Subo as escadas para o meu andar correndo antes que veja a doida. Só a lésbica que nunca fugiu de uma mulher doida pode jogar pedras em mim. Ou seja, ninguém me jogará pedras.
Chego ao corredor onde fica o meu quarto. Olho quarto a quarto os que estão vazios. Escolho qual quarto vou ficar. Preferi ficar em um onde a vista é voltada para o rio. Tem uma janelinha no centro que é losangular.
A cama é feita de madeira antiga e tem um véu nela. Sei que é porque os mosquitos atacam com gosto. O lençol é azul claro, mas a fronha é amarela clara. Há uma mesinha perto da janela e uma pequena cômoda no canto.
O banheiro fica no corredor para todo mundo aqui no intercâmbio. Tem o das meninas e o dos meninos. Há encantamentos para impedir que os meninos entrem no das meninas e vice-versa. Mas meu quarto é só para mim.
Não há muitos estudantes de intercâmbio. O que me ajuda a ter a privacidade que os quartos de alunos comuns não têm. Gosto e prefiro assim.
Até onde sei, os quartos de alunos comuns comportam de seis a sete estudantes e todos eles possuem uma espécie de separação para que cada aluno tenha sua privacidade.
Os fundadores se preocuparam com esse detalhe não sei o motivo. Acho que é para que os casais homossexuais pudessem se beijar em paz. Há um boato de que o fundador espanhol era gay e amava o fundador português. Mas são boatos. Nunca saberemos, não é?
Os quartos onde ficam muitos dos alunos possuem um banheiro próprio, já que seria uma bagunça se os banheiros fossem fora do quarto e para todos usarem. Imagina milhares de alunos brigando ao enfrentar filas. Seria um caos.
Uma coisa que acho interessante, é sobre como as coisas foram nessa escola. Pois ela não foi essa coisa de ser abertamente aberta para todos alunos. Na verdade, os alunos negros só puderam fazer parte da escola um pouco antes do fim da escravidão. Os indígenas só fizeram parte da escola de verdade não faz muito tempo. Pois, apesar de ter uma fundadora indígena, os brancos que faziam parte da escola não queriam eles aqui e os faziam desistir dos estudos.
No início, quando os negros começaram a frequentar a escola, algo parecido aconteceu. Mas os tempos eram outros e já não eram todos os alunos que faziam esse tipo de coisa. O que ajudou aos primeiros negros a não desistirem e a abrirem porta aos demais.
A verdade, é que durante muito tempo a escola só tinha os filhos de europeus ou latinos brancos. Os mestiços de brancos com negros ou indígenas só eram aceitos se fossem vindos de bruxos de linhagem comprovadamente pura. O que, na verdade, não garantia nada para eles.
A verdade é que, até hoje, existe uma certa separação na escola. Não de todos, mas de alguns. E estou aqui para isso e por isso.
As coisas por aqui não são muito legais. Ainda mais quando se falam sobre os desaparecimentos. Eles são sempre contra alunos de certos padrões. Isso se encaixa onde a Mon faz parte, mas pode estar sendo feito pelos outros. Eu não sei dizer em que ponto estamos. Só sei dizer que há padrões. Entende?=/=
Acordo bem cedo e arrumo as minhas coisas. Já guardei boa parte das coisas que estavam na minha mochila. Há vários livros em cima da mesinha. Todos eles para que eu revise mais tarde antes de dormir. Só uma revisadinha para ver se eu estou sabendo de tudo o que preciso saber sobre a cultura latina. Preciso saber para ver como devo me comportar.
Por exemplo, sei que aqui as pessoas gostam de gente mais calorosa. Venho de um lugar onde ser assim é falta de educação. Então, terei de ser mais calorosa para me enturmar mais. Entendeu? Ou ser algo mais amistoso e não frio.
Coloco meu uniforme, revejo o calendário do dia. Já escolhi minhas matérias antes de vir para cá. A gente manda o questionário com as respostas do que quer estudar e eles enviam a resposta com os horários de aulas e em qual andar cada uma fica.
Também, há a opção de ser monitor. Me inscrevi e recebi o distintivo. Assim, poderei observar melhor as coisas e caminhar pela pirâmide em paz a hora que quiser, desde que bata com meu horário de monitorar os corredores e os alojamentos, ou até lá fora.
Me sento na cama e respiro fundo. Faço uma pequena meditação para me concentrar melhor. Devo ser uma boa aluna, mas nunca mostrar o quão boa aluna eu sou. Preciso saber o limite que posso ir. Não estou dizendo que sou melhor que os outros. Só estou dizendo que já passei por isso e sei de tudo.
Me levanto da cama e saio porta afora. Alguns alunos andam pelos corredores e escadas indo para o salão principal para tomar o café da manhã. Chego ao salão e vejo Mon lá ao longe. Paro e fico olhando para ela. Ela faz o mesmo e olha para mim.
É a primeira vez que olho para ela sem pensar que ela é a minha entrada para o grupo. Não que já não tivesse essa entrada. Só quero dizer que ela é minha forma de entrada porque sei que só o líder fica com o objeto à mostra.
Eu poderia chegar nela e me apresentar de cara, mas quero fazer tudo com calma e observar como as coisas funcionam por mim mesma, com meus olhos, como alguém de fora.
Além do mais, ela é bem bonita, não é? Você nota pela boca dela que tem uma bolinha no lábio superior. Quando ela fica séria e faz um bico a bolinha aparece mais e eu acho isso fofo. Ela está me olhando séria e a bolinha aparece mesmo estando longe.
É uma característica dela, própria dela e quem notou isso deve ter notado a entrada do paraíso, pois ela parece ser um anjo quando faz essa cara séria. Não é uma séria de carrancuda, é séria normal. Você está só olhando sério. O que me faz me perguntar o que será que ela está pensando sobre mim agora.
