Capítulo 61

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Entrei no estúdio 5, arrastando as minhas botas de aquecimento pelo chão de linóneo preto, enquanto fazia os meus dedos das mãos deslizarem pelo telemóvel na tentativa de escrever uma mensagem para o meu namorado que tivesse pés e cabeça. Com todos os nossos compromissos, como a companhia e a banda, nem sempre conseguíamos estar juntos, por isso, como um casal de adolescentes, apagávamos aquelas chamas da paixão com algumas chamadas telefônicas ou mensagens. Eu adorava falar com ele, sentia que podia ser eu mesma, falando tudo o que pensava ou sentia. Adorava ainda mais quando lhe manda alguma mensagem e, na sua seguinte, ele me admitia que ficara sem resposta porque a felicidade tinha ocupado todo o seu cérebro. Mesmo falando de coisas banais, era ótimo saber que, do outro lado da linha, tinha uma pessoa que iria ouvir tudo o que me tinha acontecido durante o dia e iria fazer tudo o que estivesse ao seu alcance para me fazer adormecer com um sorriso nos lábios. O pior é que, com ele, perco totalmente a noção do tempo, o que fez com que, na noite anterior, os meus dedos só parassem de teclar às 5 horas da manhã. Eu e o Harry já tínhamos estado acordados até tarde algumas vezes, mas apenas durante as minhas férias. Nessa altura, não havia problema em ver as estrelas de madrugada, pois no dia seguinte iria puder dormir até às horas que me apetecesse. Naquele caso, foi mesmo descuido e a culpa é ele, ninguém o mandou ser tão bom namorado.

- Espero que não estejas a sentir tanto sono quanto eu. -li a sua mensagem no intervalo entre a aula de aquecimento e o ensaio do pas de deux.

- Acredita que estou. Quase adormecia no exercício dos rond de jambe. -eu respondi e depois sentei-me no chão, encostada à parede preparando os meus pés para entrarem dentro das pontas que eles tanto amam.

Mesmo depois de um café ao pequeno-almoço e uma barra energética, eu sentia-me mole e sonolenta. A minha única vontade era dormir, nem que fosse só dez minutos.

- Meu Deus, Emma! Tu ainda vais adormecer aí sentada. -o Tom riu enquanto vestia umas calças de fato de treino para manter o corpo quente- Ontem, a noite com o Harry, deve ter sido mesmo cansativa... -ele riu maliciosamente.

- Tom... -eu repreendi-o, mas confesso que me ri com o comentário, por isso perdi a postura de autoridade.

- Ok, já vi que não andaste no bem bom com o teu menino, mas então, conta lá o que aconteceu. -ele sentou-se à minha beira aquecendo os dedos dos pés.

- Os rapazes foram lá a casa e mesmo depois de eles irem embora, eu e o Harry continuamos a falar por mensagens. Quando demos conta já eram quase 5 da manhã.

- Vocês só podem ser loucos! -o Tom abanou negativamente a cabeça, como desapontado comigo, mas apenas na brincadeira.

Nós não somos loucos, apenas estamos apaixonados e eu não me arrependo disso. Só me arrependo de termos ficado a falar até às tantas como adolescentes rebeldes que põe o telemóvel no meio dos lençóis por causa da luz do ecrã.
Os meus pés já estavam enclausurados dentro das pontas, quando o George chegou ao estúdio com uma câmara no ombro. Ele estava mesmo convencido que com todos os vídeos que estava planeado colocar no YouTube oficial da Royal Opera House, conseguiríamos encher a sala de espectáculos durante vários dias. Ele estava com receio que dois novos bailarinos como nós, não chamassem tanto atenção como a legendária Kim. Eu, pessoalmente, achava o contrário, mas como não sou eu quem manda, nada muda e eu estava a ser filmada naquele preciso momento.

- Bom dia. -ele saudou-nós e nós respondemos educadamente.- Vamos começar pelo primeiro pas de deux, depois do solo da Kitri.

Dito aquilo, ele começou a dar indicações sobre como seria a nossa primeira interação em palco. Esta primeira parte, eu já tinha aprendido com o Robert, o que me permitiu estar mais relaxada e concentrar-me em ásperos mais importantes como a expressão facial. O Tom tinha de andar com um ar de engatatão mas ao mesmo tempo cavalheiro. Já eu tinha de me fazer difícil, mas ao mesmo tempo implorava pela sua atenção. Seriam 3 horas de um intenso jogo de sedução, como o George disse.

I hate myself because I love youOnde histórias criam vida. Descubra agora