Capítulo IV • Papo Furado

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~ 31 de Janeiro ~
~ Terça-feira ~

Esses últimos dois dias foram um completo e desprezível Tédio. ― com T maiúsculo, falou?

Não aguentava mais aquela comida.
Não aguentava mais perguntas.
Não aguentava mais heróis.
Não aguentava mais aquele senso de justiça dando as caras à todo instante.
Não aguentava mais os surtos daquele desgraçado com "Liah Dias" para cá e "Liah Dias" para lá. ― nunca nem ouvi falar nessa guria, e ele fica me enchendo o saco com essa p*rra. Que ódio! Se ela magoou ele, sei lá! Feriu o pobre coração, f*da-se! Faz terapia, se trata, mas não desconta em mim, cacet*!

Estava prestes a fugir correndo, escalando muros, pedindo carona com desconhecidos em carros que são rápidos, mas a maldita da minha individualidade não ressurgia. Não faço ideia do que era aquele gás que respirei, mas ele era poderoso 'pra cacet*. Disso, eu tenho certeza.

Pelo jeito, vou ter que arrumar um cúmplice aqui para fugir dessa merda de cadeia.
Usar o meu charme, talvez? Pode dar certo, 'né?

[ 21:15 P.M. ]
| Na cela, presa |

Já havia se passado longas horas desde a minha refeição do horário de almoço, e eu não estava com fome nem para a de agora, o meu "jantar" de presidiária.

A comida não era ruim em si, como havia reclamado. Dava para comer, mas eu nem toquei nela, ansiosa por outra coisa que veio com ela.

Não, não era nenhuma sobremesa pelo bom comportamento. A Liga tinha me mandado um breve recado, finalmente. De primeiro momento, achei que a piscadela que o guarda havia me mandado quando me entregou minha marmita fosse um tipo de aviso para "se quiser um cúmplice para fugir daqui, tendo como pagamento uma noite juntos, eu estou a postos, queridinha."
Mas, não. Claro que não era isso.

No recado, escrito pela letra do meu Dabi, dizia que iriam me retirar daqui ainda hoje, nessa noite, e precisava estar preparada. Eu quis gritar de felicidade, mas me contentei com pulinhos frenéticos, silenciosos e patéticos.

Agora, estava lendo aquele mesmo papel amassado mais uma vez, semeando a saudade imensa que estava da minha Liga e a falta que fazia para eles.

Era de emocionar, mas eu não me emociono. Nunca.

Como se tivesse sido cronometrado, resguardei o papel em um dos meus seios e aquele herói esquentadinho, conhecido pela maioria como Dinamight ― um nome que achei bastante estúpido. ―, surgiu do lado de fora da minha cela. Trocamos ríspidos olhares até ele se apoiar na grade, passar os braços por ela e simplesmente lançar para perto de mim, no chão, meu alimento dessa noite.

Fingindo estar aprimorando minhas unhas quebradas, apenas acompanhei o olhar daquele idiota pelo cômodo, se focando principalmente na outra marmita, intacta.

Dinamight: greve de fome? ― tenta puxar assunto, mas eu permaneci calada ― saquei. Greve de fome e voto de silêncio. Típico de uma garotinha encurralada.

Key: não diria "garotinha". ― termino de averiguar minhas unhas e me volto para ele, e seu olhar compulsivo. ― a não ser que goste de ser humilhado por "garotinhas", certo?

Dinamight: tsc! ― faz tal som com a boca e se afasta, recostando-se na grade de minha cela, de costas para mim.

Ah, já entendi tudo.
Ele é daqueles homens de ego frágil. P*ta que par*u, viu?

Key: você é tão patético. ― apoio meus cotovelos na grade, com meu olhar fixo na marmita intacta do almoço e de ombro-a-ombro com ele. ― eu aceito ser a típica garotinha encurralada, se você aceitar ser o típico homem de ego muito frágil. Acordo feito? ― estendo minha mão à ele, mas logo a recolho, brincalhona. ― viu só? Patético. Somos dois patéticos, eu admito.

De Repente, Você. (O Reencontro)Onde histórias criam vida. Descubra agora