse, seu passado de alianças traiçoeiras sempre fazia com que ele precisasse se dedicar particularmente em manter seu aliado e a si mesmo vivo, mais que qualquer pessoa que levasse uma vida corriqueira e dentro da lei.

Elizabeth, filha de Diego, costumava estar sempre sorridente, era esperta e em alguns momentos exalava um ar de seriedade. Não admitia que o pai continuasse se escondendo ou em segredos para com ela. Já sou muito adulta! Dizia a pequena de onze anos.

Ela fez questão de aguardar na entrada para o porão onde seu pai havia se trancafiado há algum tempo. A pequenina achava que ele escondia algo dela após seu retorno à Terra. Antes que seu pai desembarcasse, ela passava pela frente da porta de madeira clara e sequer se questionava o que haveria ali embaixo. Chamou por sua mãe, ansiosa que só. Foi até o quarto onde a encontrou deitada na cama.

— Ninguém mais pode entrar lá. — a mãe tentou explicar novamente.

A pequena se contentou que não conseguiria autorização para ir atrás de seu pai.

Alguns dias passaram. Somente após suspeitar que não era um sonho, Elizabeth se queixou, amedrontada, com sua mãe que ouvira um ronco que se repetiu por algumas noites vindo do porão. — Escuto todo dia, cada dia mais alto, cada dia fico com mais medo. Não quero mais dormir sozinha.

A mãe envolveu o rosto de Elizabeth a abraçando e esfregou a raiz de seus cabelos com a ponta dos dedos, na tentativa de a confortar. Não disse nada à pequena, mas foi contar a Diego. Ela é criança, tem imaginação fértil.

— Pois é, eu sei. Mas o problema é que eu também ouvi. — ela disse jogando um tom de mistério na conversa. — Eu não sei o que foi, não era uma pessoa, era muito grave, com muitos erres, uma mistura de francês com alemão.

— Eu estava assistindo a um vídeo. Devo ter colocado o som alto demais.

— Diego, desde quando você entende alemão?

— Não era alemão, eu... nem sei qual era o idioma. Querida, não sei o que te dizer, me desculpe por assustar vocês, eu... prometo que vou tomar mais cuidado.

Diego deu passos apressados em direção a Roberta e a envolveu em um abraço. Ela o abraçou segurando a parte de trás dos braços dele, buscando nele uma proteção.

Elizabeth se escondeu atrás da bancada da cozinha, após seguir seu pai recém-saído do porão. Descobriu que ele guardava as chaves debaixo da capa do botijão de gás. Pegou a chave após ele sair pela manhã, enquanto sua mãe dormia, e escancarou a porta.

Desceu lenta e cautelosamente cada um dos degraus para o andar subterrâneo. Não porque estivesse com medo, mas para que sua mãe não a flagrasse.

— Moço, cadê você? — perguntou temerosa.

Não obtendo resposta, caminhou até o armário de ferro que possuía na parte inferior uma grande gaveta. Tentou abri-la, pois o tamanho avantajado da gaveta se assemelhava a um caixão, então a pequena suspeitou que o homem da voz grossa estivesse ali dentro. Tentou trazer o puxador na sua direção, mas era muito pesada.

Segurou novamente o puxador, dessa vez com as duas mãos, colocou seu peso para trás e a gaveta deslizou trepidando e emitindo um ruído. Uma ratazana saltou de dentro dela e se prendeu no vestido de Elizabeth. A menina saltitou e deu pulinhos, mas a pata do rato estava agarrada à renda de seu vestido e o animal se contorcia e se debatia para todos os lados tentando se soltar.

Elizabeth caiu para trás.

— Áááiii!!! ÁÁÁÁÁÁhhh!!!... — Ela se debatia no chão.

A ratazana arranhava a perna quebrando suas unhas ao fincar e deixá-las cravadas na pele da garotinha.

Então, Elizabeth, em um ato de desespero, meteu a mão-cheia na ratazana fétida de odor choruminoso, apertou-a com a força do nojo e a arrancou de sua roupa. Levantou-se tacando o rato na direção do armário, pronta para pisoteá-lo caso ele caísse no chão. Caiu de volta dentro da gaveta caixão.

— Elizabeth!? — Roberta chamou, permanecendo no topo da escada. — Minha filha??

— Mamãe!! Aai!!! Me mordeu! Minha perninha!

— Suba! Suba, Elizabeth! — chamou novamente sem entrar no lugar proibido.

Elizabeth correu com a dor de ter unhas presas em sua pele. Subiu cada um dos degraus se lamentando e chorando desesperadamente.

Abraçou sua mãe, que estava em pânico, e não deu um passo para o interior do porão. Roberta bateu a porta e levou sua filha para a sala. Ela se queixava de dor e não se acalmava. Deu um banho nela onde ao escorrer a espuma sobre a ferida e as unhas como as de um gato inteiramente fincadas em sua coxa, Elizabeth chorava, chorava e uivava.

Roberta a colocou sentada no vaso sanitário e com o auxílio de uma pinça removeu três afiadas unhas negras da pele de sua filha, que àquela altura estava traumatizada com a voz que ouvira, mais que com a ratazana feroz com a qual lutou.

COMANDO SUPERIOR: A Ascensão de Drak NazarOnde histórias criam vida. Descubra agora