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(em anexo, fotos do Carlos, da Alba, do Dani, do Bryan, do George e do Abraham)

Os meus sentidos começaram a dar sinal de movimento. Alguém se aproximava do meu quarto.
Levantei a cabeça e olhei na direção da porta e passados uns segundos Alba apareceu à entrada do quarto.
Continuei a fazer as minhas malas e a Alba sentou-se na minha cama, observando-me enquanto eu arrumava as minhas coisas.

- Temos mesmo que ir embora? – perguntei.

- Sim Maya, temos mesmo que ir. Já se passaram dez anos desde que nos mudámos para aqui e as pessoas já andam a reparar que nós não envelhecemos, e não podemos correr o risco de começarem a desconfiar.

- E desta vez vamos para onde?

- Vamos para o México. O Bryan já tem saudades dos amigos, por isso vamos para lá – explicou ela - Mas não sabemos se ficamos lá muito tempo, depois logo se vê.

- Okay – disse, enquanto arrumava tudo, tentando não me esquecer de nada.

Alguns minutos se passaram sem falarmos, até que o Carlos apareceu à porta do quarto.

- Posso entrar? – perguntou.

- Claro que sim! – disse e ele entrou, sentando-se ao pé da Alba.

Reparei que ele estava um pouco triste. Achei estranho, o Carlos costuma ser tão animado... Hm, o que é que se passará?

- Carlos? – chamei.

- Sim?

- O que é que se passa?

A Alba olhou para ele, também à espera de uma resposta.

- Não se passa nada... - tentou disfarçar.

- Eu sei que se passa alguma coisa - insisti.

Ele olhou para mim com um olhar triste e acabou por dizer:

- Faz hoje duzentos e cinquenta e quatro anos desde o acidente de barco... - murmurou.

Sem querer deixei cair as camisolas que tinha nas mãos e olhei para ele sem saber o que lhe dizer. Como é que eu me fui esquecer disso?! A verdade é que, pensando bem, já há décadas que não nos lembrávamos disso. Tentavamos sempre não pensar no assunto para não ficarmos tristes.
Aproximei-me dele e abracei-o, enquanto uma gota de sangue me caía do olho.

- Não chores Maya, não vale a pena – disse a Alba, passando-me a mão pelo ombro.

Eu larguei o Carlos e sentei-me ao pé dele, dando-lhe a mão.

- Tenho saudades dos pais... - disse o meu irmão, olhando-me diretamente nos olhos.

- Eu também...

- Acreditem que eles, estejam onde estiverem, estão muito orgulhosos de vocês... - disse a Alba, despertando o sentimento de revolta do Carlos.

- Orgulhosos de nós?! – gritou, levantando-se – Orgulhosos do quê?! Nós somos uns monstros, basta vermos uma pinga de sangue e perdemos o controlo, atacamos pessoas e animais! Achas mesmo que eles estão orgulhosos de nós?!

A cor dos olhos dele tinham mudado para um vermelho vivo e as suas presas apareceram. Depois de ter dito aquilo saiu do meu quarto e trancou-se no quarto dele, batendo com a porta.
A Alba, depois de ter ouvido aquilo, ficou triste e também saiu do meu quarto.
Quando fiquei sozinha deitei-me na cama a pensar no que tinha acabado de acontecer.

Duzentos e cinquenta e quatro anos desde aquele incêndio que mudou a minha vida por completo. Desde aí que a minha família passou a ser o meu irmão, a Alba, o Dani, o Bryan, o Abraham e o George. Tive que aprender a lidar com o facto de já não ser humana, de só beber sangue, de não precisar de respirar, de não dormir nem comer. Tive que aprender a controlar a mudança de cor dos meus olhos, tive que aprender a controlar a minha raiva para que as minhas presas não aparecessem, tive que aprender a controlar a minha rapidez, tive que aprender a comportar-me como os humanos para eu própria parecer uma humana.
Desde aquele dia que eu nunca mais tive que lidar com milhares de criadas e amas há minha volta, nem com todo aquele luxo e riqueza a que fui habituada desde que nasci.
Para dizer a verdade, eu e o Carlos temos as contas bancárias cheias de dinheiro, pois quando se soube que a nossa família tinha morrido, herdámos toda a fortuna dos nossos pais. E sim, desde que herdámos aquele dinheiro todo, temos tido uma vida de sonho, como sempre sonhámos ter, sem a pressão dos nossos pais, sem as regras de etiqueta que tínhamos que cumprir e tudo o resto que nós odiávamos. Mas mesmo assim nunca perdemos a nossa humildade e para nós sempre foi mais importante a nossa nova família.
Com o passar dos anos, fomos-nos habituando à morte dos nossos pais, mas mesmo assim ainda nos dói saber que nunca mais os voltaremos a ver. Tudo isto ainda é muito duro para nós, principalmente para o Carlos, que nunca se habituou à ideia de ser vampiro. Para ele isto é uma maldição, acha que nos transformámos em monstros. É claro que ele agradece todos os dias à Alba por ela o ter salvo, até porque se ele tivesse morrido no incêndio, eles nunca se teriam conhecido.
O Carlos e a Alba têm uma paixão secreta um pelo outro. Todos sabem que eles se amam, menos eles. E ao longo destes dois séculos, nunca admitiram o que sentem um ao outro.
Mas nem o que o Carlos sente pela Alba fez com que ele mudasse a opinião que tem sobre as transformações. Ele nunca transformou ninguém, e diz que só o fará se o humano correr risco de vida e aceitar ser transformado, pois caso contrário nunca irá transformar ninguém.
E tanto ele como eu nunca matámos um ser vivo. A Alba e o Dani sempre nos ensinaram a controlar a sede, e apenas bebemos sangue sintético, que é fabricado por uma empresa secreta de vampiros, que fabricam sangue sintético para os vampiros, para que estes não matem humanos ou animais. Claro que há muitos vampiros que não aceitaram esse novo estilo de vida e continuam a matar seres vivos para se alimentarem, mas o nosso grupo não o faz, nós só bebemos sangue sintético, e só em casos de emergência é que matamos pequenos animais como coelhos e esquilos.

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