Um Serafim, Uma Súcubo

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—Seu pai era um serafim, e o único anjo em quem eu confiava, eu nunca fui aceito entre os esnobes do paraíso ou pelos demônios.—Dante havia saído do canto onde ele se escondia e estava agora inclinado na parede a minha frente de braços cruzados.—Eu não sou como Lúcifer, eu já nasci como um anjo caído, não sou um demônio e nem um anjo, sou o meio termo. Os anjos odeiam o novo, já que na visão deles, é algo problemático, então fui rejeitado logo em meu nascimento. 

Eu apenas ouvia, eu estava desesperado pra saber onde o meu pai se encaixa nessa história.

—O códex não é só um registro, em termos humanos é um banco de dados, um amontoado de informações sobre tudo no universo devidamente registrado e organizado. A minha existência está diretamente ligada a ele, bem como a minha tarefa de protege-lo.—Ele levou cigarro até a boca tragou, eu sou o único que sente o cheiro da fumaça, Eros e Oliver apenas esperam eu passar suas palavras a eles.

—Mas ele não é um banco de dados qualquer, o que acontece com ele tem impacto direto na memória do mundo todo, arranque uma página sobre uma planta e boom, ninguém mais lembra sobre ela em toda a criação. Um pouco depois da morte do Lúcifer, eu fui atacado por anjos, sai ferido desse embate e acabei perdendo o livro tentando fugir, eu sabia que era questão de tempo até arrancarem as páginas sobre mim pra que ninguém descobrisse o crime, então eu fui até a única pessoa que poderia me ajudar.

—Meu pai...—Ele apenas acenou com a cabeça, sem conseguir me encarar.

—Meu corpo já não tinha mais salvação, mas minha alma sim, seu pai decidiu me selar na única pessoa que poderia me ajudar, aquele que com certeza seguiria seu legado e acharia um jeito de me salvar. O problema é que selos em coisas vivas funcionam de forma diferente, duas almas não podem habitar o mesmo corpo, a mais forte anula a outra pra abrir espaço. Então seu pai sacrificou a vida pra atrasar o processo, criando uma espécie de cadeado que só poderia ser aberto pela presença conjunta de um anjo e um demônio agindo com esforços opostos, mesmo que não intencionalmente. Agora o nosso tempo tá passando, se não tirarmos logo a minha alma do seu corpo, você vai deixar de existir e eu vou assumir, não existe pós vida pra almas apagadas. Vai ser só escuridão eterna enquanto eu desfilo por ai com o seu corpo.

Eu me mantive em silêncio. É... É coisa demais pra processar. O Dante é uma maldita bomba relógio que o meu pai plantou em mim, eu tô prestes a morrer!

—E, de novo, você tem ideia de onde o códex possa estar?

—Eu já disse que tenho moleque, mas a parte difícil não é achar ele, é encontrar uma maneira de me tirar de você sem que isso nos mate.—Dante apagou o cigarro pisando nele.—E então? Vossa majestade estaria disposto a me ajudar?

Dante esta irritado comigo. Eu? Estou tentando digerir tudo. Por que meus pais nunca me contaram? Essa merda de selo vai me matar!

—Escuta, você vai ter tempo de questionar a sua vida depois, a gente tem que correr! Passa pros seus namoradinhos e vamos a luta!

Infelizmente, ele tem razão. Comecei a contar tudo pros dois, quanto mais eu avançava na história, mais eles ficam horrorizados, principalmente o Oliver. Achei mesmo que seria pior pra ele, ouvir que o conselho do qual participa é corrupto não deve ser fácil. Ao fim do conto, Eros tinha uma expressão séria enquanto Oliver agarrava os cabelos em silêncio, provavelmente tendo uma crise de pânico.

Alguns momentos depois, Eros se levantou bruscamente da cama onde estava sentado e discou um número no celular.

—Laura? Liga pra Katty, diz pra ela se encontrar comigo no clube em meia hora, fala que é urgente.—E então ele desliga com um suspiro.

—Quem é Katty?

—Se arrumem, a gente sai em 15 minutos, eu dirijo.

—Eros, me conta, o que você tá planejando?

Ele segurou meus ombros em um ato terno, olhou em meus com um olhar confiante que realmente conseguiu me reconfortar, mesmo que momentaneamente e dizendo "confie em mim", então eu apenas concordei com a cabeça, suspirando.

Oliver não disse mais nada, apenas saiu do quarto com o rosto de alguém que acabou de ter uma crise existencial pra se arrumar no próprio quarto, já eu fui tomar banho. Fiquei um tempo muito maior do que eu gostaria de baixo do chuveiro, tudo que acabei de ouvir ainda está passando pela minha cabeça. Por que meu pai se sacrificaria por esse cara?

—Porque o seu pai se importava de verdade comigo... e eu me importava muito com ele também...

Me assusto com a voz do Dante, consigo ver ele através do vidro embaçado, sentado na privada sem olhar pra dentro.

—Que porra você tá fazendo aqui!? Me deixa em paz!

—Não tem nada de você que eu já não tenha visto, garoto.—Consigo quase ouvir os olhos dele revirando no próprio crânio.—A gente tá preso um ao outro, então... foi mal pelo o que eu disse antes, não é fácil ter estado assistindo tudo por anos sem poder fazer nada e então acordar sem mais nem menos sendo só uma aparição, é como assistir o seu corpo se mexendo sozinho e você fosse só um espectador. E quando você finalmente acorda, percebe que foi expulso e tem outro cara andando por ai com seu corpo...

—Mas o corpo é meu!

—Eu sei, e é por isso que eu quero que você corra, não é justo com você. Seu pai sabia que você era capaz de se salvar caso o selo começasse a agir, por isso decidiu que era a melhor pessoa pra isso.

—Eu não me lembro de nada disso, o que significa que eu era novo demais pra sequer lembrar, como vocês achavam que uma criança sequer iria conseguir lidar com isso?

—É exatamente por isso que a sua mãe maquiou a sua alma, pra te esconder dos anjos e dos demônios e evitar que o selo se quebrasse. A intenção não era desfazer o selo, era nos manter escondidos e seguros do conselho e de qualquer demônio mal intencionado, já que se matarem você, eu morro também.

—Eu só não consigo entender, por que ele me colocaria em risco por você?

Dante se calou. Ele não estava mais lá, tinha desaparecido completamente. Decidi terminar meu banho.

Ao sair, só tive tempo de me vestir, já que Eros e Oliver já estão prontos. Entreguei as chaves do opala a ele, Oliver foi no meu colo, já que só tem dois bancos. Mas dessa vez não teve malicia, estamos todos com a cabeça cheia pra sexo agora.

Eros rodou pela cidade calado, assim como nós dois. Isso até chegarmos ao clube. Não conversamos com ninguém e apenas nos dirigimos ao quarto, Laura nos esperava do lado de fora e também não disse uma palavra sequer.

Ao adentrarmos o lugar, me deparei com a figura de uma mulher alta de costas pra nós com cigarro nos dedos parada em pé no centro do quarto. Seu cabelo é preto e possuí varias tranças decoradas com contas vermelhas e penas coloridas, ela usa brincos de argola com pentagramas no centro e usa apenas um sobretudo bege, além dos coturnos pretos.

—Will, deixe eu te apresentar, essa é Katty Margerit, aka Megera, a súcubo mais poderosa de todo o inferno.

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