⁰¹⁴ 『Somos nós』

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Jess

- Desisto! - grita Georg, jogando as cartas na mesa - Jess é boa demais, ganhou seis vezes seguidas.

- Ou nós somos ruins demais - suspira Gustav, rindo.

Estão todos na minha casa. Bill veio fazer sua visita diária e trouxe junto com ele: os garotos. Eles são divertidos, meio malucos mas divertidos. Começamos a jogar UNO há mais de meia hora atrás. Estão todos frustrados porque ganhei a maioria das partida.

- Acho que a última opção - brinco, recebendo olhares de ofensa.

- Ok. Não sei vocês, mas eu estou morrendo de fome - diz Tom, deixando seu maço de cartas na mesa e se dirigindo ao sofá.

- Ah, sim - me levanto rapidamente - Vou preparar algum lanche para vocês, já volto.

- Jess - Bill me chama - Não precisa. Tom só está sendo dramático. Com certeza aguenta até chegarmos no hotel.

- Isso é tortura - o Kaulitz mais velho faz beicinho.

- Está tudo bem, Bill - digo, dando de ombros - Só vou pegar algo da dispensa. Um instante.

Me dirijo até a cozinha e pego uma bacia. Sorrio enquanto procuro algumas bolachas e salgados e despejo tudo no recipiente. Nunca tive meus próprios amigos me fazendo uma visita. É surpreendedor e um pouco... assustador. Não sei bem o que fazer para diverti-los, já que meu ex-namorado entretia nossas visitas com drogas.

Fico nas pontas dos pés para pegar outra bacia. Não alcanço. Penso em pegar uma cadeira quando vejo alguém ao meu lado. Minha casa não tem divisórias entre a sala e a cozinha, então, ganho um tremendo susto quando percebo a presença de um ser.

- Quer ajuda? - ouço a doce e calma voz de Bill.

- Sim - assinto, um pouco envergonhada pelo sobressalto que dei quando o vi - Aquela bacia verde, você pode pegar?

- Claro - ele diz.

Observo o Kaulitz pegar o recipiente enquanto permaneço paralisada. Assim que seus braços se levantam, sinto o cheiro de seu perfume atingir meu nariz em cheio. Além de ser gentil e bonito, Bill cheira muito bem. Não que eu seja obcecada por cheiros, mas o dele tem algo em especial. Toda vez que o sinto, tenho a total certeza de que estou segura.

Faz uma semana desde a prisão de Hassan. Nada de ruim aconteceu durante esse tempo, o que me faz acreditar que Bill estava certo. Não preciso ter medo. Aquele monstro está atrás das grades juntamente com seus companheiros. Nada pode nos machucar agora. Posso ser livre, do jeito que sempre quis.

Além disso, faz sete dias que não ingeri nenhum tipo de entorpecente. Sei que é algo bom, mas meu corpo sente as consequências. Eu estava acostumada e agora que parei, meu organismo implora por mais. Tenho enjoos frequentes e me sinto tonta quase sempre. Mas é para um bem maior, preciso me tornar uma pessoa melhor.

Bill me entrega a bacia e me ajuda a preenchê-la de comida. Estou trabalhando em um mercadinho perto daqui, o que ajuda o Kaulitz no aluguel. Ele insiste em pagar, mas me recuso a deixar tudo para ele. É isso que me intriga no cantor. Ele é gentil e simpático demais. Simplesmente incrível. O observo com atenção, como se o garoto fosse uma obra de arte. Deveria, com certeza deveria.

- O que foi? - pergunta ele, me olhando estranho - Tem alguma coisa no meu rosto?

- A-ah, não - respondo, desviando o olhar por sentir meu rosto ficar escarlate - É que... sei que já disse isso, mas não parece ser o suficiente. Muito obrigada, Bill. Obrigada por ter me tirado daquela situação deplorável. Sinto até vergonha de você ter me visto daquela forma.

O Kaulitz me encara supreso por tal fala, mas logo seu semblante muda para um sorriso que faz todo o meu corpo tremer.

- Eu sei que posso ter sido enxerido, mas eu não podia presenciar uma injustiça e não fazer nada para te ajudar - ele começa, me olhando com os olhos que tanto admiro - Você era uma flor que não recebia a luz do sol. Estava presa na escuridão total, com suas pétalas murchando de tristeza. Então, fiz o possível para levá-la até a luz. E aqui está você, uma flor linda e livre.

Sinto mais uma vez, meu rosto queimar. Bill acabou de me chamar de linda? Meu coração dispara e é meio difícil pensar. Nos dias que se seguiram, tentei entender o porquê dessa sensação toda vez que o encontrava. No começo, achei que era gratidão, porém agora, acho que gosto dele. Não apenas como amigo, mas como algo a mais. Contudo, acho difícil ser recíproco. Um cantor famoso nunca ficaria com uma viciada e pobre.

- Beija logo! - ouço a voz de Tom e de repente esqueço que não há paredes para nos dar privacidade.

Bill se vira e mostra o dedo do meio para o irmão. Solto uma risada forçada para esconder a minha vergonha. O Kaulitz recebe uma ligação e vai até a janela para atender. Levo as bacias até a sala e jogo todos os pacotes dos doces e salgados no lixo. Quando olho para a direção onde Bill está, sinto meu estômago embrulhar.

Seus olhos me encaravam com uma expressão assustadora e ao mesmo tempo triste, ainda com o celular encostado da orelha. Abro a boca pois fica difícil de respirar. Eu sei que alguma coisa terrível aconteceu e de que mãos vieram.

Quando Bill nos conta que Gilbert, um dos "amigos" de Hassan que nos ajudou a prendê-lo, foi assaltado e sua casa pegou fogo, sinto vontade de vomitar. Corro até o banheiro e deixo tudo sair. Sinto as mãos de Bill em meus cabelos, segurando-os e sussurrando palavras reconfortantes para mim. Meu corpo todo treme e uma vontade enorme de gritar se apossa de mim. O desespero me atinge e não sei o que fazer para contê-lo.

Se Gilbert foi o primeiro alvo, o próximo é Bill.

𝐒𝐄𝐂𝐑𝐄𝐓𝐒 | 𝐁𝐢𝐥𝐥 𝐊𝐚𝐮𝐥𝐢𝐭𝐳 Onde histórias criam vida. Descubra agora