Presos

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Em uma faculdade de teatro, estava ocorrendo um ensaio de uma peça que tinha chegado no fim, o cenário estava sendo desmontado e os atores estavam tirando seus figurinos; um deles revelou ser Lukas que cumprimentou os outros atores e saiu da sala, do lado de fora ele encontra Maycon encostado na parede do corredor com as mãos nos bolsos, o mais velho olha para ele meio surpreso.

— A quanto tempo está aí? — Pergunta Lukas para Maycon que desencosta.

— Faz um tempinho já, tava sem paciência de ter que esperar em casa, então vim pessoalmente para cá, deixaram com que eu entrasse. — Responde Maycon sem mudar muito sua carranca, suas feições eram mais perceptíveis visto que estava sem a máscara, óculos, ou touca. — Eu até assisti um pouco da peça.

— Ah, é? Gostou da minha performance? — Pergunta Lukas sorrindo de canto meio convencido.

— Os outros atores foram bem, já você, Deus me livre! Parece ator pornô! — Indaga Maycon com seu jeito bruto costumeiro, tirando uma com a cara de Lukas.

— Eu ainda não sei por que ainda espero elogios vindo de você, cuzão. — Diz Lukas um pouco emburrado, começando a andar para fora da faculdade, com o mais novo o seguindo. — Você adora me encher, né?

— Heh, eu sou mais eu, né? — Diz Maycon sorrindo em meio a risadas, arrancando-as também de Lukas que entrou na brincadeira.

A dupla estava rindo e falando de assuntos triviais, enquanto andavam pela rua, já bem distantes da faculdade que o mais velho estudava, os dois estavam aproveitando bem o momento de distração, caminhavam sem se preocupar por onde passavam, a conversa fluía e ambos já sabiam que não iriam voltar para casa naquele momento, ao invés disso só queriam zoar por aí; o tempo passou e as risadas cessaram, seus rostos agora adotaram um semblante desgastado e melancólico, talvez fosse efeito da pós-diversão ou quem sabe algo estava os afligindo, de qualquer forma, Maycon avistou um banco no meio de um parquinho, Lukas percebeu isso e sem trocar nenhuma palavra ambos foram se sentar.

O mais velho se sentou no banco e inclina seu corpo, apoiando suas costas ainda mais no assento, pendendo a cabeça para trás e encarando o céu eternamente cinza, já o mais novo, se sentou de maneira mais despojada no banco, encarando o céu da mesma forma que seu amigo; o vento uivante soprava junto da chegada do crepúsculo que anunciava o início lento da noite, por mais que não desse para ver a cor do céu por trás das nuvens; com certeza deveria estar em uma cor lilás com leves tons alaranjados; os dois desejavam que pudessem ao menos ver o céu, e que nem todo dia fosse cinzento e monótono como estava sendo e sempre esteve sendo. Na verdade, desde que aquele caso aconteceu, os arredores e as pessoas ficaram afetadas, mas esse não era o motivo da mudança de humor dos dois, era algo indescritível e parecia até… Horrível, de certa forma.

— Ei, Maycon… — Diz Lukas, chamando pelo seu amigo.

— Sim? — Responde Maycon, ao mesmo tempo perguntando o motivo dessa quebra de silêncio repentina.

— Você se lembra do que aconteceu nos últimos dias? — Pergunta Lukas. — Sei que é chato perguntar isso toda hora, mas eu preciso saber.

— Rapaz, eu não lembro nem do que eu comi no café da manhã, quem dirá, lembrar do que aconteceu no dia anterior? — Maycon responde de forma bruta e frustrada, mas não era com o Lukas, e sim com o fato de não se lembrar.

— … Faz sentido, mas, por que eu tenho a sensação de que estamos condenados?

— Como assim?

— Eu não sei… As imagens daquele incêndio não saem da minha cabeça, é um milagre a gente ter sobrevivido.

