3 - "Haven't been the same since I expired"

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ℭ𝔥𝔲𝔲𝔶𝔞

Chuuya esperou encostado em um poste, sob a luz fria do lampião, até a carruagem desaparecer na noite.

Quando teve certeza que ninguém o via, tomou seu verdadeiro caminho, algumas ruas adiante. Talvez fosse exagero. Problemas de confiança, como chamavam. Sinceramente, não se importava.

Osamu Dazai. Um sujeito esquisito. Que tipo de pessoa oferece o próprio sangue para um vampiro? Um senil.

Chuuya escutava os sapatos amassando a neve. A noite tinha se tornado seu refúgio nas últimas semanas. Durante o dia, quando pessoas corriam para lá e para cá, gritando suas vendas, papeando, discutindo, correndo atrás de crianças, martelando novas construções e mais um infinito número de sons infernais, Chuuya quase enlouqueceu.

Seus ouvidos perfeitamente normais de repente conseguiam ouvir uma agulha atingindo o chão como uma bomba explodindo. Demorou muito tempo para se acostumar, para conseguir se concentrar unicamente nos sons mais próximos e em volume aceitável.

Um bêbado se remexeu no banco de ferro da calçada quando Chuuya passou ao seu lado. Outra coisa difícil de compreender: o cheiro. Era sangue, mas cada pessoa possuía um tipo diferente de aroma.

Mundanos. Foi assim que Dazai os chamou, certo? Humanos comuns com seu cheiro quente e metálico.

Vampiros. Meio ardido. Como pimenta. Frio e arrepiante. O cheiro de um predador.

Dazai já era outra história. Ele não era Mundano. O sangue corria morno em suas veias, mas Dazai cheirava a morte. Como um bando de corvos berrando o aviso da morte.

Chuuya avistou seu prédio e apressou o passo. Ainda sentia o gosto de Dazai na boca. Quando mordeu seu braço foi como se incendiar, muito diferente de beber de um Mundano.

Chuuya enfiou a chave na porta e pegou o amontoado de cartas na soleira, antes de entrar.

O prédio era pequeno e estreito, com janelas opacas de fuligem. Acomodava apenas seu laboratório de Tanatopraxia — que Chuuya ignorou por completo — e se encaminhou escada acima, para seu apartamento.

Não havia nenhum tipo de porta para um semblante de privacidade. A escada desbocava diretamente na sala de estar, com o teto inclinado como o de um sótão e janelas que não abriam.

Chuuya apoiou a cesta de sangue na mesinha redonda e se movimentou para acender um lampião, antes de lembrar que não precisava de luz. Conseguia ler as letras nos envelopes com a mais pura perfeição.

Por algum motivo, esse fato enfureceu Chuuya. Ele se jogou no sofá empoeirado e carcomido, rasgando os envelopes e procurando ver do que se tratavam.

Contas. Pedidos de parentes de falecidos. E uma carta de Yuan.

Chuuya parou. O nome da amiga o encarava de volta em caligrafia desleixada.

Ele largou tudo sobre a mesinha e esfregou a mão enluvada no rosto. Não respondia à ela ou à ninguém desde a noite em que acordou no cemitério. Coberto de terra, os dentes doloridos e a barriga vazia.

Chuuya falou sério naquela hora: iria matar esse Vampiro Demônio.

E para conseguir esse feito, precisava ser esperto. Se manter são. Aproveitar a oportunidade entregue em seu colo ao ter sido encontrado por Dazai e concordado em ajudar na investigação.

Chuuya procurou em meio à sua bagunça por pedaços de pergaminho e uma caneta tinteiro. Escreveu e selou respostas para seus clientes, dizendo que não poderia trabalhar por algum tempo devido à uma enfermidade.

What The Dead WhisperOnde histórias criam vida. Descubra agora