Caminhei até a boca com as palavras de Kyan pesando na minha cabeça. Ele sempre soube onde tocar, como acender um fogo dentro de mim, e eu odiava isso tanto quanto desejava.
Cada passo me fazia questionar se esse caminho tinha volta, se depois de tudo eu ainda seria a mesma, mas eu queria vingança.
Os olhares me seguiam enquanto eu subia o morro, mas não importava.
Cheguei perto da boca e lá estava ele, como sempre, encostado na moto, com aquele olhar intenso, desafiador. Um cigarro pendurado nos lábios, mas o foco dele era em mim.
Quando me aproximei o suficiente, ele apagou o cigarro, jogando a bituca no chão, e me encarou.
Seu olhar era uma mistura de cobrança e compreensão. Como se, de alguma forma, ele já soubesse que eu iria ceder ao caos mais uma vez.
Minha mente tentava manter o foco, repetindo que era só um último trabalho, um último acordo. Mas meu corpo traía cada uma dessas palavras quando estava perto dele.
Eu não podia negar o que sentia, a raiva, a dor, e o desejo. Eu era uma mistura perigosa disso tudo.
-me esperando?- me aproximo com um sorriso gentil
-sempre- ele diz sem nem dar uma risada. Me surpreendi por ele entrar na minha onda, ou ele foi sarcástico?
Sem eu dizer uma palavra, Kyan deu um leve aceno com a cabeça, me chamando para segui-lo. Entramos pela lateral da boca, passando pelos corredores estreitos e mal iluminados.
O cheiro de fumaça impregnava o ar, misturado ao som distante de música alta e risadas.
As paredes pichadas e os rostos marcados por uma vida de batalhas e segredos faziam parte do cenário. Eu já estava acostumada, mas, dessa vez, tudo parecia pesar mais.Ele fechou a porta atrás de nós e se encostou na parede, cruzando os braços.
- Então, o plano é esse - ele disse, me olhando diretamente nos olhos, sem rodeios. - Amanhã à noite, a gente faz o serviço. O restaurante estará cheio, e a gente vai queimar tudo até virar cinzas. Você fica responsável por fazer a distração enquanto eu e os caras preparamos o lugar. Quando a coisa pegar fogo, a gente sai rápido. Ninguém vai nem ver o que aconteceu até ser tarde demais.
-eu e os caras?- pergunto sem entender- não era só nós dois?
Ele sorrir irônico.
-eu não posso confiar em você estando nós dois lá. Eu não sei oque tu realmente quer, vai que você está contra mim...
-tá maluco kyan?- me aproximo dele séria- está querendo dizer que eu sou a mentirosa da história? Que eu quero te usar?- respiro fundo- não esquece que a usada aqui foi eu!
-eu não posso confiar em ninguém nathalia. - sua voz sai grave- eu estava me deixando a levar a cegueira por você. Mas hoje você me fez entender isso, eu nunca precisei implorar para que ninguém ficasse, e esse alguém não seria você- eu olho assustada.
Eu não esperava o kyan me falando isso, não o kyan que eu conhecia agora.
- coringa e Rodrigo vão ajudar no incêndio. Você vai fazer oque tem que ser feito, e logo que você fala a palavra chave.- ele faz um barulho com a boca- tudo pega fogo.
A frieza com que ele falava me atingiu. Não era só um plano. Era um massacre. Eu sabia o que estávamos prestes a fazer, e, mesmo assim, meu sangue fervia de antecipação.
- tudo bem!-respondi, firme, mantendo a fachada de controle. Mas, por dentro, eu me sentia à beira de um abismo, prestes a cair.- faça oque tem que ser feito. Já sabe o final da história, o nosso acordo acaba!
Ele se aproximou, devagar, me estudando com aquele olhar que eu já conhecia bem. Quando parou à minha frente, sua expressão mudou. Ele franziu o cenho, como se algo estivesse fora do lugar.
- Tu quer se distanciar? De mim? - ele perguntou, a voz baixa, quase descrente. - Acha que pode simplesmente desligar esse lado? Fingir que não sente o que sente? Nathalia, isso aqui -ele apontou para si mesmo e depois para mim - não se desliga. Não é assim que funciona.
Eu desviei o olhar, tentando evitar o peso das palavras dele. Ele tinha razão. O caos dentro de mim já estava enraizado. E, pior, ele fazia parte disso. Mas eu precisava me libertar, de algum jeito.
- Eu só quero paz, Kyan - sussurrei. - Só isso.
Ele soltou uma risada seca, sem humor.
- Paz?- ele rir irônico- tu nunca vai ter paz depois desse incêndio. Quando o fogo cerca todo o lugar, e sua ficha cair de quantas pessoas morreram e começarem investigar o caso, tu não vai ter paz! Sua mente vai te manipular para você se entregar, as coisas vão mudar Nathalia. Então não acha que depois você vai viver em paz, porque não vai.
Ele tinha razão...
Meus olhos desciam lágrimas sem eu perceber, eu apenas me aproximo dele e encosto minha cabeça no seu peito.
Ele não me abraçar, não me toca, mas também não se distancia.
-eu pretendo morrer depois do incêndio- confesso- minha vida não tem mas sentindo. Des de quando descobri a traição toda, tentei me manter forte todos esses anos, e isso foi um abalo comigo- respiro fundo- então, se distancie de mim, se você se apega a mim, eu não vou poder corresponder com sua intenção.
-Nathalia...- sua mão encostou nas minhas costas me fazendo olhar no seu rosto- nunca mas você fala isso!
Dou um risada fraca com as lágrimas ainda descendo, ele sempre falava essa frase quando não gostava de algo, kyan estava com os olhos vermelhos me olhando.
- vou aceita o pedido de casamento hoje!- digo saindo dos seus braços- amanhã as 19 horas, o show começa- digo e me viro para ir embora.
-Nathalia...- ele repetia a mania de sempre, fale meu nome como aviso.
Me viro para escutar oque ele tinha para falar, mas ele fica mudo, seus olhos tinham muitas coisas para me dizer. Mas ele se calou e eu, bom, eu fui embora.
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DOIS
FanfictionNathalia, com sua personalidade forte, tenta superar a morte de seu pai. Ela se aproxima de Felipe, mas, em uma reviravolta inesperada, acaba conhecendo a favela e se depara com seu pior pesadelo: o dono do morro. A partir desse momento, sua vida co...