XVIII - A perfeição

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O celular está escorregadio entre minhas mãos. Deve ser porque eu estou suando frio, tremendo e quase sucumbindo à confusão. Seco meus dedos na superfície áspera da calça jeans e tento desbloquear o aparelho. Não penso nem duas vezes antes de fazer a chamada. É como se finalmente eu estivesse livre, como se finalmente tivesse permissão.

Mas ele não me atende.

Tento lembrar ao meu cérebro como as coisas funcionam. Não é educado ligar para outras pessoas no meio da noite, pode ser que o celular dele esteja no silencioso, ou até que ele nem queira me atender. Mas se ao menos eu tivesse a oportunidade de falar... Eu preciso explicar, dizer todas essas coisas que estão dançando na minha cabeça.

— Frank? Frank! Não desliga — peço de imediato, mas a ligação está ruim e eu não consigo ouvir a resposta. — Você tá aí? Alô!

— Gerard? O que houve? O que você quer? — Não consigo identificar claramente quais são as emoções que a voz dele transmite. Apostaria em preocupação e impaciência.

Sei que, a partir do momento que disser que estou bem, a atitude dele vai mudar. Sei que a preocupação vai embora e só vai sobrar a impaciência, talvez a irritação venha junto, mas não é isso que quero.

— Preciso de você. Agora. — Digo simplesmente.

Não sei se ele pode notar que estou bêbado, pois não consigo distinguir o nível de alteração na minha dicção, mas isso não importa, eu só necessito da presença dele e imediatamente.

Alguns pensamentos embolados me levam à preocupação de que talvez ele já não esteja tão perto, afinal, não sei como está a agenda dele desde a quinta-feira, de qualquer forma, a situação é toda bem simples na minha cabeça.

— O que aconteceu, Gerard? Você tá bem? Tá machucado? — Agora só há preocupação. Ele ainda se importa comigo, mesmo depois de tudo. É claro que ele se importa e esse anel é a prova disso. Seguro o objeto com minha mão livre e é o suficiente para me sentir mais confiante.

— Eu não sei o endereço, mas eu vim parar nesse pub horrível em Beverly Hills e eu preciso ver você agora — a minha língua parece se enrolar no processo de expelir as palavras, mas ainda acho que estou me comunicando com clareza suficiente.

— Você não acha que eu vou sair da minha cama a essa hora pra buscar você em algum lugar, só porque você tá bêbado e carente, não é?

— Por favor? — Insisto pateticamente e o ouço bufar do outro lado.

Então silêncio. Ele parece ter abandonado a ligação e eu tenho certeza de que perdeu a paciência. Talvez não haja mesmo solução para todas essas peças irremediavelmente quebradas. Pode ser que nós só não tenhamos conserto.

Terei que sair e dizer ao Henry que vou para casa. Talvez eu deva parar de agir como um completo lunático, enquanto tento recuperar coisas irrecuperáveis...

— Gerard? — a voz dele me chama, de repente, e meu coração dispara. O que eu estava pensando mesmo?

— Sim?

— Me manda a sua localização — sua voz é seca e pontual.

— Ok — tento não sorrir ou parecer estar sorrindo.

Eu não estou bêbado, não o suficiente para não estar plenamente consciente de tudo isso, apenas para me sentir mal fisicamente e levemente confuso.

— Certo. Estou indo. Considere como o último favor que eu te faço.

O tom de voz dele é tão malvado e eu posso pensar em todas as coisas sujas que ele pode dizer nessa mesma entonação. Tenho quase certeza de que isso vai acontecer em breve e isso cria uma excitação no topo do meu estômago. Por ora estou trancado nesta cabine escura e malcheirosa.

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