Mashchetet

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—E então, o que achou?—O cabeleireiro perguntou com o espelho nas mãos, mostrando o resultado do meu novo corte, eu apenas assenti.

Fazia tempo que eu deixava meu cabelo crescer, então é meio estranho me ver de cabelo curto. A parte baixa tem um degradê bem feito, já em cima, as mechas onduladas ficam jogadas de lado e alguns poucos fios caem sobre o olho. Eu quase não me reconheço direito, mas não ficou um corte ruim. Paguei o corte—que foi caro pra cacete, inclusive.—e voltei ao dormitório a fim de me livrar dos cabelos pelo corpo. Tomei um banho demorado, e nisso senti falta da presença de alguém. Sim, o Eros ainda não voltou, mas pelo menos respondeu algumas mensagens minhas, ele tá no clube, seguro, e ainda tá processando tudo o que aconteceu.

Fico feliz que ele pelo menos tá falando comigo, mas ainda sinto sua falta, daquele jeito brincalhão e extrovertido, da sensualidade e das provocações. Tenho medo de que as coisas nunca voltem a ser como eram antes.

Assim que sai do banho, acabei dando de cara com o Oliver, mas ainda estando de toalha. Nós ficamos nos encarando por um período angustiante e constrangedor, até ele finalmente resolver quebrar o silêncio.

—Você lembra que a gente já fodeu né? Não tem nenhuma parte do seu corpo que eu já não tenha visto.

—Não torna isso menos constrangedor.

Reconheci o sorriso provocador nos lábios dele enquanto ele se aproximava jogando os quadris de um lado pro outro.

—Eu posso aliviar o constrangimento, sei que tá passando por uns problemas um tanto sérios, deixa eu te ajudar.

Parei ele antes que continuasse.

—Outra hora Oliver, eu não tô com cabeça pra isso agora.

—É por causa do Eros, não é?—Acenei com a cabeça.—Ele contou pra gente, você partiu o corazón dele, ele chorou por um bom tempo.

—Acho que vocês tão me odiando agora né?

—Ódio é uma palavra muito forte, mas que eu tô com vontade de te dar uns tapas, ah isso eu tô.

—Não se contenha então, desconta sua raiva, eu mereço.

Assim que disse isso, senti meu rosto arder com um tapa que ele realmente me deu. O que dizem sobre arqueiros é verdade, eles tem uma mão pesada pra cacete.

—Nunca mais faça isso, valorize o homem que você tem, porque não tem ninguém igual a ele.

—É, disso eu sei.—A marca do tapa ainda estava lá quando me olhei no espelho.—Foi só pra isso que você veio?

—Na verdade, eu queria conversar, tentar entender pelo que você tá passando, sabe, uma conversa de anjo pra anjo.—Nos sentamos lado a lado na cama e acabei soltando uma leve risada com o último comentário.

—Às vezes eu esqueço disso.

—Como assim?

—Sei lá, alguma parte de mim ainda tá presa à minha vida como um humano.

—Se sente triste de ter vivido uma mentira?

—Não é isso também. Acho que foi uma virada tão brusca, do dia pra noite eu ainda era só um humano namorando um demônio e do nada eu sou um anjo com a alma de outro anjo me matando aos poucos e falando comigo como uma alucinação.

—Foi tudo muito repentino, né? Mas infelizmente as coisas são assim pra nós, seres celestiais. Chega sempre uma hora que a gente deixa de acompanhar as mudanças e só segue o fluxo, você vai se acostumar, confie em mim.

—O problema é que eu não sei o meu lugar no meio disso tudo, as coisas tão acontecendo e eu pareço estar no meio disso tudo sem um rumo. E o pior é que se eu não agir, posso muito bem acabar morrendo.

—E você não conseguiu comunicar isso pra ele?—Apenas balancei a cabeça em resposta.—Tenho certeza que o Eros vai entender quando você explicar, mas sabe o que eu acho? Que você tá certo em querer lutar pela própria vida.

Olhei pra ele atordoado, não consegui responder diante daquele comentário. Como ele pode entender o que eu sinto?

—Sabe, eu nunca estive na sua posição, de estar correndo contra o tempo, mas de uma coisa eu entendo: A sensação de não estar no controle da própria vida. A mercê de uma força maior que a sua.—Posso ver seus olhos se distanciando da conversa, ele está lembrando do passado.—E pra isso, eu só vejo uma opção, você não pode parar de lutar. Se tiver que matar, mate, se tiver que queimar, queime tudo até virar cinzas, mas jamais deixe de lutar pela liberdade de viver a sua vida como bem entende.

Acabei soltando uma risada anasalada com esse monólogo vindo dele, fazendo Oliver arquear uma sombrancelha.

—Desculpa, é que eu não esperava ouvir isso logo de você, sabe? Um anjo.

Foi a vez dele rir.

—Você tem uma ideia muito errada do próprio povo, nós podemos ser tão, e às vezes até mais cruéis que os demônios, sabia?

—Disso eu sei, já ouvi sobre essa crueldade, mas pros outros, vocês parecem ser mais contidos, sei lá, é tipo uma falsa máscara de benevolência, sabe?

—Ah, rude? Você diz essas coisas sobre o Eros na cara dele também? Enfim, alguns de nós não fazem nenhum esforço pra esconder a nossa natureza violenta, inclusive, existe um anjo que personifica a própria morte.

—Nunca ouvi falar de um anjo assim, quem é?

—Ah, é porque ele ainda não deu as caras, o nome dele é Azrael—Minha expressão se fechou na hora, um calafrio subiu pela espinha.—, chamam ele de anjo da morte, o carrasco, o juíz, ou o mais famoso: mashchetet.

—, chamam ele de anjo da morte, o carrasco, o juíz, ou o mais famoso: mashchetet

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Mashchetet: Destruidor.

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