29:00, 05/6°/551 Ano Ancestral

Pelo visto, pontualidade não era o ponto forte daquele povo. Mesmo marcando o show para começar às 29:00, tudo que tinha era uma fila com três pessoas vestidas de preto e com cortes moicano que me olhavam estranho. Eu não conhecia quem ia se apresentar, uma quantidade considerável de bandas com nomes grotescos e a atração principal, Vira-Lata Mecânico. Quando os portões da Casa de Música e Bebedeira se abriram, percebi que ficaria um bom tempo sem fazer nada.

Não só por conta do quantitativo de indivíduos no local, também pela forma como me olhavam. Talvez fosse por conta das minhas roupas? A culpa não era minha, eu não tinha como saber que camisa social branca e calça caque não iam ser bem vistas. Todos estavam vestindo casacos de couro preto mal acabados e/ou jeans escuros, assim como algumas roupas mais ousadas que desconhecia. Pela Deusa, onde eu estava!?

O local em si, ao menos, parecia organizado. Havia um palco onde alguns funcionários revisavam o equipamento para as apresentações. Um segundo palco ao lado já estava pronto, decorado com um cachorro feito de bronze e jorrando óleo. No chão caixas de som amplificadores bem localizadas para melhor distribuição do som. Um pequeno jogo de holofotes para um show de luzes terminava a decoração. Também tinha um bar no canto direito com preços superfaturados, mas a água tinha preço acessível.

Tinha seus defeitos quanto a sujeira e algumas vigas tortas que me deixaram preocupado, mas tentei relevar pra parecer tranquilo para Samira... Ela pediu para que eu viesse aqui como pagamento pelo serviço dela, porque aceitei isso? Eu nem gosto do tipo de música que esses malucos começavam a cantar. Foi só depois das 30 horas que as apresentações secundárias começaram, assim como boa parte do pessoal chegou. É incrível como não havia variação nas cores deles, no máximo, alguém chegava com uma camiseta de time amassada.

Quando finalmente começaram a tocar, era criminosamente agressivo. E sem falar no comportamento do povo em geral, ficavam balançando as cabeças de cima para baixo de forma extremamente violenta. Mais um pouco e aqueles pescoços iriam quebrar.

E com apenas 2 horas e 19 minutos de atraso, Samira, Agnes e uma terceira de cabelos verdes chegaram. Ela já estava com uma cara de decepção olhando pra amiga que agora tinha cabelo cor de rosa? Não era azul? Nenhuma novidade quanto ao visual rebelde e gótico de Agnes, que se agarrava com a garota de cabelos verdes. Aquilo era, definitivamente, "segurar vela". Entendia como ela se sentia, na faculdade acabei tendo um amigo que fazia o mesmo comigo...

Percebi que as três me viram e então Agnes ficou incrédula falando com Samira alguma coisa. Estava surpresa em me ver. Justo. Ela também não sabia quem eu era, imagino que desculpa maluca fora dada para justificar minha presença. Finalmente, as três chegaram:

— Err... Júlio, né? Prazer, sou a Agnes, essa aqui é minha namorada, Maria.

A garota em questão era uma Mestiça, tinha cabelos curtos, um chifre pequeno na lateral da testa com uma boa quantidade de piercings. Dentes pontiagudos e, assim como 99% das pessoas daquele local, vestia preto. Ergui a mão para cumprimentá-las, mas reagiram quase que com repulsa ao gesto. Eu estava sujo? Ou esse povo não tinha modos para fazê-lo? No fim, acho que se forçaram a apertar minha mão e então Samira me deu um soco no braço dizendo:

— Que porra de roupa é essa?

— Ah, é... o que costumo vestir casualmente, não sabia que tinha uma regra para isso...

Ela riu de mim, fiquei irritado com aquilo, mas evitei demonstrar. Olhei pra ela de cima para baixo e notei que mesmo naquela iluminação porca era possível ver que, assim como eu, ela fazia parte do 1% que não vestia apenas preto. Uma calça azul com rasgos e bem justa destacava as coxas malhadas e poderosas dela, uma blusinha cinza de mangas curtas tinha a mesma logo do palco principal. Agnes olhava para nós dois e disse:

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