10:03, 13/4°/551 Ano Ancestral

— Tu podias ajudar nisso, Júlio. — Disse a prefeita, desconfortável.

— Por que queres colocar um civil nisso? — Questionei, indignado.

— Porque assim como esse criminoso, tu também podes voar! Ele tem uma enorme vantagem que ele tem sobre a guarda da Capital. Só conheço tu e alguns parentes teus que têm essas habilidades...

E mais uma vez esse assunto... Eu sempre ficava incomodado quando Miriã vinha até a defensoria pública para me ver, nunca entendi o motivo disso. Literalmente a pessoa mais importante da cidade para seu dia, que deveria ser bem atarefado, para jogar conversa fiada fora ou me pedir alguma coisa aleatória. Algumas vezes o assunto do morcego se repetiu. Excêntrica...

Não só nas atitudes, como também na aparência. Os longos cabelos roxos tinham um tom bem marcante, mas o pouco de frizz sempre tirava a cor, sem falar num maldito cabelo rebelde no topo de sua cabeça, ela dizia que gostava do fio, mas achava idiota. O queixo sempre empinado, como todo membro da casa de Verídico que se orgulha tanto da riqueza e status social. Os olhos pretos e profundos dela tinham vasos sanguíneos saltando em vermelho, normal, mas me incomoda. Havia esse pequeníssimo erro no desenho de seu lápis de olho que deixou um lado três milímetros maior que o outro. E falando em maquiagem, como Miriã exagerava. Com tanta base e blush, sempre ficava parecendo uma bonequinha de plástico de nariz fino e delicado. O vestido desnecessariamente caro e roxo combinava com seus cabelos. Era do tipo vestido império com fitas de seda verde importadas. "Elegante", de fato, mas nunca diria isso na cara dela.

— Sou só um trabalhador comum que segue sua rotina todo dia... Como, exatamente, eu ajudaria? Não sou mago como alguns membros da guarda e muito menos consigo ter coragem de pegar em armas, me tremo todo só de pensar. — Tive um calafrio ao falar e bati minhas asas.

— Julinho...

— Por favor, não me chame assim, Miriã. — Respondi, incomodado.

— Tá, tá... É que o morcego é um grande problema, um justiceiro que faz o que quer com as próprias mãos. O juiz, o jurado e o executor! Tem noção de quantas pessoas ele matou ou mandou pro hospital só nesse último mês?

— Dezenas, eu sei... — Mas todos eram criminosos. — É um problema e concordo contigo, mas não acha que a onda crescente de protestos deveria ser sua prioridade, prefeita?

— Ah, mas é que... — Ela se encabulou com isso, rosqueando os cabelos longos no indicador.

— Vais arranjar outra desculpa? Sério? Olha, sou teu amigo e tudo mais, mas a insatisfação da população com o fato da guarda ter magia de Dominação até hoje é completamente válida. Deverias falar com seus assessores e vereadores, ver o que pode ser feito com relação aos veteranos e aposentados da guarda que vão chiar por conta disso. Ficar parada é a pior coisa que podes fazer.

— Estou vendo isso também, mas o morcego é realmente o assunto que queria resolver primeiro.

— Tu escolhes como fazes teu trabalho. — Suspirei e me levantei da cadeira na sala de descanso. — Podemos voltar a trabalhar ou quer conversar sobre outra coisa?

— Está me expulsando do emprego que eu te dei? Tu veja bem, ein! — Miriã disse, de braços cruzados e beicinho feito.

— Espero que isso não tenha sido uma ameaça. Enfim, Douglas vai me perturbar por demorar tanto falando contigo, não é porque és a manda-chuva da Capital que podes fazer o que quiseres. Sem falar nas piadinhas que vou ter que ouvir depois...

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