#30

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Entrar pelos portões do prédio que tinha me abrigado nas duas últimas semanas nunca me pareceu tão confortável. Matt estava ao meu lado, apesar de estar muito calado desde que saímos do Hell's. Ele segurou a porta para que eu entrasse, mas não me olhou nos olhos. Eu tinha medo do que aquilo podia significar, seja lá quais fossem as circunstâncias.

Seguimos até o elevador e ficamos lado a lado, esperando que a caixa de metal descesse do andar que estava parado. Encarei–o por longos segundos antes de tocar seu braço, que parecia mais distante do que realmente estava. Sua pele estava fria, muito embora não estivesse uma temperatura tão baixa na rua.

– Matt... você tá bem? – perguntei, tentando quebrar o silêncio gélido que pairava sobre nós.

– Eu... – ele finalmente olhou para mim – Eu não sei.

– Vai ficar tudo bem, eu prometo. – sorri, afirmando mais para mim do que para ele.

– Da última vez que eu ouvi isso, passei cinco dias sem sequer saber onde você estava, Lily. Eu não sei se eu sou capaz de passar mais tempo acreditando assim.

Eu entendia o que ele queria dizer. Não que não tivesse sido igualmente dolorido para mim, mas eu tinha, pelo menos, algo que me motivava a seguir em frente, por mais que o que eu mais queria era voltar pros braços dele e nunca mais me soltar deles. Eu tinha que contar a Matt o motivo de ter deixado ele sozinho aquela noite, e isso seria difícil. Eu precisava estar perto dele agora, e eu só falaria depois de sentir que ele estivesse minimamente confortável.

Eu sabia que algo mais esperava pela gente. Tinha certeza que minha mãe não estava ali a toa, e que o motivo não era pequeno. Ela tinha me prometido que me contaria tudo depois, e eu acreditava que esse depois seria agora. As portas metálicas finalmente se abriram diante de nós. Entramos e o silêncio perdurou. Eu necessitava de algo que mudasse isso, de alguma forma.

– Minha mãe já deve ter se instalado aqui na casa da Tia Bea. – comentei, por alto. – Depois que ela me entregou a credencial, eu corri direto para arena. Deixei tudo para trás, espero que ela tenha lembrado de trazer com ela...

– Margô está em Londres? – Matt indagou curioso.

– Sim, foi ela quem me encontrou no aeroporto.

– Você estava no aeroporto? Você estava indo embora? – Eu podia sentir a dor na voz dele.

– Eu tenho que te explicar tudo com calma, é claro que...

Senti um solavanco forte. Matt tinha apertado o botão de bloqueio do elevador, o que o fez parar com grande esforço.

– Eu tô cansado de esperar por um depois, Lily.

– Não é o momento certo para gente falar disso. Vamos para casa, você tá cansado. – tentei argumentar.

– Eu não me importo – disse ele, se aproximando – Eu quero saber tudo agora.

Eu não tinha opções. Comecei a contar tudo o que tinha acontecido nos últimos dias, tudo o que tinha causado a prisão dele, o meu sumiço, tudo. Eu passei uns bons minutos falando, e o elevador ainda estava parado no mesmo lugar. Me espantava que ninguém tivesse reclamado, embora o horário explicasse perfeitamente. Ainda tinham coisas que eu não tinha como explicar, como o aparecimento súbito da minha mãe por aqui, mas isso seria devidamente exclarecido quando conversássemos com ela.

Matt apenas me escutou. Fez poucas perguntas, embora seu semblante me passasse a impressão de que ele estava se segurando muito para isso. Quando terminei de falar, ele encurtou o espaço que restava entre nós e me fez encostar no espelho frio do elevador. Senti o toque suave de sua mão na minha bochecha, fechando os olhos com o carinho. Seus lábios grudaram na minha testa, enquanto a distância entre nós diminuía ainda mais. Senti ele se curvar e sua cabeça despencar no meu ombro. Ele soltou uma respiração pesada antes de me segurar forte em seus braços, aquele gesto valendo mais do que quaisquer palavras que poderíamos dirigir um ao outro ali.

Entre nós e paredesOnde histórias criam vida. Descubra agora