Capítulo 17.

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Emily não tinha pensado naquilo. Seu estômago se contorceu com a idéia de confrontá-lo de novo tão breve, e na frente de Peter, que esperava que o sobrinho logo ficasse noivo. Ela fora uma tola de ter imaginado que, somente porque esclarecera seu passado, estava livre para agir sobre a atração que sentia por Ethan. Sua fantasia de um relacionamento com ele era uma criação de suas próprias necessidades emocionais.
- Posso comer um sanduíche enquanto trabalho - murmurou ela, lembrando como Dylan participara naquela desilusão dolorosa.
- Mas pense em toda a conversa fascinante que perderia. - Ele tirou uma pétala de rosa da blusa dela e pressionou-a na palma. - Poderia me contar tudo sobre você... e eu poderia lhe contar tudo sobre Ethan...
Emily não lembrava o resto dos argumentos dele, os quais foram extremamente persuasivos, mas, uma hora depois, estava comendo escalopes e bebendo um excelente vinho, enquanto ouvia Dylan falar sobre a mudança que ocorrera em seu irmão após a morte dos pais deles. Antes disso, contou ele, Ethan sempre fora alegre e divertido, mas, embora tivesse algum senso de aventura, não possuía a impetuosidade pura que caracterizava o pai deles.
- Ethan se culpa pelo modo como nossos pais morreram - disse Dylan, o semblante mais sério que Emily já vira - porque deveria estar com eles naquele dia. Os três iriam voar para um casamento em South Island, e Ethan ia pilotar porque estava tentando completar suas horas de vôo. Mas surgiu um problema no trabalho que o atrasou. Achou que resolveria logo e continuou adiando a decolagem, mas no final teve de cancelar a viagem. A essa altura, já estava tarde e o tempo começou a virar. Mas papai não deixaria que algumas nuvens baixas no céu o detivessem.
Dylan ergueu o copo e brindou o destino irônico.
-Papai também sabia que iria falir novamente dentro de alguns dias. Entre outros bens, perderia seu avião particular, e queria voar nele uma última vez... que acabou sendo literalmente seu último vôo. - Dylan fez uma pausa. - Eles caíram num terreno isolado... demorou dias para acharem os destroços, mas ambos morreram instantaneamente.
- Meu Deus, que terrível - disse Emily, imaginando os sentimentos de Ethan ao ouvir a notícia de que o avião dos pais estava desaparecido. - Mas seu pai dirigia uma companhia aérea, certamente era um excelente piloto.
- Sim, mas mesmo bons pilotos às vezes tomam decisões erradas. - Ele deu de ombros. - Erro do piloto, disse o relatório. Por alguma razão, papai estava tentando voar debaixo das nuvens, em vez de usar seus instrumentos, e deve ter ficado desorientado. É claro, Ethan está convencido de que, se estivesse lá, isso não teria acontecido, mas quem sabe? Ethan nunca teria decolado com aquele tempo, mas papai era teimoso e teria ido de qualquer forma para provar que podia. Ethan sempre foi um piloto cauteloso, principalmente porque não gosta de voar. Acho que só decidiu pilotar porque papai estava desapontado em não ter um filho que quisesse assumir seus passos.
- Você não pilota? - perguntou Emily.
- Está brincando? - Ele sorriu. - Isso sempre me pareceu um trabalho muito duro. Dê-me um carro veloz, uma garota bonita para sair, e estou feliz!
Ela riu, embora não acreditasse que ele fosse tão superficial quanto fingia ser. E provou não ser quando falou:
- Depois do acidente, Ethan parou de voar por um tempo, mas então forçou-se a voltar. Acho que viu isso como um tipo de penitência.
- Mas certamente ele não acredita que foi responsável pelo acidente?
- Racionalmente sabe que não é culpado, mas emocionalmente é uma outra história. Não sei se ele ficou mais zangado com papai ou consigo mesmo pelo que aconteceu naquele dia. - Dylan suspirou. - Tudo o que sei é que, desde então, Ethan desenvolveu um senso de responsabilidade exagerado em relação ao resto da família.
- Quer dizer, em relação a você e Peter? - Emily entendia agora por que Ethan agira com tanta raiva quando suspeitara de que ela estava explorando o tio dele.
- Sim. Ele pode ser muito chato às vezes. Quer cuidar da minha vida como se eu tivesse 16 anos em vez de 26.
- E, é claro, você não lhe dá nenhum motivo de preocupação.
Dylan pareceu humilde.
- Considero meu dever como irmão dar uma sacudida na paranóia dele de vez em quando.
