Cap. I

195 13 4
                                    

Quem mais?

Quem mais poderia trazer-me a paz que eu procurava?

Quem mais poderia ouvir o meu choro e todo o meu lamento?

Apenas tu.  A lua.

Sentada na minha varanda, mais uma noite sem conseguir dormir, olho a lua e canto uma canção de ninar.

Poderia muito bem fazê-lo do mesmo modo mas com o meu filho aqui comigo.  Deus não quis.  Filipe acabou por falecer poucas horas depois de nascer.

Apesar do meu companheiro ter sido um canalha e me ter abandonado assim que soube da gravidez, eu passei nove meses tranquila e tudo estava bem.  Pelo menos aparentemente.  Sou médica e posso garantir que nada de anormal foi detectado na minha gestação.

A verdade é que horas depois de Filipe nascer, teve uma paragem cardíaca e acabou por falecer.

Refugiei-me no trabalho.  Sou médica obstetra e trabalho na maternidade do hospital local.  Agora dedico-me a cuidar dos filhos dos outros.

Há tanta criança a vir ao mundo sem amor.  Porque é que Deus havia de levar o meu que eu amava tanto?

Durante os primeiros dias eu doei o leite para o banco do hospital.   Já se passou um mês e eu não tenho coragem de não o fazer porque sei das carências por que passamos.
Eu sei que o meu leite alimenta estes seres indefesos.

Decidi voltar ao trabalho.  Precisava estar ocupada para não pensar besteiras, mas estava um pouco cansada.  De dia estava no hospital e de noite não conseguia dormir.  Não as horas necessárias.

- Bom dia doutora. Mais uma noite em claro?

- Mais ou menos.  Dormi 4 horas,  Alice.

- Vê-se pelas olheiras, doutora Juliette.

- Hoje nem tive paciência para a maquilhagem.

- Agora de manhã está tudo tranquilo.  Se quiser encostar-se um pouco na salinha!  Se houver urgência eu vou chamá-la.

- Vou ver o que temos para agora.

- Ia buscar café.  Quer que traga para si?

- Sim, mas com leite e um sanduíche de queijo.  Obrigada,  Alice.

Entrei no meu gabinete e fui consultar os processos que estavam sobre a minha secretária.  Realmente hoje era um dia calmo como disse a minha enfermeira assistente.

Ela chegou com o café, eu tomei e comi a sanduíche e depois encostei-me no pequeno sofá que ali havia.

Adormeci quase de imediato e sonhei com uma menina morena, cabelos longos e cacheados que chorava muito.  Estava sózinha numa pracinha e olhava para todos os lados.

Eu aproximei-me dela, perguntei o nome e sobre os pais.   Ela não respondeu, só chorava.   Abracei-a e fiz-lhe um carinho na face.  Ela sorriu para mim e no momento seguinte sou despertada pela voz da Alice.

- Temos uma urgência,  doutora Juliette.

- Vamos lá.  Deixa-me apenas passar uma àgua no rosto.

Deixa-me cantar à LuaOnde histórias criam vida. Descubra agora