Do nada, vejo a amiga dela ao lado dela e acordo para a vida. Saio correndo antes que ela me veja, me sentando ao lado de um rapaz alto e me escondendo atrás dele. Acho que ela não me viu. Credo!
Peço algumas frutas cortadas e sem caroço. Até que olho para o lado e vejo o rapaz que me tampou. Ele é oriental como eu, mas eu sei que ele não nasceu na Ásia. Ele nasceu na América do Sul. Seu nome é Kirk.
Sei sobre a longa linhagem da família dele. Tão longa quanto a minha. Nossos parente são amigos. Mas nós nunca nos encontramos. Só que eu sei quem ele é.
Olho para as mesas e os alunos que estão nelas. Noto alguns outros alunos que sei que são do grupo seleto. Como a Leighton.
Ela é uma loira de olhos claros. Muito bonita e com jeito de quem não se importa com nada. Ela é rica e sabe como é ser rica. Come um prato que parece ser francês.
Seus familiares são da Europa e ela não parece querer esconder isso, pois sua postura é de quem não é daqui e está aqui só porque mandaram. Imagino que ela queiria estar em Paris, lá na Champs-Élysées, e não aqui no meio do mato. Não a culpo, eu também nunca quis vir para cá.
Ai, que droga! Fiquei tão distraída que não vi a doida vindo aqui. Ela está chegando perto de mim, mas não tenho como fugir. Que ódio! Mas posso usar isso a meu favor. Como um motivo para ir até à Mon.
— Oi, princesa. — Ela sorri, enquanto me levanto.
— Oi. — Dou um sorriso falso. — Vamos lá para sua mesa?
— Claro, princesa! — Ela nem mesa tem ainda porque não escolheu, mas nem nota isso.
— Como você está? — Kade parece querer mostrar que está se importando comigo e eu suspiro.
— Estou bem e você? — Tento ser simpática.
— Melhor agora que te vi. — Essas cantadas fazem sucesso só quando a outra parte está interessada, ou seja, não caio nessa!
— Oi, Mon. — Sorrio para ela de uma forma contida, como se estivesse sendo educada.
— Oiê... — Ela parece bem feliz em me ver aqui, o que acho ótimo.
Me sento e peço minhas frutas outra vez. Já que nem cheguei a receber meu pedido na outra mesa. Enquanto isso, observo as duas conversando sobre quadribol.
Até poderia me meter na conversa e falar sobre isso, mas prefiro fazer uma surpresa em relação à isso. Vou me inscrever como quem não quer nada.
— Você joga? — Pergunto para a Mon.
— Jogo. — Ela parece se achar quando responde, como se fosse um troféu ser jogadora, em um fio de arrogância.
— Um dia, eu vou te ver jogar. — Jogo a isca como se fosse ir lá ver ela jogando, quando vou ver ela jogando quando nós duas formos jogar juntas.
— Não vai me ver também, princesa? — Kade me olha toda sugestiva.
— Não gosto de bexigas. — Tento ser gentil, mas não consigo.
— Então, né? Já terminei aqui. Tô indo. Fui! — Ela sai e me deixa com a doida, o que me deixa muito triste e depressiva, querendo morrer.
— Vou ao banheiro. — Me levanto rápido.
— Vou com você. — Ela também se levanta.
— Não precisa, vou ao banheiro do meu andar. Gostei o banheiro de lá e só vou lá. — Invento o que sai na cabeça.
— Mas eu posso ir com você. — Ela insiste.
— Não se canse. As escadarias vão te cansar muito. Vai lá se inscrever no clube de bexigas entes que acabem as vagas. Soube que só tem poucas vagas. — Invento mais mentiras.
— Sério? Não sabia. Vou lá, então. Obrigada por me avisar, princesa. — Ela vem para me dar um beijo no rosto.
— Tchau. — Saio antes que ela me beije no rosto.
Vou correndo, passo pela Mon quando ela escreve o nome dela no quadro de avisos que fica bem na entrada do salão principal. Olho para trás e vejo quando ela sai rapidamente como se estivesse fugindo igual eu estou quando Kade se aproxima.
Espero Kade se inscrever, dou aquela disfarçada como se estivesse subindo as escadas. Aí vou até à entrada do salão e vejo o quadro de avisos. Há vários tipos de avisos. Desde a data da primeira saída para a cidade bruxa que os alunos visitam para passear e sair da rotina da escola, até mesmo propagandas sobre onde comparar varinhas ou vassouras aqui na América do Sul ou as importadas da Europa e Estados Unidos.
Começo a procurar o nome da Mon nos avisos sobre times. Vejo que ela se inscreveu em dois pergaminhos. Um sobre futebol, aquele jogo trouxa. O outro é de quadribol.
Vejo que eles estão procurando uma goleira e acho que os ventos me deram sorte. Justamente o que eu precisava. Senão, teria que me virar jogando em outra posição.
Já joguei como atacante e até fui bem. Como sou goleira, acho que é fácil saber quando o goleiro do outro lado está mal posicionado. O que abre brechas para o ponto nas balizas. Só que minha vida é ser goleira e eu sofreria muito jogando em outra posição.
Escrevo meu nome embaixo e faço aquele mantra positivo sobre como eu vou conseguir essa vaga. Ela já é minha!

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Lover (REPOSTAGEM REVISADA E MELHORADA)
FanficEssa é uma fanfic para maiores com temas mais fortes. Leia por sua conta e risco. Por que não há deficientes em Hogwarts? Mon vai para seu último ano em Castelobruxo e conhece Sam, uma aluna de intercâmbio. Lover se chama assim por ser minha histó...