Depois disso, sem que Daniel pudesse crer, aceitava trocar juras de amor com Milena enquanto a saúde de sua mãe ia se agravando. Assistia aos preparativos para a mudança dela e deixava a dor a cada dia se tornar mais intensa, como se houvesse uma sentença de morte que em pouco tempo se cumpriria. A morte daquele amor.
Até o dia que enfim ela se foi. Daniel não tinha coragem sequer de ir até a rodoviária. Despediu-se dela na noite anterior.
Próximo à casa de Milena havia uma pequena lanchonete onde se encontraram algumas vezes. Ele sempre gostou daquele lugar. O preço era bom, o lanche era bom e sempre era sossegado para se conversar. Sentaram à mesa de sempre. Ela estava radiante, e vestia um vestido amarelo e um arco no cabelo combinando. Desfrutava a sua companhia e sua beleza como o condenado que faz a última refeição. Tinha por certo que nunca mais a veria. Mas relutou para dizer isso, porque ela não parava de repetir que em breve voltaria e que o mataria se ele namorasse a outra moça.
"Minha casa está uma bagunça, Daniel!" disse ela,
"Pior, vai ficar a minha vida quando você se for..." Parecia um cão sem dono. Os olhos lutando para permanecerem secos.
Ela passou a mão em seu rosto com carinho.
Ficaram boa parte do tempo em silêncio. Olhando um para o outro sem muito a dizer. Aproveitavam apenas para se beijar e abraçar enquanto o lanche não ficava pronto. Em verdade nem queriam comer nada aquela noite.
"Eu escrevi uma carta pra você" Enfim Daniel teve a coragem de contar.
"Ué, cadê? Me dá, logo!"
"Não, te darei quando nos despedirmos."
Ela soube esperar, apesar da visível curiosidade.
"Ah, como é triste isso, viu! Eu queria que nunca fosse preciso me despedir de você. A vida é tão cheia de ciladas, né?"
"A minha mãe vai sarar e nós vamos ficar juntos logo, Daniel."
Havia tantos sentimentos confusos, tantas idéias e desejos conflituosos que acabou por esquecer de lhe entregar a carta que trazia consigo ao bolso da calça. Ao fim daquela noite tão melancólica jurou ir à manhã seguinte com ela à rodoviária para que aquilo não fosse a despedida derradeira. O que suavizou o desespero ao se despedirem antes que ela tomasse o ônibus na volta para casa.
A lanchonete não ficava muito longe de sua casa. Então, tomou a carta nas mãos meio frustrado de não tê-la entregado a ela, e como fosse andando tratou de reler na busca de imaginar o que sentiria Milena se a tivesse recebido. Primeiro achou demasiado meloso o conteúdo. Não pareciam palavras suas aquelas. Linhas rebuscadas de "saudade", "amor" e "sorte".
"Nunca mais a verei. Nunca mais" Vinha repetindo os pensamentos pela rua. Guardou a carta no bolso.
Ao chegar em casa achou o Felipe deitado sobre o sofá e Dona Joana enfiada na cozinha. Entrou calado e se assentou no outro sofá.
"Que foi?", Felipe quis saber.
Não havia contado ainda para ele acerca da doença da mãe de Milena e de sua mudança para São Paulo. Então brevemente narrou toda a história de sua tragédia pessoal ao irmão.
"Ih maninho, fica tranquilo que daqui a pouco você se apaixona outra vez..." Sem muito jeito Felipe tentava lhe consolar.
Dona Joana que ouvia a toda conversa juntou as duas mãos como se fosse orar ali mesmo e naquela hora em favor de Dona Otília. Ao se aproximar dos filhos parecia incrédula. Mas não disse nada além de um "oh meu filho!". Passou a mão à cabeça de Daniel e o encarou com toda ternura.
Daniel não conseguiu dormir aquela noite. Deitado sobre a cama só pensava como pôde a vida ser tão cheia de complicações para ele. Sentia como se as paredes o fossem esmagar a qualquer momento, oprimido que estava por tudo aquilo.
Ia remontando os dias em que passou em companhia de Milena, do princípio do namoro até aquele dia. E como havia experimentado ser feliz por um pouco e se sentir bem afortunado. Quando enfim deu uma olhada no rádio-relógio ao lado da cama era quase cinco horas.
Nem é preciso dizer que trabalhou aquele dia feito um zumbi se arrastando. Vez ou outra quando pensava em tudo lembrava a voz de sua mãe dizer:
"Deus faz tudo certo"
E continuava.
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Um Amor Impossível
RomanceA vida às vezes reserva amores impossíveis aos corações dos homens. Daniel foi vítima de uma dessas ciladas. Ainda jovem apaixonou-se por Milena para logo a perder. Um amor que o tempo não apagou e ainda se encarregou de escrever novos capítulos ano...