IX

105 16 2
                                    

Entrei no quarto e fechei a porta. Fui para sentar na cama, mas reparei que estava coberta por uma poeira e resolvi não sujar ali. Olhei em volta, analisando o quarto. Era cinza, tinha uma janela apenas, mas me interessou.
-Duas saídas. -afirmei olhando da porta a janela.

Tinha uma cama junto à parede, um guarda-roupa pequeno e uma mesa perto da janela. O quarto não chegava a ser luxuoso, mas acomodava bem ia passar um tempo ali. Caminhei até a janela e a abri. A vista era dos fundos da casa. Olhei para cima, vendo qual poderia ser uma possível rota, caso precisasse sair.Para a minha sorte, o telhado não ficava tão distante da janela. Sentei-me à mesa e peguei um papel.
-Tenho que anotar o que acontece, se não vou esquecer. - expliquei para mim mesma.

Mas ao colocar o lápis no papel, nada saiu. Eu tentei me concentrar, mas não lembrava a ordem dos acontecimentos. Rabisquei algumas folhas inutilmente. Olhei para o papel em branco e cruzei os braços, fazendo cara feia para a folha.

Meu celular tocou e corri para atendê-lo.
-Está indo bem.- falou ele.
-Claro. Uma maravilha. Melhor que eu, impossível. - deixei transparecer minha raiva e toneladas de sarcasmo.
- O que está lhe deixando tão zangada? - perguntou ele.
- Do começo? Que tal a parte que me tiraram da minha vida e me jogaram dentro de um livro? - perguntei num tom mais baixo.
- Me...desculpe. - disse ele. Senti uma dor na sua voz, mas isso não diminuiu a minha raiva.
-Quer saber, não mesmo. Não desculpo. - afirmei, bufando.
-Alexa. - disse ele triste. Era completamente estranho seu comportamento.
-Faça- me favor, viu. Você diz que me conhece, então deve saber que já tenho problemas suficientes. Não precisava... disso. - conclui.
-Eu sei, mas é o único jeito para que possa entender. - exclamou ele.
-O que? O que é tão importante assim? - perguntei, colocando a mão na testa.
-Não posso falar. Não agora. Por favor, entenda. - pediu-me ele.
-É muito difícil quando não se sabe nada. O que tenho são lacunas em branco. - expliquei. E meu cérebro está seguindo o mesmo padrão.

Escutei sua respiração no meu ouvido e percebi que não conseguiria nada assim. De repente uma idéia veio na minha cabeça.
-Será que pode mandar o livro aqui? - perguntei.
-Como assim? - questionou ele.
- O exemplar. Em folhas. Será que pode me mandar ele?- pedi.
-Seria muito arriscado e a partir da hora que falou com Mason, a história mudou também. Tudo que está no livro não vale mais. Não vai acontecer mais daquele jeito. - explicou ele.
-Mesmo assim. Eu estou precisando dele. Tem informações ainda. Vou tomar cuidado para que ninguém o pegue. - falei.

Ele respirou fundo e disse, por fim:
-Tudo bem, mas me prometa que não deixará ninguém o ver e nem saber de onde você veio. -disse ele.
-Ok.Eu prometo e obrigado. - agradeci.
-De nada.- disse ele. Senti que ele ia falar mais alguma coisa, mas ele não falou.

Ficamos um tempo em silêncio. Ao certo, não sei o motivo. Esperei que ele desligasse, mas não desligou e eu, sem coragem, também não desliguei. Escutei sua respiração do outro lado, pesada e lenta que era a contrária que a minha, rápida e leve. Por fim, a ligação se encerrou e coloquei o celular em cima da cama. Sentei na cadeira e o fitei. Tudo era muito estranho. O jeito que falava, seu comportamento, tudo até meu comportamento quando falava com ele. No fundo sentia que o que ele falava era verdade; que de alguma maneira o conhecia como ele me conhecia.

Sai do quarto e fui ao banheiro tirar um pouco da sujeira. Após uma boa limpeza, me senti mais humana. Sai do banheiro e fui para o quarto, bocejando. Acho que essas viagens inter-literárias (nome que dei a minha ida para o livro) me deixa cansada. Abri a porta e em cima da cama, um livro azul me esperava.Tranquei a porta para não correr o risco de ser pega de surpresa. Sentei-me na cama e abri o livro. Dentro havia um bilhete:

"Querida Alexa,

Tome cuidado. Não estou me referindo somente ao livro, mas também a você."

