25 - A primeira razão da coleção

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- Você é minha melhor amiga, Sarah – Oliver, aos treze anos de idade cochichou no ouvido dela enquanto o vento entrava pela janela aberta da Variant e espalhava os cabelos deles por todo o lado.

- Você também – ela disse sem olhar pro lado.

- Então você me desculpa?

Sarah continuou com o olhar fixo na estrada. As árvores passavam tão rápido que chegavam a fazer barulho, o pai de Oliver era ótimo em correr muito com o carro. Ela adorava aquilo.

- Hein, Sarah, me desculpa? Prometo que vou te emprestar a prancha. Ainda por cima vou te ensinar a surfar, que tal?

A Sarah de treze anos já era osso duro de roer, continuou sem olhar para o lado ao dizer:

- Desculpo, só mais essa vez. Você tem que parar de ser egoísta.

- Eu prometo que vou – ele disse.

Logo em seguida segurou a mão dela.

Primeiro ela levou um susto. Depois sorriu. Eles continuaram assim, de mãos dadas e sorrindo até chegarem na casa dela.

Apesar da briga por causa da prancha, tinha sido um bom dia. Daqueles que dava vontade de apertar o botão de rewind, voltar a fita, e viver tudo de novo. Principalmente depois de saber aquele também tinha sido o último dia que o pai de Oliver esteve vivo.

No dia seguinte Oliver não foi para a escola e Sarah não entendeu nada. A mãe dele nunca deixava ele faltar. Quando acabou a aula Sarah saiu correndo para casa e implorou para a avó deixar ela ir até a casa de Oliver entregar o dever de casa.

Demorou algum tempo para conseguir convencê-la. Na cabeça da sua avó, sua mãe não ia achar bom Sarah ir sozinha e sem ser convidada para a casa do namoradinho.

A Sarah de treze anos teve que rebolar para não perder as estribeiras ao explicar para a avó que ela e Oliver não eram namoradinhos coisa nenhuma. Que eles eram amigos. Só amigos. Melhores amigos. Nada mais. Por um acaso era tão difícil entender? Sarah insistiu que não. Insistiu tanto que a avó acabou deixando ela ir levar o dever de casa do amigo.

Sua satisfação não durou muito tempo, assim que conseguiu a permissão da sua avó, o telefone tocou, era a mãe de Oliver. Ela estava chorosa. A avó perguntou, cheia de dedos, o que tinha acontecido. A mãe de Oliver desabou em murmúrios incoerentes, explicando sem coesão mais ou menos o que tinha acontecido, mas no fim disse que ficaria contente se a avó pudesse levar Sarah ao enterro do pai de Oliver.

Sarah de treze anos, com o ouvido colado ao lado oposto do telefone, se perguntava como contentamento se encaixava no meio de lágrimas e uma notícia dessas. Enquanto isso sua avó se preocupava com o fato de Sarah não ter nenhum vestido preto.

Ela não tinha mesmo. Preto era uma cor triste, de acordo com sua mãe. E ela estava certa, como sempre estava. A avó conseguiu fazer uma combinação de uma saia com uma blusa preta que dava a impressão que era um vestido e assim elas foram para o funeral.

Todo mundo estava triste, não só pela cor das roupas. Tinha uma coisa de madeira no meio da sala. Oliver se apoiava na coisa. Não dava para ver o rosto dele, mesmo assim Sarah notou que ele estava chorando. Ela foi até lá. Não estava nem um pouco preparada para ver o pai de Oliver deitado de olhos fechados dentro da coisa de madeira. Parecia muito real para o seu gosto. O tipo de real que ela não queria que fosse real. Não podia ser real. Mas parecia.

Real.

A repetição da palavra "real" vinha em ondas cada vez maiores dentro da cabeça de Sarah. Seu Ernesto era quem levava Sarah e os meninos para a praia. Ondas era a especialidade dele. Não podia existir ondas e não existir Seu Ernesto. O pai de Oliver era o pai mais legal do mundo. Sarah não tinha pai, logo, o pai de Oliver assumia o ranking. Aquilo não podia estar acontecendo. Mas Oliver chorava ali ao lado dela. Ela não sabia o que fazer. Deveria chorar também?

O mundo dá voltasOnde histórias criam vida. Descubra agora