É Vida que Segue

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O ano de 1990 começou com o silêncio devastador dentro da casa. Não havia forças em ninguém para tentar vencê-lo, nem mesmo Felipe que era o mais falante conseguia. Entravam e saiam sem que houvesse grandes diálogos. Não havia muito assunto que não os levasse a falar de Seu Rodolfo. Então evitavam conversar como se aquilo lhes fosse uma espécie de anestésico.

E quando Felipe chegou em casa um dia anunciando que havia sido chamado para uma entrevista de trabalho em uma empresa multinacional, houve em todos um certo alívio. Daniel pensou que, enfim, poderiam falar de outra coisa sem ser a morte do pai. Mas quando na manhã seguinte seu irmão se arrumou todo, e tomou nas mãos uma pasta idêntica à que seu pai usava para sair, foi o suficiente para trazer à tona a rotina de Seu Rodolfo à memória de todos. Porque se ele era muito parecido com o pai no comportamento, Felipe era idêntico na fisionomia.

D. Joana se levantou, ajeitou a gola da camisa de Felipe e com os olhos cheios de lágrima disse:

"Como está parecendo ele, meu filho!"

Felipe sorriu, beijou a testa da mãe e saiu.

Alguns minutos depois Milena entrava em casa para ver Daniel.

Era incrível a coincidência. Enquanto namoravam Daniel e Milena jamais se encontraram com Felipe. Antes deste dia, sempre que Milena ia à casa do namorado Felipe não estava, e se marcavam para que os dois se conhecessem alguma coisa acontecia que cominava no desencontro.

Felipe havia sido contratado pela empresa que o entrevistara aquela manhã e suas aparições em casa eram mais raras a cada dia, e assim mais difícil se tornava o apresentar à Milena.

"Poxa, não sei o que acontece! Parece que você nunca vai conhecer o meu irmão, Milena. Faz um ano que namoramos e nunca deu certo vê-lo"

"Uma hora a gente se esbarra..." Ela dizia graciosamente.

À época não havia quase nenhuma fotografia espalhada pela casa, para que, ao menos, Daniel pudesse mostrá-lo a ela.

Assim ficou sem que os dois se conhecessem aquele ano.

Felipe tornou-se tão envolvido à sua atividade profissional quanto o pai era. Sentia que era uma forma de disfarçar a dor que sentia pela morte de Seu Rodolfo e ao mesmo tempo honrá-lo.

Era bem sucedido. Conseguiu aquele mesmo ano, uma promoção que dobrou o seu salário, e também a sua jornada, mas estava muito feliz com tudo.

Naquele ano Daniel também passou a trabalhar. Não tinha até então, necessidade, pois o pai sempre havia provido tudo para a família e fazia questão que os filhos se dedicassem exclusivamente aos estudos.

Terminado o Colegial, Daniel conseguiu emprego numa pequena transportadora de encomendas da cidade. Era responsável por conferir a entrada e a saída das mercadorias que chegavam ao depósito e também por emitir as notas fiscais para o transporte. Basicamente este era o seu serviço. Que ainda incluía ir vez ou outra ao banco e ajudar a carregar os dois caminhões que a empresa possuía.

Apesar do baixo salário, gostava do ambiente e das pessoas ali.

Avida ia seguindo seu curso normalmente até chegar a outubro daquele ano. Danielsentia estar a bordo de um carrinho de montanha-russa. Em menos de um ano tantacoisa havia acontecido. Conheceu Milena, perdeu o pai, começou a trabalhar... Eagora o carrinho subia lentamente os trilhos como que anunciando o próximosobressalto.      


Um Amor ImpossívelOnde histórias criam vida. Descubra agora