Fica.

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Point of view Jenna

Já estava anoitecendo quando resolvemos ir embora do shopping. Miguel havia aproveitado muito e quando digo aproveitar, quero dizer que me fez sair com várias sacolas de brinquedos novos e roupas. Claro que no início tentei convencê-lo a não levar nada, mas ele era esperto e sabia bem como me fazer dizer sim. "Meus brinquedos e roupas usadas estão em bom estado, mamãe, então quero doar para as crianças que não tem. O que um dia serviu para mim e me fez feliz está na hora de fazer outra criança feliz". Juro por Deus que se eu não fosse mãe dele, não acreditaria se alguém me dissesse que ele tinha quatro anos.

Depois da conversa que tive com Emma, o clima entre a gente mudou. Conseguimos dar boas risadas e relembrar momentos bons que vivemos juntas, era como se de repente eu tivesse esquecido tudo que passei quando ela foi embora, até porque agora eu sabia que não foi por não me amar e sim por me amar demais. Agora estávamos no meu carro, prontas para irmos embora. Enquanto eu dirigia, ela permanecia sentada no banco de trás com Miguel dormindo nos seus braços.

— Você é a coisinha mais linda do mundo. Como pode? — falou baixinho, creio que ela não queria que eu escutasse. — Eu amo você, Miguel. — vi pelo retrovisor ela acariciar o cabelo dele, que gemeu e agarrou o pescoço dela. Mas não foi isso o que mais me chamou atenção e sim o que ele falou com a voz de choro.

— Mamãe! — percebi o rosto dela perder a cor, mas resolvi não falar nada. Apenas parei o carro no sinal.

— É a tia Emma, meu amor.

— Estou com medo, mamãe. Ele vai me pegar.

— Quem vai te pegar?

— O Coringa. — ele respondeu de olhos fechados e Emma sorriu.

Não tenha medo, pare de chorar. Me dê a mão, venha cá, vou proteger-te de todo mal, não há razão pra chorar. — Emma cantarolou baixinho e senti um arrepio percorrer meu corpo, no mesmo instante em que Miguel se acalmou novamente.

— Chegamos. — falei assim que estacionei em frente ao prédio onde ela morava.

— Obrigada. — agradeceu. — Digo, pelo dia de hoje e por me trazer em casa.

— Obrigada você por não recusar. — fui sincera.

— Tenha uma boa noite, Jenna. — ela abriu a porta, saindo do carro com meu filho nos braços. Franzi o cenho ao ver que ela começou a se afastar. Abaixei o vidro.

— Emma? — chamei.

— Oi? — parou de andar e se virou para mim.

— Não está esquecendo algo? — franziu o cenho e continuou me olhando com confusão nos olhos. — O Miguel, cabeça de vento. Para onde você está o levando?

— OUCH! — falou alto. — O Miguel. Eu... ai que merda! — se atrapalhou e comecei a rir, abrindo a porta do carro e saindo do mesmo.

— Que tipo de pessoa esquece que está com uma criança nos braços?

— Às vezes me acontece. Mas juro que é a primeira vez que me acontece com uma criança. Eu só... esqueci. Que vergonha! — ruborizou e eu gargalhei.

— Bom, você tem duas opções agora. — ergui dois dedos. — Você pode me entregar meu filho e vou embora ou você pode me convidar para subir.

Gostei da segunda opção. — fez um sinal com a cabeça para eu segui-la.

— É melhor eu carregar ele, deve estar cansada.

- - -

Quatro andares depois, estávamos dentro do apartamento dela. Ele não parecia muito grande, porém era confortável e muito bem organizado. Coloquei Miguel deitado no sofá e olhei ao meu redor, enquanto ela voltava da cozinha com dois copos de suco. Me aproximei da mesinha de centro e me surpreendi ao ver um porta-retrato com nossa foto.

— Nunca joguei fora. — falou atrás de mim e eu pulei com o susto. Ótimo, pega no pulo.

— Você me assustou.

— Desculpa. — estendeu o copo de suco.

— Por que não jogou fora?

— Primeiro porque amo essa foto, segundo que jamais me livraria de algo que diz respeito a você. — respondeu e o silêncio pairou sobre nós. Pigarreei.

— Não me lembro de estar aí na última vez que estive aqui.

— Você só não prestou atenção. Estava ocupada demais brigando comigo. — não respondi nada. Apenas respirei fundo.

— Seu apartamento é bem bonito.

— Eu mesma decorei.

— Sempre teve bom gosto. — joguei uma indireta, mas pela cara que fez não pareceu entender. — MANO, É UM TAYLOR? — corri até o violão escorado na parede do outro lado da sala.

— Sim. — respondeu animada. — É demais, não é?

— Posso pegar?

— Claro.

— Posso tocar?

— Só se eu puder escolher a música. — pediu com certo tom de malícia, ou era apenas impressão minha? Apenas concordei e me sentei no tapete de frente para ela.

— Qual você quer ouvir?

— Talk. — respondeu calmamente e cinicamente, eu apenas engoli em seco.

— Tem certeza? — assentiu. — Ok. — respirei fundo e busquei no fundo da memória os acordes.

I can remember the good old days
(Eu consigo me lembrar dos bons e velhos tempos)

Where you and me used to hide away
(Quando você e eu costumávamos nos esconder)

Where the stars were shining
(Onde as estrelas estavam brilhando)

Or the Sun was blinding our eyes
(Ou o Sol estava cegando nossos olhos)

Yeah, you filled up my glass
(Sim, você encheu o meu copo)

With promises that could never last
(Com promessas que nunca poderiam durar)

But I still find pieces of you in the back of my mind
(Mas eu ainda acho pedaços de você no fundo da minha mente)

Praguejei internamente quando senti um nó se formar em minha garganta, céus, essa mulher me tem nas mãos.

And all little things that we once said
(E todas as pequenas coisas que uma vez nós dissemos)

Are not in my heart, they're in my head
(Não estão no meu coração, estão em minha cabeça)

That was the time to say goodbye
(Aquela era a hora de dizer adeus)

Let's put it to rest, yeah, let it die
(Vamos colocá-las de lado, sim, deixá-las morrer).

E de repente tudo virou um borrão. Comecei a errar os acordes e a voz ficou presa em minha garganta. Não sei dizer ao certo quando e nem como tudo aconteceu. As mãos de Emma foram de encontro aos meus cabelos e sua respiração quente estava perto, talvez perto demais.

- - -

Passavam-se das 23:00 quando cheguei em casa com Miguel. Quase caí para trás quando acendi a luz e dei de cara com Mia sentada no sofá me esperando.

— Boa noite, Mi. Não achei que estivesse acordada.

— Posso saber onde você estava?

— Como assim? Estava no shopping com o Miguel. Avisei você.

— A essa hora? Não sei se percebeu, mas já passou das onze. — olhou para o relógio no pulso. — Liguei para você várias vezes, por que não me atendeu? — fiquei calada. — Vou perguntar pela última vez, Jenna, onde você estava?

— Mia, a gente precisa conversar.

- - -

Um Bebê Entre Nós - Jemma version Onde histórias criam vida. Descubra agora