Um Terreno já Oculpado

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Quando Dona Clotilde e a filha chegaram à casa de Dona Joana ainda Daniel não havia chegado do trabalho. Deu tempo para que sua mãe fizesse por ele uma campanha eleitoral a fim de ver se conseguia o voto de Paloma.

"Ah Daniel é um tesouro em minha vida, viu Clotilde? Moço trabalhador, educado, gentil..." E foi tecendo sua seda extensamente para ir rasgando aos ouvidos da moça que parecia entediada da conversa.

Dona Joana, então, olhou pela janela e viu o filho chegando.

Quando passou pela porta, e antes mesmo que pudesse cumprimentar a todas, Dona Joana pôs a mão em seu ombro feito alguém que vai apresentar um produto ao comprador e logo o apresentou:

"Gente, este aqui é o Daniel, o meu caçula." Só se referia a ele como caçula quando queria exprimir ainda mais doçura à figura do filho.

Daniel, que não sabia da presença das visitas, havia tirado a camisa à porta de casa e agora estava desconsertado. Paloma achou toda a beleza e ainda mais que a descrita pela mãe de Daniel. Não soube como disfarçar o encanto. Constrangido e sem saber o motivo das visitas, Daniel pediu licença para ir ao banho, estava suado por causa do trabalho.

Não seria a única vez em que ele se sentiria envergonhado na presença daquelas mulheres.

Enquanto Daniel se retirou, Paloma rapidamente transformara-se da moça desinteressada e enfadonha para uma investigadora contumaz. Perguntou a idade do rapaz, se tinha namorada, se gostava de sair... A mãe foi respondendo ao questionário com superlativos: "Solteiríssimo, divertidíssimo..." Exagerava em tudo.

Daniel terminou o banho sem saber o que faria. Desejava mesmo permanecer no quarto e não ter que fazer sala às visitas que não eram para si, senão para a mãe. Mas se lembrou da história do terreno e não poderia deixar que a mãe fizesse mau negócio.

Vestiu-se rapidamente, com short e camiseta, e foi à sala.

"Então mãe são elas que querem comprar o terreno?"

"Que terreno, menino?" A mãe distraída com a apresentação do filho esqueceu-se do plano por um segundo, deixando a outra mãe presente sem saber o que dizer.

"Ah é, o terreno!" Lembrou-se rapidamente levando a mão ao rosto num gesto de quem havia se esquecido.

"Então, filho, eu conversei aqui com a Dona Clotilde e ela desistiu da compra, sabe?..."

"Desistiu?" Paloma não entendeu nada.

"É, filha, pensei melhor e acho que não está na hora de comprar não."

"Além do mais, Daniel, quem sabe você não encontra uma moça bonita e decida se casar, né? Aí já temos o terreno para construir o ninho de amor dos pombinhos..." Dona Joana, enquanto começava esta frase, mudou rapidamente de lugar no sofá para se sentar ao lado de Paloma, e terminou tomando as mãos da moça nas suas.

Daniel meneou a cabeça apenas com um sorriso amarelo.

Paloma não tinha vergonha alguma. Levantou-se a fim de mostrar as pernas seminuas e caminhou até Daniel que estava na porta da cozinha.

"Sua mãe disse que você estudou no Colégio dom Pedro... Eu também estudei lá... Mas não me lembro de você."

"Eu não era muito popular..." Outro sorriso amarelo.

"Ah, mas eu deveria me lembrar, um moço tão bonito..." E deu uma encarada em Daniel de cima até embaixo.

Outro sorriso amarelo.

Daniel nunca fora muito extrovertido, mas nessas situações parecia um caracol que ao primeiro sinal de perigo enrolava-se todo em sua carapaça.

Alheia a vergonha dele, Paloma continuou a falar sem parar de como o achava bonito e de lugares que eles podiam ir juntos para se conhecer melhor, enquanto ele ia se encolhendo ainda mais dentro de sua concha.

Ao canto da sala as duas mães se uniam na torcida de que os dois se entendessem. Visualmente, faziam um bonito par. E era perceptível o interesse de Paloma.

Depois de alguns minutos de intenso ataque, Paloma, deu trégua a Daniel, que se sentou no sofá ao lado da mãe, exaurido com as perguntas da moça sobre namoro e gentes conhecidas em comum do tempo do colégio, que Daniel não conseguia responder com mais de três palavras porque ela não parava de falar, nem para ouvir as respostas.

Pouco tempo depois as duas se despediam para irem embora. Na saída, Paloma ainda tentou:

"Vamos sair para tomar um sorvete qualquer dia, Daniel?"

"Claro, claro! Vamos marcar sim."

Quando as duas se foram Daniel tinha vontade de esganar a mãe, que sentada no sofá sorria como se sua missão tivesse sido cumprida.

"E aí filhão?"

"E aí o quê, mãe?"

"Eu vi o jeito que vocês conversaram. Acho que vai dar namoro, hein?

"Ah, mãe, esquece isso! Eu ainda gosto da Milena. Não tenho disposição nenhuma pra namorar ninguém agora..."

"Meu filho, se é por causa daquela sua namoradinha, esqueça. Desde que ela se foi que você anda desenxabido pelos cantos. Erga a cabeça filho! Ela sequer te enviou uma única carta! Bola pra frente, poxa! A filha da D.Clotilde é uma moça tão bonita!"

"Ah para, mãe!" E foi se retirando a caminho de seu quarto balançando a cabeça.

Daniel parou para pensar, e concordou: "nenhuma carta...". Milena o havia abandonado definitivamente. Não que não tenha passado esta ideia por sua cabeça ainda, mas quando D. Joana falava era quase sempre o acendedor do estopim de seu coração.   



Um Amor ImpossívelOnde histórias criam vida. Descubra agora