Quando a noite se esvaiu deixando para trás as sombras da incerteza e o dia clareou no leste, foi como se uma nova era tivesse se levantado com o sol, uma nova era para Lucy. Ela mal havia conseguido dormir, a ansiedade percorria todo o seu corpo, a deixando inquieta. Suas pálpebras pesavam, mas sua mente recusava-se a descansar e a permitir que seus olhos fechassem para que ela pudesse cair no sono profundo.
Não havia tempo a perder. Todos os minutos eram cruciais e cada hora preciosa demais para ser descartada. Ela levantou-se com uma inquietação dentro dela, mas não uma inquietação ruim. Era uma sensação boa que fazia sua barriga estremecer e contrair-se. Frade Harmon não estava em casa, imaginou que ele talvez tivesse ido a feira, então ela decidiu ir para a igreja. dividiria seu tempo entre seu pai e sua amiga, sua mãe de coração, a freira tão alegre e querida.
Durante o percurso, Lucy podia ouvir os passos do soldado atrás dela. Logo não precisaria mais ouví-lo, ou temer a presença de Oliver ou de qualquer outra pessoa maldosa. Seria apenas ela e o homem que ela amava. Anthony a protegeria e a amaria como ela gostaria de ser amada e ela o amaria e protegeria de volta, na mesma intensidade, pois seu coração clamava por ele. Começou a observar as pessoas à sua volta com bastante atenção. Aquelas pessoas que ela conhecia e que a conheciam desde a infância, pessoas que nunca mais tornaria a ver. Crianças conhecidas e amáveis, cujas as quais nunca mais ouviria as risadas ou as veria crescerem. Senhoras tão gentis e calorosas, que nunca mais tornaria a ver os rostos alegres e despreocupados. Homens, mulheres, crianças e idosos, todos eles nunca mais a veriam em breve e se perguntariam o porquê. Por qual motivo nenhum deles a veriam novamente. Ela não sabia o que aconteceria após a sua partida, mas sentia um pesar em seu coração por deixar aquelas pessoas tão queridas, pessoas amáveis e bondosas com quem havia convivido a vida toda.
Entrando na igreja, ela cumprimentou alguns fieis que haviam acabado de sair da missa. Passou pela passagem do meio que dividia as duas fileiras de bancos de madeira, reverenciou a imagem de Jesus crucificado e adentrou no corredor no qual apenas os membros tinham acesso. O soldado, apesar de ter ordens explícitas de que não deveria tirar os olhos da moça, não pôde acompanhá-la, pois naquela ala não lhe era permitida a entrada. Lucy apressou o passo, seus cabelos voavam à medida que ela começava a correr nos corredores. Foi em direção ao jardim da Catedral, onde tinha certeza de que encontraria Dominic. Seus olhos inquietos a encontraram agachada, regando uma mudinha na terra recém mexida.
- Irmã. - Chamou a moça com uma certa ansiedade.
A freira levantou-se imediatamente e um sorriso agradável desenhou-se em seus lábios ao ver Lucy correndo para abraçá-la.
- Minha querida! - Ela exclamou abrindo os braços para receber o abraço de Lucy. - Oh minha filha.
Lucy abraçou a freira calorosamente, como alguém que está se despedindo de um ente muito querido.
- O que aconteceu? - A freira perguntou. - Não me abraça desta maneira desde que era uma menina.
- Querida irmã. - Lucy se afastou da freira, a olhando profundamente em seus olhos. - Preciso lhe falar sobre algo muito importante.
- O que a aborrece, meu amor? - Perguntou com desconfiança.
- Não posso dizer aqui. - Ela sussurrou. - Vamos ao seu aposento e lá lhe direi.
As duas foram juntas para o quarto da freira. Ao fechar a porta, Irmã Dominic pegou a mão de Lucy e a levou apressada para sentar-se na cama ao seu lado.
-Conte-me, minha menina. - A curiosidade estava a consumindo. - Diga para acalmar o coração desta pobre freira.
- Querida irmã, - A voz de Lucy parecia querer parecer mais forte do que soava. - Sabe o quanto a amo e o quanto lhe tenho carinho e afeição. A senhora é a mãe que eu nunca tive e eu sou eternamente grata por tudo o que me fez, mesmo não tendo obrigação de fazer isso.
- O que é isso, Lucy? - A freira perguntou preocupada. - Porque está falando desta maneira? Como se fosse morrer.
- É como se eu fosse... - Sua voz falhou.
- Em nome de Deus, não fale dessa maneira.
