25:00, 17/8°/551 Ano Ancestral

Finalmente, o dia de marte havia acabado. Apesar de ter sido um dia abarrotado de tarefas, foram fáceis de resolver no geral. Depois de tantos empecilhos e problemas um dia tinha sido fluido e tranquilo, mas não tinha muita animação ou vontade de ir para casa, tudo que me aguardava era mais solidão.

Tentei não pensar nisso, na realidade, eu comecei a pensar o que faria para resolver o problema. Obviamente eu precisaria conversar com Samira para tentar fazer algo a respeito. Comecei a juntar palavras e ensaiar sozinho o que diria. Sinceramente, todos que passaram por mim devem ter pensado que eu era maluco. Mesmo que o Índice Encantado guardasse as palavras que pensava, eu andava com um caderno de bolso onde escrevia o que sentia. Depois de escrever, lia em voz alta e isso acabava gerando alguns momentos no mínimo... constrangedores. Esperava mesmo que aquela humilhação fosse recompensada.

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10:47, 02/9°/551 Ano Ancestral

Em algumas oportunidades raras, meu trabalho me permitia ir até o ninho das cobras, também conhecida como câmara dos vereadores. O local era bem localizado, próximo ao palácio Anchieta e numa rua pouco movimentada. Como dita a democracia, as sessões ordinárias eram de livre acesso ao público e havia locais para os interessados em acompanhar o andar do poder legislativo da Capital.

O local não era muito confortável, estava sozinho no segundo andar da sala que era um mezanino. Alguns biscoitos murchos estavam servidos e um bebedouro pingava preguiçosamente no canto esquerdo. Lugares velhos pareciam sujos e a pouca luz do mezanino enquanto a sessão começava em baixo. Seis mesas repletas de papéis com dois lugares estavam dispostas ao redor de um palanque no chão da sala, onde os 10 vereadores se sentavam falando com seus assessores e discutiam os projetos de lei. Acima de suas cabeças e na parede que fazia fundo de tudo, uma estrela dourada de dez pontas, o símbolo da Deusa, era ostentada.

Havia um vereador discursando sobre um projeto de lei inútil sobre cultura e arte, era incrível que o foco nunca era algo como "índice de criminalidade" ou "ascensão do tráfico de drogas". Onde diabos estava o foco daqueles vereadores? Eles deveriam representar o povo e seus interesses! Não inventar abobrinhas sobre projetos de lei fajutos que só serviam para inflar seus números.

Após os discursos, votos e todos os assuntos terem sidos debatidos, a sessão se encerrou. Não houve qualquer alteração na legislação que afetasse a área dos defensores públicos, então vim para nada. Como resultado, apenas voltei para a defensoria pública relatar as possíveis mudanças na legislação. Estevão também não tinha comparecido, na realidade, fazia dias que ele não era visto.

Comecei a ponderar que ele fora assassinado ou fugira. Fazia sentido, afinal, se dois de seus colegas de crime haviam sidos assassinados, seria bem provável que tu serias o próximo. O resto do dia tinha sido igualmente monótono e sem graça. Sinceramente, comecei a achar que fazia as patrulhas mais pela adrenalina do que pela justiça.

O relógio badalou às 25 horas, guardei minhas coisas e suspirei em cansaço. A dor da solidão começou a me cobrar o vigor de meu corpo. Despedi-me de todos enquanto andava em direção à minha casa passando pela mesma muvuca de sempre.

Mesmo rodeado de tantas pessoas, me sentia sozinho e abandonado. Eu queria tanto ver Samira que faria qualquer coisa para ter em meus braços por um segundo que fosse. Pediria perdão e faria qualquer coisa que ela pedisse.

Então, alguém esbarrou em minhas asas. Como sempre, aquelas coisas espalhafatosas me atrapalharam. Quando me virei para dizer que estava tudo bem, senti que o destino cedido pela Deusa era bondoso, pois Samira estava justamente à minha frente. Congelei. Ela estava vestindo aquele mesmo cropped branco que adorava, shorts jeans e um sapato qualquer surrado. Perfeita, linda como sempre.

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