Capítulo 2

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  Maraisa voltou para casa com varias coisas martelando na cabeça. Uma criança de 5 anos em uma colônia de férias em outra pais. Um pai que trabalhava sempre e raramente estava em casa. Uma mãe morta há anos. Uma governanta simpática mas muito atenta. Na sua mão um verdadeiro dossiê. No ônibus ela começou a ler coisas medicas. Tipo de sangue, dados do nascimento como peso e altura, alergia escola, para um menino de 5 anos ele era bem esperto.

Mas uma coisa lhe chamou a atenção.
Antônio apresenta ótimo desempenho no aprendizado, mas ainda existem pontos de dificuldade na interação social com outros colegas, sendo muito restrito e reservado.

Ao chegar em casa decidiu deixar o contrato de lado e focar no seu TCC. Seu orientador já estava lhe cobrando algumas coisas e se ela não focasse agora seria tarde demais. Isa chegou da escola no final da tarde, Maraisa ajudou a esquentar seu lanche e separou a roupa da menina. Enquanto penteava o cabelo dela se perguntava se Antônio seria tão falante quanto Isa.

- você ficou tão quieta depois do jantar. Foi tudo bem na entrevista? – Maiara perguntou enquanto levava um copo de sorvete para a irmã que estava com o olhar perdido na televisão.

- foi tudo bem sim, minha semana de experiencia vai ser semana que vem.

- você não parece muito animada.

Maraisa desligou a TV e se voltou para a irmã ao seu lado. Olhou para o sorvete dentro do copo, cutucou a colher enquanto pensava nas melhores palavras para expressar o que estava sentindo.

- sabe aqueles filmes em que o marido fica viúvo e tem que cuidar do filho pequeno, mas ele fica tão triste que se afoga no trabalho e esquece da criança?

- ah não... – Maiara entendeu tudo.

- aquele apartamento é lindo, Maiara, mas tão vazio de vida. Parece que ninguém mora lá, muito menos uma criança.

- o menino não estava lá?

- o menino foi mandado para uma colônia de férias no Uruguai, o pai trabalha muito, quer dizer... eu e você não temos onde cair morta, mas nessas férias fizemos um monte de coisas legais com a Isa, levamos ela para vários passeios.. isso é ser uma família, sabe?

- você não diz isso só porque é muito pessoal para você esse cenário?

As gêmeas perderam a mãe e o irmão mais novo quando ainda eram crianças. A gravidez da mãe das meninas foi difícil, infelizmente nem ela, nem o bebe sobreviveram. O cenário de ter o pai afogado em trabalho e vícios era real demais para ela. Sim, talvez a vida desse garoto mexesse com ela.

- pode ser...

- talvez a gente tenha essa visão do pai do menino, mas vamos ver como vai ser na vida real e então você tira suas conclusões, está bem? – Maiara lhe deu um beijo na testa e levantou do sofá. – vou dormir, tente descansar também.

Mas Maraisa não conseguiu dormir naquela noite. E pregar os olhos até a primeira semana de agosto tinha sido uma tarefa difícil. E isso foi logo notado pelo seu professor.

- gostaria de contribuir com a classe seus pensamentos divagantes, senhorita Pereira? – escutou a voz de Vicente.

Ele era seu professor de ética do profissional jurídico. Um ótimo professor, mas também muito exigente e que não permitia que seus alunos perdessem o foco dos seus ensinamentos. Maraisa foi tomada pelo susto e logo sentiu o rosto ficar quente com toda atenção da sala voltada para ela.

- não, senhor.

Ele não se deu por convencido, mas continuou a aula. Logo ela chegou ao fim e enquanto Maraisa guardava suas coisas na bolsa e olhava as mensagens de Maiara em seu celular, Vicente se aproximou de sua mesa.

- estava distraída hoje. – ele falou com um sorriso simpático. -algum problema com o TCC?

- não, senhor. Sua orientação tem sido muito bem vinda, obrigada por me aceitar como sua aluna.

Vicente cruzou os braços e se apoiou na mesa da frente. Maraisa estava se preparando para um sermão sobre como tinha que prestar mais atenção e se dedicar mais, que era muito distraída e suas notas nos relatórios não eram tão boas assim, mas o que veio foi uma agradável surpresa.

- eu vejo muito potencial em você, Maraisa. – ele falou em um tom sincero. – eu sei que professores de outros anos não entendiam seu TDAH e te diminuíam por isso, mas eu não te vejo assim. Eu acredito que você tem uma carreira brilhante, seu TCC me prova isso.

- obrigado, professor.

- a única coisa que eu não entendo é sua aversão pelo trabalho em um escritório de advocacia. – Maraisa sorriu por ter que explicar pela decima vez.

- muitos escritórios não tem paciência, professor. Eu prefiro me dedicar a prova de titulo por enquanto.

- veja, eu tenho um amigo que tem um ótimo escritório, o melhor de São Paulo, e eu sei que o programa de estagio deles é muito aberto ao aprendizado do aluno, se quiser eu posso te indicar lá. Gostaria? – Vicente tentou mais uma vez.

Ele simplesmente não entendia como uma jovem tão talentosa poderia se podar tanto em seu potencial. Se perguntava quantas vezes Maraisa tinha escutado que não era boa o suficiente para as coisas.

- eu acabei de arranjar um emprego, professor, mas obrigada. – Maraisa colocou a bolsa no ombro e sorriu mais uma vez. – obrigada por acreditar em mim.

O caminho ate o jardins foi feito com a mente atolada em todas as matérias que tinha que estudar quando chegasse em casa. Logo que entrou no grande apartamento, Rosa veio correndo pegar sua bolsa.

- esta atrasada. – falou seria.

- desculpa o ônibus demorou, esta chovendo.

- querida, se for assim eu vou disponibilizar o motorista para te buscar, está bem? Mas sem atrasos, o senhor Mocó odeia atrasos.

- ele está aqui? – Maraisa perguntou assustada.

-não, mas ele sabe de tudo, portanto...

- sem atrasos. – A morena concordou.

Rosa a mandou subir para o quarto de Antônio, o menino já estava a esperando. De repente Rosa sumiu e ela se deparou na casa vazia e fria. Como podia tudo ser tão... técnico, tão pratico? Subiu as escadas devagar, caminhando pelo corredor do andar de cima ate o quarto da criança. Bateu na porta esperando a autorização para entrar. Não ouviu nada.

Quando foi bater de novo, a porta se abriu. Ela deu de cara com um menininho de cabelos e olhos castanhos, que abriu um sorriso de dentes de leite e agarrou suas pernas. Isso era bem diferente do que ela estava esperando.

- uau, que abraço gostoso! – Maraisa falou rindo. Ali estava o pingo de gente de vida dentro daquela casa, reclusou em seu quarto.

- eu sabia que você ia chegar um dia! – ela ouviu a voz abafada contra suas pernas.

- eu só estava um pouco atrasada, achou que eu não vinha mais? -  A morena perguntou rindo.

- você demorou muito. – Antônio falou novamente.

Maraisa se perguntou se deveria se desculpar pelo atraso, mas sentiu que não era sobre isso que ele estava falando. Um calor invadiu seu peito. Ela guiou o menino para dentro do quarto. Antônio finalmente soltou sua perna, mas logo pegou sua mão.

- a gente vai brincar muito!

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E aí, estão gostando? Quero saber a opinião de vcs p continuar...

Amanhã volto com o terceiro 🥰

Bjs e até o próximo!❤️👋

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