Ao falar isso houve um silêncio desconfortável entre os dois, Maycon e Lukas, ambos cresceram em um orfanato que no ano de 2003 foi incendiado, os horrores daquele tempo ficaram gravados na mente dos dois que foram os sobreviventes, o mais velho nunca foi adotado por ninguém e saiu do orfanato com dezoito anos, vivendo por si mesmo, enquanto Maycon foi adotado com quatorze anos, uns anos antes de Lukas sair de lá; atualmente o mais novo tem dezessete anos, o mais velho tem dezenove e em breve fará vinte; as lembranças de quando se encontraram de novo são muito vagas, sempre que tentam as coisas ficam muito confusas, a única coisa que se lembram dessa época era de terem conhecido alguém, ele vestia uma blusa verde e usava óculos, no entanto nunca mais o viram na vida. A dupla nunca conversou sobre isso diretamente, mas, eles estavam sentindo um sentimento dormente que estavam carregando faz muito tempo, por mais que fosse sútil, era persistente e amedrontador… A sensação de que conforme o tempo passa, mais eles vão se esquecendo de seu passado, eles não se lembram de seus pais, não se lembram das pessoas com as quais conviveram ou sequer já amaram e isso… Era aterrorizante.

— Eu sei… Mas eu estou me sentindo assim, quando eu tô perto do Ethan, você já sentiu? — Diz Maycon que acaba se arrepiando, como se sentisse a presença de alguém, mesmo o parque estando vazio e ficando cada vez mais escuro, com os postes de iluminação pública acendendo.

— Sim, eu já senti… Aquele passarinho deve estar melhor do que a gente, né? — Diz Lukas mudando completamente de assunto, vendo a silhueta de um passarinho voando pelos céus escuros, e pousando em um poste. — Ele está voando livre pelos céus, enquanto a gente está aqui embaixo, presos… Você sentiu e viu aquilo, não é?

— Sim… Eu sinto, as vezes vejo e esqueço…

Mais uma vez o silêncio tomou conta, seus olhares ficaram vazios; a dupla se levanta de seus assentos e vão andando para fora do parque, eles seguem caminhos separados, provavelmente, estavam indo para suas casas, só não sabiam que tinham alguém com eles durante toda a conversa e momento que estavam juntos.

* * *

Naquele mesmo dia, mais cedo, Romy se encontrou com Stewart e os outros, ele estava exausto e contou exatamente o que houve na noite anterior, deixando o clima pesado, a partir daquele momento eles iriam agir cautelosamente para reunir provas, e expor tudo o que estava acontecendo. O detetive mostrou todas as evidências que ele coletou todo esse tempo, mostrando as fotos dos jornais e anotações que ele conseguiu; todos teriam que investigar em sigilo de Smith e Roger, pois a dupla matou dois policiais, Wesley e Henry, por motivos desconhecidos, mas que poderiam, possivelmente, ter a ver com os dois estarem investigando-os faz um tempo; então para prevenir de que algo ruim acontecesse eles iriam manter aquela investigação sobre sigilo.

— Alguns de vocês sabem onde está Ethan? — Diz Romy, olhando para sua equipe recém-formada.

— Não, parece até que ele sumiu… — Diz Stewart, parecendo um pouco preocupado. — A gente vai ter que esperar algo acontecer, ou ele se mostrar, para que possamos continuar com as nossas investigações de forma segura.

— Entendo, eu tenho a impressão de que eu posso ter deixado passar algum detalhe naquela cabana… — Diz Romy, meio pensativo quanto ao que deveria fazer.

— Eu e Ted podemos ir até lá e procurar mais pelo local. — Diz uma policial mulher entre eles, a mesma que foi responsável por prender Natalie Ouellette, ela estava ao lado de outro policial que acenou a cabeça em concordância.

— Pode funcionar, mas a gente vai ter que apresentar um álibi para a ausência de vocês, já que, provavelmente, terão que se ausentar por um tempo até que voltem para cá novamente. — Explica Romy, pensando nas possibilidades e caminhos que a investigação poderia tomar.

— Pode deixar essa parte comigo. — Diz Stewart finalizando aquela reunião por ali.

Fim

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