Capítulo vinte e nove

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A floresta densa e lamacenta nunca chega ao fim, corro esbarrando em árvores e tropeçando em coisas no meio do escuro. Estou com pelo menos um quilômetro de vantagem dos outros. Os raios e trovões não me assustam, a chuva e o vento não me impede de seguir em frente, apenas os últimos olhares de Ana e Nicollas faz minhas pernas enfraquecerem pedindo pra sentar e chorar novamente.

Depois de muitos tropeços consigo chegar na margem do rio onde a vi pela primeira vez. Não sei em qual lado seguir; direito ou esquerdo. Sei que Sarah disse algo sobre a direção do mar, mas não lembro.

Em meio a adrenalina nem raciocínei que é apenas seguir a direção da corrente do rio; lado direito. Sigo em frente.

A margem tem muitos relevos que dificulta a minha velocidade necessária. Tem muitas pedras, galhos, lamas, etc. Um monte de terra vai se elevando devagar a cada passo que eu dou. Está próximo. Ao correr mais um pouco percebo que pra chegar ao local desejado preciso subir um barranco enorme. De onde estou o rio já está bem abaixo, imagina lá em cima! Deve ter pelo menos uns vinte metros de altura ou mais.

Vou subindo o barranco, a elevação diagonal permite que eu suba até um certo ponto segurando em raizes.

Ouço gritos chamando pelo meu nome. Me alcançaram.

- Charles! Espere! - grita Max.

Não respondo. Eles estão muito abaixo, acho que não vão subir pois a chuva persistente deixa o barranco cada vez mais escorregadio.

Um raio corta o céu, seguido por um tronco que passa voando acima de minha cabeça. Me penduro na beira do barranco e puxo meu corpo pra cima. Consegui.

- Mãe! Maiêêê! - Grito.

Chego um pouco perto da beirada.

- Mãe! Apareça! E me mate se quiser!

Posso ver o mar que está muito agitado, as ondas estão tão violentas que respingos d'água voam em meu rosto vindo de vinte metros abaixo.

- Mãe! - grito novamente.

A escuridão permanece e os trovões se intensificam, o vento me empurra um pouco pra trás e um raio cai em meio ao mar.

- Mãe!

O vento fica mais forte e uma fumaça branca flutua e se move em minha frente acima do mar.

- Charles! Meu filho querido.

Ela surge perfeitamente em minha frente levitando sobre o nada. Ela tem os meus traços e seu cabelo é liso, castanho claro e dividido ao meio.

- Mãe! Por quê fez tudo isso?
- Fiz muitas coisas Charles! Se especifique por favor.
- Por quê matou meu pai, os pais de meus amigos... meus amigos... todos! Por quê matou eles? Por quê? Fala!
- Você nasceu aqui Charles! Bem aqui. Seu pai te segurou com os olhos tão fixados em ti que vi que o amor dele tiraria o foco do que eu sentia por você, então eu o matei! Só isso, nada demais.
- O quê?!
- Já os pais de seus amigos você sabe o motivo, não preciso dizer o porquê!
- E você acha esse motivo justificável?
- Claro! Foi tudo por amor Charles! Nada mais que isso.
- E matar meus amigos foi por amor também? Matar as pessoas que eu mais amo é típico de uma mãe amorosa, não é?
- Não se atreva a dizer que ama essas pessoas! Você deve amar somente a mim! Fui eu que te carreguei por nove meses na barriga.
- Verdade! Mas eles me carregaram em seus corações por toda uma vida após o seu suicídio!
- Me matei pois queria acompanhar toda a sua vida, e fiz isso! Até fiz de tudo para que você voltasse pra cá e vivessimos só nos dois! Sem mais ninguém! Então não espere que eu poupe a vida de algum deles, vou matar todos! Uma mãe sabe o que é melhor pro seu filho, é tudo por amor!

Um raio cruza o céu e a chuva aumenta. Me aproximo da beirada.

- Então eles morreram por me amarem e por eu ama-los?
- Sim! por isso matei eles, enquanto você viver terá de amar somente a mim - diz ela.
- Não! você terá de passar a eternidade sabendo que eu nunca te amei, Mãe! E morri por aqueles que me amavam de verdade -
Pulo.

Fico imaginando o quanto vai doer. Mas isso é necessário. Quando perdemos alguém que amamos, não perdemos uma parte ou pedaço nosso como dizem as pessoas, a gente na verdade se perde completamente, simples assim. E eu estou perdido, pois também, você não supera a morte de quem se ama, mas sim você aprende a conviver com essa dor. E eu não iria conseguir viver sabendo que tantas pessoas morreram por minha causa; os pais dos meus amigos, meus pais biológicos, Ana, Nicollas, meus pais adotivos...  Então se todas essas mortes foram culpa minha, é minha responsabilidade salvar os que restaram...

Sete Medos(Em Revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora