Agonia

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Sigo a ambulância que está bem a frente, ecoando a sirene para que todos abram caminho.

Como pude ter sido tão idiota? Como pude deixar aquela lerna de hidra me irritar a tal ponto.

Eu deveria ter mantido a calma e não ter feito minha deusa ficar tão nervosa, mas aquela hidra... quem ele pensa que é para humilhar a minha família na frente dos outros? Quem ele acha que é em dizer aquelas palavras, eu não suportei ao ver o quão ofendido e com vergonha o meu pai estava, eu o nunca vi assim, e não seria um pirralho como aquele que o faria ter esse desprazer.

Eu posso não me importar com os outros pensam, mas meu pai sim, criado sobre as duras regras de uma sociedade, onde sua imagem de homem precisa ser intacta.

Aperto o volante e acelero frustrado.

- Precisamos chegar lá vivos, não acha? - Demétrio fala no banco do passageiro.

Olho para ele e reduzo um pouco a velocidade.

O caminho para o hospital nunca foi tão longo, olhar aquela ambulância e saber que minhas duas vidas estão lá, sem notícias do que possa estar acontecendo me afligem.

Não pude seguir com a minha deusa, um paramédico viu o meu estado e me barrou de entrar na ambulância. Aquele bastardo me deixou com alguns ferimentos no rosto, o que foi suficiente para que eu perdesse tempo sendo atendido e minha deusa encaminhada ao hospital. Laura se prontificou em acompanhar minha deusa, é lindo ver a amizade que ambas possuem uma com a outra.

Acelero novamente o carro.

- Apolo! - Eros me repreende no banco de trás e eu o olho pelo retrovisor. - Não quero passar por outro acidente, reduza! - Ele fala sério.

Demétrio e Eros não me deixaram vir sozinho, se auto-convidaram no instante em que peguei as minhas chaves, posso não estar sendo muito racional, mas vejo o quão eles se importam comigo. Eros não deixaria sua noiva sozinha, e quem eu sou para negar isso à ele? Ele tem tido uma maré de infelicidade, a Laura e seus filhos são a única razão dele ainda estar aqui sendo forte.

Reduzo novamente.

- Vai ficar tudo bem com Geórgia e a bebê. - Demétrio tenta me acalmar.

- Eu fui um idiota! - Resmungo irritado comigo mesmo.

E respiro impaciente.

- Não foi, apenas não aguentou que aquele verme saísse ileso de tudo que fez, eu também não teria sangue frio para ver alguém humilhar a minha família. - Eros fala sério.

- Eu disse à Maia que isso aconteceria. - Demétrio fala frustrado. - Por deuses, como eu disse! - Ele soca o porta luvas com raiva.

- Maia sempre foi cabeça dura. - Comento.

Demétrio solta uma risada breve e seca.

- Fui casado com ela, não sei se você se lembra? - Pergunta sarcástico mostrando a mão esquerda agora sem aliança.

Ficamos todos em silêncio.

Vejo a ambulância reduzir a velocidade e vejo o hospital surgindo aos poucos. Ela vai parando até ficar na entrada do pronto socorro e o motorista desce correndo e abri a porta traseira, logo sai o paramédico que me barrou e em seguida ele ajuda Laura a descer e o vejo voltar e pegar a maca onde está minha deusa.

- Apolo, preste a atenção! - Demétrio chama a minha atenção ao ver que podemos bater em um carro parado.

Manobro o carro o mais rápido que posso e ele passa milimetricamente sem encostar no carro parado. Procuro por uma vaga, que por sinal está difícil de encontrar e soco o volante ao ver que alguém entrou na vaga que eu estacionaria.

- Desce do carro! - Demétrio manda me olha sério.

- O que? - Pergunto sem entender.

- Desce do carro e vá até Geórgia, eu estaciono. - Ele me fala tirando o cinto.

Eu não penso duas vezes e saio do carro correndo em direção à recepção do pronto socorro.

Entro ofegante e vou direto falar com a recepcionista.

- Boa tarde, em que posso ser útil? - Ela me olha de cima a baixo e dá um sorrisinho.

Tudo que eu menos preciso agora é de uma mulher sendo atirada para cima de mim.

- Boa tarde, eu gostaria de uma informação. - Tento parecer indiferente. 

- Sim. - Ela sorri e olha para minha boca.

-  Gostaria de informações sobre Geórgia Luna Capeletti Adrastéia. - Falo um pouco incomodado com sua atitude.

Ela parece demorar uma eternidade verificando algo em seu computador.

- Ela acabou de dar entrada no pronto socorro. - Ela me fala o que já sei.

- Sim, eu sei. - Falo impaciente. - Eu quero saber onde ela está. - Falo dominado pela minha ansiedade.

- O senhor é o que da paciente? É permitida a entrada somente de parentes. - Ela demora tempo demais em um contato visual.

- Ela é minha esposa. - Digo e vejo o sorriso dela ir embora no mesmo instante.

- E ai? Alguma informação? - Eros me pergunta próximo à mim em sua cadeira elétrica acompanhado de Demétrio.

- Não, ainda sem informações. - Respondo frustrado batendo as mãos nas minhas coxas.

-Senhor, no momento não é permitido a entrada de visitantes, ela está sendo atendida e no sistema já consta uma acompanhante. - A recepcionista fala me dando uma olhada.

- Se algo acontecer com elas... eu juro... eu mato aquele verme! - Brado nervoso.

- Apolo, se acalme, logo teremos notícias, Laura está com ela. - Eros tenta me acalmar.

- Não diga besteira, está apenas nervoso. - Demétrio me fala a olhar para mim.

- MINHA MULHER E FILHA ESTÃO LÁ DENTRO, COMO QUER QUE EU MANTENHA A CALMA? - Grito com ele perdendo mais uma vez o controle.

- Ela está no melhor lugar que possa estar, tudo vai ficar bem. - Demétrio chega mais perto de mim e coloca a mão no meu ombro esquerdo.

- Elas são tudo para mim, Demétrio, minha vida. - Abaixo a cabeça. - Eu não vou suportar perder outro filho, não de novo. - Me dou por vencido e deixo uma lágrima intrusa escapar.

- Não vai, você não vai. - Ele me abraça e consola.

- Geórgia é uma mulher forte. - Eros fala e me viro para ele. 

- Ela é. - Abro um sorriso ao lembrar da minha deusa.

- Senhor, sua esposa já se encontra na observação obstétrica na ala norte, no leito 101. - A recepcionista de quem eu havia em esquecido fala.

Sem pensar muito, saio correndo pelos corredores do hospital, em busca da minha deusa.


Tão sonhadoOnde histórias criam vida. Descubra agora