- Como provocá-lo sobre Carly? - murmurou Emily, que estivera esperando o momento certo para mencionar o nome.
- Carly Foster. - Ele inclinou-se para a frente, as sumindo um tom confidencial. - Uma verdadeira raposa. Ela e Ethan têm saído de vez em quando há alguns meses.
- De vez em quando? - Aquilo não soava como o compromisso sério que ele tinha feito parecer na casa.
- Bem, ambos são pessoas ocupadas, mas Carly está beirando os trinta, e a maioria dos solteiros elegíveis tende a casar com jovens que lhes massageiam os egos, em vez de competir com eles. Ela está tentando convencer Ethan de que formam o casal perfeito, mas ele está se provando muito evasivo.
Emily baixou o garfo, uma nova esperança ^urgindo depois da humilhação.
- Quer dizer... Você não acha... Eles estão...
- Estão tendo um caso? - Dylan deu de ombros. -Eles são adultos, os dois atraentes, por que não dormiriam juntos? - Ele ficou pensativo por um tempo, depois acrescentou: - Mas não acho que Carly arriscaria se entregar de graça. Ela está se fingindo de honrada, provocando-o e deixando-o desesperado, até que ele lhe ofereça um anel de noivado. Não parece perceber que Ethan é o rei da autonegação - disse ele com uma ponta de prazer. Depois de Arina, meu irmão passou a ser muito cuidadoso com as mulheres.
- Anna? - Emily deu um gole no vinho. Queria mesmo saber? - Quem é Anna?
- Caso antigo - replicou Dylan. -Meu irmão estava noivo quando nossos pais morreram. Mas Anna o dispensou quando ele usou todo seu dinheiro para pagar as dívidas, em vez de gastá-lo todo no grande casamento e na casa que planejavam comprar. Ethan aceitou uma pequena ajuda de Peter para saldar as dívidas de papai, mas a maior parte assumiu sozinho. Queria que eu ficasse orgulhoso do nome da família. Entende o que digo sobre responsabilidade exagerada?
O que Emily via era uma similaridade entre o que fizera pelo seu avô e o sacrifício de Ethan para compensar as perdas do pai. E, como Conrad, a noiva dele também desaparecera quando a situação financeira tornou-se instável. Ele devia ter ficado devastado. Talvez, por isso, agora preferisse relacionamentos com menos peso emocional. Dylan obviamente não aprovava Carly para esposa do irmão, mas Ethan podia estar procurando por um arranjo prático, em vez de amor.
Algumas taças de vinho não eram uma preparação ideal para uma tarde de trabalho, então, quando eles chegaram na casa, Emily foi para seu quarto com um café preto e leu um pouco. Não estava se escondendo, disse a si mesma quando deitou na cama com seus cadernos. Proteger-se da dor não era se esconder, repetiu silenciosamente mais tarde, no momento em que ouviu uma batida à porta e a voz de Ethan chamando do outro lado. Ela ignorou o chamado e o ouviu se retirar, lutando contra o desejo de abrir a porta e chamá-lo de volta. Mas sabia que, se o deixasse entrar, Ethan a tocaria e ela se perderia no prazer. Não tinha vergonha em admitir o poder que ele exercia sobre ela; vergonha seria deixá-lo usar isso à custa de seu amor-próprio.
Estranhamente, nunca tivera ciúme de Conrad, mas a idéia de Ethan com outra mulher a deixava doente, e não confiava em si mesma para discutir o assunto racionalmente. Não queria ouvir que era apenas mais uma na vida dele.
O que queria de Ethan era algo que não estava preparada para reconhecer, nem para si mesma. Afinal, não podia assumir uma batalha invencível.
Então, quando pouco antes do jantar o encontrou indo para a porta, vestido lindamente de preto, tremeu com a visão.
- Pensei que você já tivesse saído - murmurou ela. Aparentemente, o bale era mais que apenas um espetáculo. Haveria um evento para angariar fundos depois.
- Então achou que estava segura para sair do quarto? - Ethan a olhou seriamente. - Você não pode me evitar para sempre, Emily.
- Não peço que seja para sempre. Um dia de cada vez estará bom.
Ele estreitou os olhos.
- Nenhum de nós pode ter nada para sempre. Por isso, o presente é tão valioso. - Ele consultou o relógio. - Amanhã - prometeu antes de se virar e sair para encontrar a Outra Mulher de sua vida.
Ou talvez, pensou ela, Ethan pretendesse fazer de Emily a Outra Mulher.

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