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▪︎ Ana Rodrigues

Eu não sei dizer o que estou sentindo, poderia resumir tudo em dor, uma dor que não é só física, uma dor que vem de dentro da alma. Que vem da mentira,
do sentimento de ser enganada, da decepção, uma dor que não passa, que dilacera o coração, e imaginar que tudo que vivemos juntos foi uma mentira, me dói...

— Ricardo, isso não é hora de ficar de pirraça. - ouço minha mãe dizer, mas ainda permaneço com os olhos fechados, me sinto meio perdida sem saber exatamente onde estou e por qual motivo estou aqui.

— Pirraça? Nossa filha está desacordada há dois dias em uma cama de hospital,
Raquel, por culpa daquele irresponsável. Eu te disse que não teria segunda chance, eu nem queria esse envolvimento. Ele não vai mais chegar perto dela.

Meu pai soa firme, me  trazendo uma enxurrada de memórias ruins. Richard, a traição... Cada detalhe vem à minha memória com a força de um tornado me acertando em cheio, assim como lembro do acidente. Minha estupidez de atravessar sem olhar, no meio da chuva. Isso poderia ter sido bem pior.

— Precisa pelo menos informá-lo de como ela está, Ricardo. Você viu o estado dele, tem mais de 24h que ele está acampado na frente do hospital. Tem que contar a ele o que houve, dar alguma notícia, pelo amor de Deus! Ele o pai do bebê, precisa saber.

— Acho que agora isso não interessa mais... - ele responde e eu abro os olhos imediatamente.

Sentindo pela primeira vez desde que acordei, medo! Medo do que eles irão me dizer.

— Ana! - meus pais vêm rapidamente até mim.

— Chama o médico, ela parece zonza. - o meu pai pede, e meu corpo parece ter sido moído.

— Oi, minha princesa, como se sente? - ele parece aliviado em me ver acordada,
segura em minha mão e me dá um beijo na testa.

— Estou meio tonta.

— O médico falou que seria normal acordar com tontura, você bateu a cabeça. Graças a Deus a pancada não foi tão forte, apenas alguns ralados e um galo nessa cabecinha dura.

— Pai, como está o meu bebê? - e o seu silêncio me aflige e seu olhar desolado também me desespera.

Não! Não! Não! Qualquer coisa menos o meu bebê! Por favor, Deus! Imploro,
mas o semblante do meu pai não muda. Logo o médico chega ao lado da minha mãe

— Olá, Ana! Sou o doutor Lucas, lembra de mim ? Como se sente? - pergunta o médico, seu rosto preocupado.

Engulo em seco, minha garganta está seca pela ansiedade.

— O bebê... - As palavras escapam de meus lábios trêmulos. O médico faz uma pausa então olha para os meus pais, escolhendo as palavras com cuidado.

— Filha, nos sentimos muito... - minha mãe lamenta com a voz embargada e logo vejo lágrimas rolando do seu rosto.

— Por favor, mãe, por favor, não diga que eu o perdi.

— Eu sinto tanto, filha, tanto. Faria qualquer coisa para não ter que dizer isso, infelizmente você perdeu o bebê. - meu pai completa com a voz tomada de tristeza.

A culpa e a tristeza me envolvem como uma névoa densa. O mundo ao meu redor perde a nitidez, o brilho, e meu coração parece estar sendo esmagado por um punho invisível. Não posso evitar que as lágrimas rolem pelo meu rosto. A dor agora se expande para algo muitomais profundo, algo que jamais vou esquecer.

Ainda que a minha gravidez tenha sido um choque no começo, não vou ser hipócrita e dizer que foi uma maravilha receber a notícia que eu estava grávida, meu pai tinha uma certa razão, eu e o Richard só tinhamos 2 meses juntos, e por mais que eu o ame um filho agora mudaria tudo, e foi por isso que eu pedi pra ficar sozinha no final de semana, mesmo ele insisitndo pra cuidar de mim e ficar comigo, eu precisava daquele tempo pra aceitar e entender.

O sentimento de culpa toma conta de mim, talvez se eu tivesse desejado aquele bebê e o amado com tudo de mim, isso não teria acontecido.

Minha mãe afaga meus cabelos, enquanto me derramo em lágrimas, tentando curar minha alma que não tem cura.

O médico percebendo minha angústia, tenta explicar com a delicadeza que a situação exige.

— Ana, compreendo que seja difícil, mas foi uma fatalidade, não se cobre tanto. Seguindo as orientações que vai receber, nada te impedirá de engravidar novamente, no futuro, você é jovem, saudável e não foi culpa sua.

Volto a encarar meus pais, vendo a tristeza refletida em seus rostos. Incrível que em pouco tempo tudo mudou, vi meu mundo desabar bem à minha frente. Levando para longe o
momento de felicidade que era a ideia de construir uma família com ele. Tudo parece desmoronar ao meu redor.

— Eu... eu gostaria de ficar sozinha um pouco. - murmuro, tentando processar o turbilhão de emoções.

O médico assente compreensivo, deixando-me em meu espaço de luto, assim como meus pais.

— Estamos aqui, filha, você não está sozinha, meu amor. - minha mãe salienta.

O quarto de hospital se torna um mundo à parte, onde as lágrimas caem e a dor se entrelaça com a compreensão de uma realidade que eu nunca quis enfrentar nem nos meus piores pesadelos.

...

Fiquei mais dois dias no hospital em observação e fui liberada, recebendo uma enorme lista de recomendações,  que incluía até mesmo acompanhamento psicológico, eu realmente estava destruída, não sentia fome, não tinha vontade de sair, tudo que eu queria era ficar deitada dormindo e esse passou a ser meu refúgio, dormir o dia inteiro, assim eu não pensava nele, não pensava no nosso bebê, mas quando eu comece a sonhar com eles foi demais pra mim.

Eu me culpava pelo bebê e me odiava porque não conseguia esquecer o Richard. Em casa passaram a fazer uma espécie de revezamento para não me deixarem sozinha, Pedro, minha mãe, meu pai, Joana...

20 dias depois do ocorrido, e após algumas sessões de terapia, decidi que era hora de voltar pra realidade ainda que ela seja dolorosa.

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Postando bem cedinho e mais tarde tem mais

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Até o próximo 😘

R.R.MOnde histórias criam vida. Descubra agora