⁰¹¹ 『Deixe-me ajudá-la』

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Bill

Susurro palavras bonitas para o vento na varanda. Fecho os olhos, sorrindo para a brisa suave que vem de encontro com o meu corpo. Começo a resmungar alguns versos de
Automatic, enquanto permaneço de olhos fechados.

Me imagino no palco, cantando para todos aqueles que tem algum apresso por mim. Percebo que estou cantando de verdade, em voz alta. Me calo no mesmo instante. Não quero incomodar ninguém com a minha cantoria. Olho uma última vez para o céu estrelado e volto para o aconchego do hotel. Meu irmão e meus amigos, Tom, Gustav e Georg, estão sentados no sofá enquanto jogam algum tipo de jogo na TV. Passo por eles e vou direto para a cozinha. Quando estou prestes a chegar lá, o barulho da campainha chega aos meus ouvidos.

Olho para os garotos mas nenhum parece perceber. Ando até lá e espio pelo olho. A garota que ainda hoje vi. Jess, como foi pronunciado por aquele homem que não me pareceu uma boa pessoa. Abro a porta e os seus olhos encontram os meus, logo desviando. Quando a vejo, é difícil não sentir pena.

Seus olhos são opacos, sem brilho. Há olheiras profundas em seus neles, além de ter as bochechas extremamente finas. É magra demais para a sua altura... Contenho um suspiro. O sorriso forçado que ela traz faz meu coração doer.

- Desculpa te incomodar há essas horas, mas queria agradecer e pedir perdão por antes - ela diz, com os olhos no chão e as mãos entrelaçadas atrás do corpo.

Arqueio as sobrancelhas. Entendo. Ela estava em uma situação que não era de se orgulhar. Cheirava a álcool e provavelmente se sentiu mal assim que o efeito da bebida passou. Vejo um novo hematoma em seu rosto e cerro os dentes.

- Me encontro em dívida com você - Jess termina, fazendo uma leve reverencia com a cabeça, sem olhar para mim.

Sinto uma raiva que cresce lentamente em meu âmago. Lembro do rosto daquele ser que não é digno de ser considerado um homem. Lembro de seu semblante ao levar Jess consigo e a mão se fechando com força no braço da garota.

- Eu aceito sua gratidão e o seu pedido de desculpas - respondo, tentando permanecer sereno - E tenho uma proposta para ficarmos quites.

Jess levanta o olhar. Acho que ela não esperava que eu dissesse a última frase. Falou que estava em dívida comigo apenas por educação, não pensava que eu logo barganharia.

- E... qual é? - a garota pergunta, curiosa.

- Você vai ter que terminar com o seu namorado - digo, percebendo o choque que minhas palavras provocaram em seu rosto - E terá que denunciá-lo para a polícia por agressão.

Ela abre a boca, supresa demais para dizer alguma coisa. Seus olhos se enchem de lágrimas e o olhar cai para o chão novamente. Sei que foi perturbador para ela eu dizer isso, mas não voltaria atrás com a minha palavra.

- Você não precisa ter medo dele - continuo, percebendo que ela nada dirá - Vejo nos seus olhos e em todo o seu corpo o que ele faz com você. Isso não é certo. Não é amo...

- Você não entende! - sua voz se propaga, me surpreendendo. Alta. Raivosa. Chorosa - Ele arranjaria um jeito de me atormentar de outra forma.

- Mas ele estaria atrás das grades. Não poderá fazer nada.

- Você não sabe quem ele é, Bill - então ela me conhece - É terrível e não tem misericórdia. Se eu o prendesse, mandaria gente atrás da minha família. De mim. Você também, se Hassan souber que está me incentivando a isso.

- Ele tem tanto poder assim? - pergunto, mais para mim do que para ela.

Jess olha para os lados, como se alguém estivesse a espiando. Seus olhos se movem com espanto, temendo algo que não pode ver.

- Eu... já estou de saída - diz, curvando a cabeça para baixo em agradecimento e se virando para ir embora.

Não a deixo escapar. Seguro seu braço e a puxo rapidamente para dentro da porta, fechando-a em seguida. Tapo a boca de Jess e levo meu indicador para os lábios, fazendo sinal para que ela faça silêncio. A encosto contra a parede, enquanto seus olhos arregalados me observam.

Uma sensação estranha se apossou de mim desde que conheci essa garota. Algo me diz que devo ajudá-la. Salvá-la. E ela claramente precisa ser salva. Suas mãos se fecham ao redor do meu braço, em um gesto suplicante. Ela quer que eu a solte. Quer que eu a deixe ir. Quer que eu a deixe sofrer.

- Eu vou te ajudar - susurro, encarando os olhos castanhos e sem vida da garota - Não importa o que terei que fazer, vou te tirar dessa situação.

Tiro minha mão de sua boca e afasto uma mecha de seu cabelo cor de avelã do rosto. Ela não me olha, está com os olhos distantes. Está considerando minha fala. Quando acho que ela concordará, seus olhos encontram os meus. Ao em vez de ver a tristeza de antes, vejo uma raiva crescente.

- Não quero a sua ajuda - ela diz, ríspida - Eu mal te conheço e você não sabe nada sobre mim. Quero que suma da minha vida, que mude de hotel, para o seu próprio bem.

Levanto as sobrancelhas, surpreso com aquelas palavras. Algumas lágrimas começam a se formar nos olhos da jovem. Ela desvia o olhar e passa por mim, me deixando ali, perplexo. Por que ela diz não querer ajuda quando todo o seu corpo implora para ser salvo?

A observo sair, se virando para mim com um sorriso falso no rosto.

- Obrigada, mas não estou interessada em comprar os cobertores - Jess diz, acenando para mim e seguindo até o elevador.

Franzo o cenho. Cobertores? Então, entendo. Assim que ela chega até o elevador, um homem chega junto. Pela expressão dele, sei que a conhece. Não consigo ver nitidamente o rosto da garota, mas sei que ambos se conhecem.

- Amanhã virá mais modelos! - grito - Irei até você para mostrá-los!

Jess se vira para mim, com o semblante inexpressivo. Assentindo, a observo sumir assim que as portas do elevador se fecham.

Quando fecho a porta, encontro os garotos me encarando do sofá, surpresos.

- Mas que porra foi essa? - Tom pergunta.

𝐒𝐄𝐂𝐑𝐄𝐓𝐒 | 𝐁𝐢𝐥𝐥 𝐊𝐚𝐮𝐥𝐢𝐭𝐳 Onde histórias criam vida. Descubra agora