Marte; Z-Mil, Agora
Uma palavra vibrou em minha mente tardiamente e eu perguntei-me como não me dei conta antes.
Placebo!
E gritei:
– Isto é um placebo!
Ainda de joelhos naquela sala vermelha eu fechei e abri meus olhos e como imaginava, aos poucos, tudo voltava a ser o que era antes. Antes de eu ir para o corpo de Ruddy, antes de entrar na sala totalmente escura.
Nem tudo era real.
Eu não poderia tirar a dor que meus amigos nunca sentiram. Eu não poderia tirar o irreal, o criado pelas suas próprias mentes.
Placebo não era nada além de mental. Era simplesmente o nosso cérebro reagindo à algo que não aconteceu, mas que, acreditamos tão piamente que era real, que ele parecia ser real.
E nada daquilo era.
Não havia "esquentar" ou queimar, pois não havia nenhuma sala vermelha. Mas nosso cérebro associava à cor vermelha ao quente, a dor, a perigo. E, por isso, nós nos sentíamos em perigo, com dor e queimando.
Ash fora o primeiro a estreitar seus olhos para mim. Ele estava há poucos passos de mim, na frente e estava caído no chão, totalmente deitado.
– Placebo? – ele indagou, quase como se pensasse em voz alta – Por que eu não pensei nisso antes?
Ele levantou-se devagar do chão e me estendeu suas mãos para me ajudar a levantar.
Quando eu estava de pé, encarei Luke deitado de costas para o chão com suas mãos atrás de sua cabeça. Ele encarava o teto com seu olhar cinzento. Parecia tão disperso quanto Ash ou Ariana.
Mas ela, por sua vez, também já estava de pé e olhava para seu corpo, como se criasse a certeza que nenhuma parte dele havia sido queimada ou quebrada.
– Tudo bem por aí? – apontei para Ariana que me olhou sorrindo torto.
– Se tudo é placebo, – ela começou – significa que nós nunca recomeçamos de verdade?
Arregalei meus olhos e fitei Ash que continuava com suas mãos nas minhas. Nesse momento, Luke também se levantou e parou ao meu lado. Parecia que, nenhum de nós tínhamos pensado nessa hipótese.
Será que o recomeçar nunca aconteceu? Nunca, nem sequer, existiu?
– É por isso que não dói... – comecei a falar.
– O que não dói? – Luke instigou.
– Não dói me lembrar. – falei, dando-me conta que eu sabia muito bem quem eu era, o que James e Merry representavam para mim e todo o resto.
Não doía lembrar. Porque eu nunca havia esquecido.
– Mas doeria... – Ash começou – Se você acreditasse que doeria.
Se eu acreditasse que lembrar me infligiria dor, eu sentiria dor. Mas ela não seria real. Seria apenas minha mente criando dores surreais.
– Aquela porta do recomeço em J-Dez, – Ariana falou – não é nada além de um teletransportador diferente?
Eu ri. Finalmente ri com vontade, tanto que inclinei meu corpo para frente, segurando minha barriga pela dor que minha risada causava.
Meus amigos acompanharam meu riso. Não me acharam louca por rir do nada, riam como loucos junto comigo.
Nós quatro sabíamos pelo quê riamos.
Riamos de alivio e ao mesmo tempo sobre o quão estúpidos havíamos sidos. Criamos dores e problemas quando eles, na verdade, nunca existiram.
Quando minha risada cessou eu virei-me de costas, caminhando para onde eu tinha ido, o tal canto amarelo.
Ariana me ajudou a abrir ainda mais à passagem com um soco forte.
O local amarelo, ainda era amarelo, mas não que fizessem meus olhos só enxergar aquela cor. Tudo dentro daquele canto era amarelo, mas eu enxergava tudo nele.
– Então, o local preto e azul realmente eram reais! – falei dando-me conta de tudo – Porém, o que sentíamos dentro deles, não. Era tudo imaginação de nossa cabeça.
– Que local preto e azul? – Luke questionou atrás de mim, já que ele e Ash não cabiam dentro da sala amarela.
Rapidamente, em um resumo, eu os contei sobre à sala onde não víamos nada além de preto e a que não víamos nada além do azul. Contei também das sensações que tínhamos nela. Expliquei que eu e James nos separamos do resto.
– Onde será que todos estão agora? – Ariana questionou, mas eu não tinha como saber.
– Eu caí aqui, de volta, quando Ruddy morreu.
Encarei a minúscula sala amarela e novamente senti vontade de rir, porém, se eu risse seria de pura tensão.
Eu não tinha comido nada além de gelo.
Não fora chocolate meio amargo ou chocolate branco ou carne de carneiro. Fora gelo. Vários e vários cubos de gelo dentro de uma tigela.
A sala era como eu tinha imaginado. Estreita com uma mesa grande no meio e uma tigela sobre a mesma. A tal tigela com gelo. No entanto, o cheiro do lugar era tão bom que dava-me vontade de continuar ali.
– Isto teve gosto de chocolate. – gesticulei para o gelo antes de sair da sala.
Ariana sorriu e pegou dois cubos do gelo, pondo-os de uma vez na boca, e ainda de boa "cheia", falou:
– Continua com gosto de água.
– É claro, você viu que era gelo.
Ash estava com as mãos em seu cabelo, andando de um lado para o outro em meio aquele cômodo bagunçado e Luke encarava à porta.
Passei minhas mãos pelos meu próprio cabelo e, de relance, notei todas as minhas antigas tatuagens de volta.
Bem, talvez elas nunca tivessem mudado, mas eu acreditava que sim.
Encarei meus pulsos. Um com o coração azul e outro rosa. Eu era totalmente eu, na mente e no corpo agora.
Carregava em minhas costas à tatuagem da Mística modificada e todos os meus poderes pareciam gritar para serem usados. Eles nunca haviam sido diminuídos.
Tínhamos sido enganados por nós mesmos. Nossa mente era forte o suficiente para nos colocar em encruzilhadas.
***
E aí, o que acharam da revelação? haha
¹ O efeito placebo é muito observado em estudos científicos para verificar a eficácia de algum medicamento, como nos casos em que um grupo de pessoas recebe um comprimido de açúcar, farinha ou vitamina sem qualquer propriedade farcacológica e apresenta melhorias clínicas, apenas por acreditarem que estavam tomando o remédio propriamente dito.
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A Fugitiva
Science FictionSegundo Volume da Trilogia "A Estranha" Claire sentia que algo faltava, mas o quê ela não sabia dizer. Uma Nascida, dizendo chamar-se Merry e conhecê-la há tempos, lhe chama para salvar James dos Caçadores. Mas Claire não poderia ou poderia ab...