- Eu vou desaparecer, irmã. - Ela contou. - Como se nunca tivesse existido. Uma sombra do que já fui e a incerteza do que seria.
- Do quê está falando, Lucy?
- Eu vou fugir, querida irmã. - Lucy disse diretamente.
- Como assim? Fugir para onde?
- Para a liberdade.
- Estou confusa, querida. Está falando de seu casamento?
- Não! - Exclamou. - Meu casamento será um erro que não posso cometer. Será o mesmo que assinar minha sentença de morte. Me entregando ao mais vil das criaturas que já pisaram na terra.
- Mas aquele rapaz é bom, Lucy. - A freira parecia cada vez mais confusa.
- Não, ele não é. Ele é um homem maquiavélico, cujo único objetivo é sugar toda a felicidade que encontra pela frente.
- Pelos céus, Lucy. Porque está dizendo isso?
- Porque ele marcou a minha carne com seu ódio e abalou meu espírito com sua fúria.
A freira franziu o cenho por um instante, ainda tentando digerir o que havia acabado de escutar. Lucy levantou a manga de seu vestido e, em silêncio, mostrou a ela os hematomas em seu braço.
-Senhor Jesus! - Ela arregalou os olhos enquanto tocava nos braços de Lucy para ver melhor. - Ele fez isso com você?
- Não só estes, mas outros em minhas costas e minha barriga. - Ela disse firmemente. - Ele me marcou para sempre, para me mostrar que se me casar com ele, sempre estarei sob seu controle.
- Jesus. Eu nunca imaginei.
- E é por isso que vou fugir. Para me livrar da sombra odiosa desse homem ruim.
- E com quem vai? Para onde vai?
- Eu ainda não sei para onde vou. Talvez para algum lugar onde possa ver o mar, onde haja sol abundante e um cheiro agradável. - Lucy suspirou antes de continuar. - E meu acompanhante é um homem bom, mesmo que a humanidade diga o contrário. O homem que amo e que me ama. A alma mais gentil e calorosa que já conheci em toda a minha vida.
- Não está falando daquele rapaz vampiro, não é?
- Sim, estou falando dele.
- Perdeu o juízo? - A freira se levantou num pulo. - Vai sair de sua casa, de seu seio familiar para se aventurar em um futuro incerto ao lado de um vampiro?
- Querida irmã, sei que parece loucura, mas acredite em mim, não há outra saída. Se me casar com Oliver, vou morrer. Ao lado de Anthony terei uma vida feliz e repleta de amor.
- Deve haver outra maneira.
- Não há. Oliver não permitirá nenhuma intervenção externa, seja sua ou de qualquer outra pessoa.
- Conte ao seu pai. - Disse a freira. - Ele acreditará ao ver esse hematomas.
- Se eu contar ao meu pai, ele enlouquecerá. A família Dauphin é influente e pode prejudicá-lo e a igreja toda.
- Querida, sei que é terrível e desesperador, mas fugir com um vampiro lhe levará a condenação eterna.
- Isso não me importa. - Lucy estava séria. - Mesmo que houvessem mil homens corteses, eu não o trocaria por nenhum deles. Mesmo se houvessem mil homens santos, eu jamais o trocaria por nenhum deles. Meu coração pertence a apenas um homem e estou convicta de minha decisão. Eu o amarei mesmo que todos se voltem contra mim, mesmo se os céus se levantarem contra mim. Meu coração pertence e sempre pertencerá à ele.
- Você realmente o ama, não é mesmo?
- Amo e ele me ama. - Lucy levantou-se e pegou as mãos da freira com carinho. - Isso também me assusta, tanto quanto lhe assusta, mas eu preciso tentar ser feliz.
Dominic olhou para suas mãos dadas com as de Lucy e as apertou afetivamente. Lágrimas vieram aos seus olhos e um certo brilho.
-Então, acho que o que me resta, é desejar-lhe toda a felicidade do mundo e que Deus os abençoe.
Lucy abraçou Dominic. As duas choravam incessantemente, envolvidas nos braços uma da outra. Um abraço terno e demorado.
-Sentirei falta da minha menina. - Sussurrou Dominic.
- Eu sentirei falta da minha mãe. - Disse num soluçar.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Sangue Profano (FINALIZADO)
Romance*Plágio é CRIME previsto no artigo 184 do Código Penal 3 que possui punição que vai desde o pagamento de multa até a reclusão de quatro anos, dependendo da extensão e da forma como o direito do autor foi violado.* Capa por @xxxpersephone ♡ Sinopse:...