Um Amor Que Não Valeu

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Quando um amor acaba é como se o próprio sol deixasse de existir. Tudo perde o sentido e a beleza. Aquele dia, Felipe não perdeu apenas o desejado filho que não vingou, perdeu o chão e o céu também. Voltou para casa com Milena como se fossem estranhos. Nos dias seguintes, Felipe sentiu que sua esposa não sofria tanto quanto ele a morte de seu futuro bebê. Isso o mortificava.

Não apenas por causa disso, não conseguia mais dormir no mesmo quarto que a mulher. Havia um copo cheio de ressentimento e indiferença que estava prestes a transbordar, e faltava apenas uma gota, que Milena despejou repentinamente depois de uma noite em que Felipe se arrumava para se deitar no sofá outra vez. Ela se aproximou dele lentamente como se sentisse medo e sentou-se a seu lado.

Primeiro permaneceu calada, tal como Felipe. Ele, porque pensava já ter usado todas as palavras na tentativa de reanimar a esposa para o amor e a vida ao seu lado.

Por fim ela estendeu a mão e passou no cabelo de Felipe.

"O que aconteceu com a gente, hein?"

"Não sei..."

"Eu preciso te pedir perdão..."

"Pelo quê?"

"Por não ter me esforçado mais. Hoje eu penso que ter me casado com você foi uma benção na minha vida, mas com o tempo eu acabei me esquecendo disto..."

"É que você jamais me amou, Milena. Mas isso não é culpa sua. Eu percebi isso cedo, e acreditei que com o tempo tudo fosse mudar. Quando vi que isso não aconteceria, insisti mesmo assim, neste amor impossível. Eu sei que você ama outra pessoa, que está refém deste amor, e que por isso nunca será capaz de amar outro homem. Aliás, além desta certeza, só a certeza de que sofremos demais. Inutilmente causamos dor ao retardarmos um fim que é inevitável. Você merece ser feliz Milena! Você é uma ótima pessoa. E eu também mereço ser feliz. Mas juntos não conseguiremos alcançar isso. É melhor que nos separemos enquanto ainda há tempo para seguir, cada um, o seu caminho.

Nunca pensei que fosse um dia me separar de você. Casei, por acreditar que o casamento seria para sempre, mas hoje entendo que se o prolongarmos apenas nos machucaremos mais." Terminou de dizer estas coisas e deu um profundo suspiro.

Milena chorava ao ponto de soluçar. Reconhecia nas palavras de Felipe a determinação para se separar, e desejou sinceramente mais tempo para transformar seu casamento e seu coração. Via, decerto, a infelicidade a que se submetiam, mas pensava que duas pessoas tão boas merecessem ainda mais uma chance.

Felipe negou maior tempo para aquele casamento que estava fadado ao sofrimento e cada vez mais ao distanciamento entre ambos.

Ele se levantou e depois tornou a abaixar, ajoelhando-se aos pés de Milena.

"Milena, eu preciso te confessar uma coisa, antes que eu vá."

Ela tentou se recompor das lágrimas e prestou atenção ao que ele dizia.

"Eu sei quem é a pessoa que você ama." Disse ele, quase a separar cada sílaba.

Milena sentiu que um nó se fez em sua garganta. Um aperto em seu peito quase fez o coração parar.

"Não direi nada. Não quero constrange-los ou impedi-los. Pelo contrário, fico extremamente feliz em saber que é por alguém que amo que estou a perdê-la e assim ganho a certeza de que você será feliz."

"Felipe..."

"Não, não diga nada, Milena, por favor! Eu descobri naquele dia do casamento do professor Ari. Você febril passou a fazer confissões, e acabou chamando insistentemente por meu irmão. Aí foi só juntar as peças do quebra-cabeça.

Sabe, eu o amo, tanto quanto você. E por mais que esteja a doer, tenho a certeza de que não houve nenhuma infidelidade ou maldade em vocês. Se guardaram segredo até agora, foi para me resguardar da dor. Sei que não me trairia jamais. Nem você nem ele. E que decidiram sofrer ficarem separados a me fazerem sofrer.

Escute. Eu quero que você o faça feliz Milena, de verdade. E quero que todos os dias você se lembre que nesta história não houve culpados ou inocentes, certos ou errados. O amor, às vezes, nos põe em labirintos... e agora podemos encontrar a saída..."

Milena passou a contar lenta e pormenorizadamente então toda a história. Tudo o que havia se passado. De como não sabia que eram irmãos, e que não pensava encontrar novamente Daniel e que por causa do casamento ficaria para sempre sem assumir este amor por ele, porque era impossível.

Aquela noite dormiram os dois no sofá, como irmãos abraçados. Não sentiam nada além de um amor puro e fraterno. O ressentimento deu lugar ao alívio. E a confissão tirou deles toda a mágoa. Estavam livres, à porta do labirinto e podiam voar.


Um Amor ImpossívelOnde histórias criam vida. Descubra agora