- Vou tentar. - falei, tirando o bilhete do livro e o abri.

Comecei a ler. Li metade do exemplar quando escutei batidas em minha porta. Guardei o livro na minha mochila e abri a porta. Mason estava parado com os braços para trás.
-Te acordei? - perguntou ele.
-Não, só estava deitada. - afirmei.
-Que bom. Venha! Quero que conheça a minha irmã. - chamou ele.

Descemos a escada e esperei. Mason parou frente a frente a mim e um pequeno rosto saiu atrás dele.
-Vamos, Julie. Essa é aquela amiga que te falei. Ela vai passar um tempo com a gente. - disse Mason num tão gentil e doce com a menina.

Ela saiu devagar atrás e estendeu a mão para mim. Ela era pequena, tinha olhos verdes como os de Mason, só que maiores e mais fofos. Tinha longos cabelos marrons e era morena. Peguei em sua mão e sorri.
-Eu sou a Julie. - falou ela.
-Olá, Julie. Eu me chamou Alexa, mas se quiser pode me chamar de Alex.- disse eu.

Ela se aproximou mais e eu me abaixei para ficar na sua altura.Julie sorriu e passou a mão no meu rosto.
-Você é bonita. - ela exclamou.
-Obri-brigado. Você é uma fofura. Qual é a sua idade? - perguntei.
-Tenho cinco. Logo, vou fazer seis.- disse ela, indicando o número com as mãos.
- E já é tão esperta assim? - questionei ela. Olhei para cima e vi que Mason nos olhava, maravilhado com a cena.
-Sou sim. Você quer ver meu quarto? Tenho muitas bonecas. - ela me convidou, segurando em minha mão.
-Julie, não... - Mason começou a falar.
-Eu adoraria. - falei o interrompendo.

Ele arqueou a sobrancelha, me questionando silenciosamente.
-Deixa ela. - afirmei antes de ser puxada pela criança.

Subimos até o seu quarto, que tinha a porta decorada com borboletas. Ela me fez entrar e começou a falar os nomes das bonecas. Era tantos que acabei não decorei nenhum. Ela me corrigia quando chamava a Lili de Ana e a Bia de Zoe.Confesso que até para brincar de boneca, eu era atrapalhada. Derrubei meu chá e sem querer trombei no ursinho Charles, que caiu da cadeira. A cada trapalhada minha, era uma risada dela.

Quando demos conta das horas, Mason vinha nos chamar para o jantar.Ao passar por ele, comentou:
-Você é uma péssima criança. - disse ele rindo.
-Devo ser melhor que você. - conclui.
-Eu nunca derrubei o ursinho Charles. - contou ele.
- Foi um acidente.Ele é um ursinho meio gordo e eu sou atrapalhada.Combinação terrível. - expliquei-me.
-A culpa é do urso? Ok. Vou fingir que acredito. - e desceu.

E por um instante, me peguei sorrindo. Para um primeiro dia, não tinha sido um desastre. Eu até que tinha gostado.

Após jantarmos, Julie foi para a sala assistir e eu fiquei para ajudar Mason a tirar os pratos da mesa. Enquanto ele ia arrumando as panelas, eu fui lavando a louça.Vi quando ele pegou um pano e se juntou a mim na pia, secando a louça limpa.
-Eu nunca tinha visto ela ser tão comunicativa com uma pessoa totalmente estranha. - disse ele.
-Ela é um amor de pessoa. - consegui dizer.
-É. Ela é a única que tenho. Minha única família. - exclamou ele.
-Eu sei como é. - falei me lembrando da minha tia e primo.
-Farei tudo por ela. - disse ele. Senti a preocupação em sua voz.
-Não se preocupe.Vou te ajudar a mantê-la segura. Dou a minha palavra.- achei que tinha sido a coisa certa a fazer.
-Obrigado. - agradeceu ele.

O resto da noite passou rápido. Julie acabou dormindo no sofá e confesso que até tirei um cochilo. Acordei com Mason balançando meu ombro. Despedi-me, dando-lhe um boa noite e subi para o quarto. Vi ele atrás, carregando Julie que roncava baixinho. Entrei no quarto e desabei na cama. O sono veio de trem bala e me atingiu em cheio.

The Cursed Book {Em Revisão}Onde histórias criam vida. Descubra agora