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Sábado || 08:07 PM || 13/06/1978 


SOPHIE YAMADA


Eu desperto. Com o corpo todo dolorido. Eu continuava no chão. 

Já havia escurecido do lado de fora. E a única fonte de luz do quarto era aquela janelinha fodida que fazia a luz dos postes da cidade entrar naquele cativeiro escuro e frio.

Com muita dor, levanto do chão frio, me sentando. 

A dor era imensa. Parecia que um caminhão havia passado por cima de mim. 

Coloco a mão no rosto, sentindo o inchaço que o meu olho roxo de um dia atrás havia deixado. 

- Velho filho da puta. - Penso alto. 

Me rastrejo até a bandeja que estava jogada no chão. 

Lá, tinha uma garrafa cheia de refrigerante de limão de uma marca que eu nunca havia ouvido falar. E também, um prato de cerâmica com uma comida estranha... 

Sem escolha nenhuma, devoro tudo em menos de 5 minutos. 

Poderia ter sido uma má ideia, mas, eu comi tudo. 

Eu estava faminta. Deve ser por isso que aquela gororoba pareceu boa no meu paladar. 

Depois de comer quase o prato junto, eu me sentia com um pouco mais de energia para continuar tentando sair daquele lugar horrível. 

Eu estava pensando nas formas que aquele porão poderia me ajudar a sair dele. 

Olhava ao redor por todos os lados. 

Até que, escuto o telefone misterioso tocando atrás de mim novamente. 

- Eu posso estar ficando louca... Só pode. - Olho fixamente para o telefone, enquanto pensava alto. 

Ainda ouvindo o telefone tocar, vou até ele, tirando o receptor  do gancho e colocando no meu ouvido. 

- Tem alguém aí..? - Pergunto. 

- Que pergunta estúpida é essa? Se o telefone tocou, é óbvio que tem alguém na linha, idiota. - Escuto uma voz masculina falando do outro lado da linha. 

- Dylan... Você, com certeza, é Dylan Steves. - Falo, afirmando. 

- Você se acha muito sabe tudo né? Por que não saiu dessa porra ainda? - O garoto fala, com agressividade. 

- Acalme-se! Por que me ligou? - Pergunto. 

- Eu deixei um cabo solto na divisão entre a parede e o chão. - Ele afirma. 

- Que parede? - Pergunto, com medo da nova resposta. 

- Você é burra? A única parede que tem espaço! A parede da porta! - Ele fala. 

- E o que eu faço com isso? - Pergunto, realmente curiosa. 

O garoto não responde. Mas, a garrafa de refrigerante, agora vazia, começa a girar loucamente no meio do cativeiro, sendo levantada e apontada para a janela. 

- Entendi. Obrigada. - Falo com delicadeza. 

- Obrigada por quê? Isso não é sobre você! FODA-SE ELE! - A sua última frase começa a se repetir em um grito na minha cabeça, ecoando pelo cativeiro todo. 

Começo a ficar tonta de tanto barulho, largando o telefone no gancho e caindo no chão, com as duas mãos nos ouvidos para tentar abafar o som agoniante dos gritos do espírito. 

Dylan Steves era um dos valentões do terceirão. Sua alma sempre foi perturbada. 

Logo que os gritos param, eu tiro as mãos dos ouvidos devagar, indo até a divisão da parede com o chão, bem aonde o garoto havia falado. 

De lá, tiro um cabo solto. Ele tinha um comprimento razoável, uns 2 metros e meio. 

Tento "laçar" a grade da janela com o cabo, tentando arrancar aquela grade. 

Tentativa CONCLUÍDA. 

Logo que passo o cabo pela grade, faço um nó no mesmo para conseguir encaixar meu pé e subir até a janela de vidro. 

Até que... A grade cai. E, automaticamente, eu caio junto. 

Bato as minhas costas, já machucadas, com tudo no chão.

Grito de dor. 

Pelo menos, mais uma chance de fuga. 

Tento pegar a garrafa do chão e jogar na janela, para ver se o vidro reagia e quebrava. 

Nem um arranhãozinho sequer. 

Desisto. Me jogando na cama de novo. Ofegante e cansada. 


ROBIN ARELLANO


Havia anoitecido. E nós dois, e mais alguns membros da família Yamada e do nosso grupo de amigos, ficamos o resto da tarde toda dando depoimentos para ajudar na investigação. 

Foi super estranho. O clima naquela sala não era legal... 

Os relatórios eram individuais. E eu pedi para ser o último. Fui o último que tive contato com a Sophie naquela noite. 

- Robin Arellano? Você é o último. - O delegado me chama. 

A sala era relativamente pequena, mas havia muitas coisas lá. Tudo se encaixava perfeitamente em cada lugar. 

- Vamos lá... - O delegado se senta em sua cadeira e indica para eu me sentar em uma cadeira na frente da sua mesa. - Quando foi a última vez que você falou com a Sophie? 

- Foi ontem... Ou melhor, nessa madrugada. No baile. - Afirmo. 

- Ok... Bruce me falou que ele estava mais afastado de vocês... Confirma? - O delegado pergunta, enquanto anota alguma coisa em sua caderneta. 

- Confirmo. A Sophie ficou comigo até o final da festa. Eu simplesmente adormeci na arquibancada... Pelo o que eu me lembro, eu dormi no colo da Sophie. - Tento me lembrar dos detalhes. 

- Você ajuda muito sendo detalhista. - O homem afirma. - Quando foi que você teve sua última conversa com ela? 

- Eu não me lembro direito, delegado... O nosso amigo maior de idade trouxe bebidas alcoólicas para o baile, e eu ingeri sem saber que tinham álcool. - Falo, com medo do que ele ia dizer a respeito. 

- Oh... Tudo certo... Do que você se lembra? - Ele pergunta, ainda fazendo anotações. 

- Eu me lembro... - Sorrio ao lembrar. - A gente se beijou... Eu esperei 3 anos por isso, senhor... Foi incrível... A gente passou o resto da noite juntinhos. Mas eu não lembro direito até certo ponto... 

- Vocês são um casal? - Ele finalmente olha para mim. 

- Posso ser sincero, delegado? Nem eu sei. Eu gosto dela, e, pelo visto, ela também gosta de mim. Mas, é MUITO recente para dizer que temos algo. - Explico. 

- Ok... Muito bem... Robin, Bruce relata que, de acordo com o que ele lembra, você foi a última pessoa daquele baile a ter contato com a garota. Correto? - O delegado olha bem no fundo dos meus olhos. 

- Correto. Eu acho... Não estava consciente naquela hora. Não lembro de ver Sophie conversando com outro garoto que não seja eu depois das 10 da noite. - Afirmo, sem certeza. 

- Certo... Qual era a sua relação com a garota antes do desaparecimento? Eram amigos? - O delegado pergunta. 

- Nossa relação não era nada saudável, delegado. Para ser sincero, nós "nos odiávamos". Nos tratávamos super mal... Mas, eu sempre gostei dela... O jeito que o meu coração arranjou de "parar de gostar dela" foi fingir que a odiava. - Explico  meus sentimentos. 

"Desabafar" com alguém não era coisa que eu fazia com frequência. Mas, se aquilo ajudasse a encontrar a minha garota, eu faria o que fosse possível e impossível. 


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Olhos Puxados || Robin ArellanoOnde histórias criam vida. Descubra agora