Capítulo XX

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— Você está ficando louco, Ângelo. Isso deve ser coisa de sua cabeça.

— Juro que não, padre! — exclamou o Mensageiro, lembrando-se do nome escrito no espelho. — Tenho provas concretas de que algo de muito estranho está acontecendo.

— Quais provas?

— Bem, desde criança tenho a mania de desenhar coisas na superfície de espelhos ou vidros, usando uma baforada para embaçá-los. — começou Ângelo, pensando em como contar aquele fato de forma clara o suficiente. — Trouxe essa mania até agora, na fase adulta, e após escovar os dentes hoje de manhã, soltei a baforada no espelho do banheiro. Quando percebi que havia algo escrito, cobri toda a superfície do espelho com o ar expelido e o nome revelado foi o do padre Giovanni!

— Você mesmo não o escreveu, em outro momento?

— Óbvio que não, padre. Se tivesse sido eu, não teria ficado tão amedrontado! — Ângelo estava prestes a surtar. — Primeiro, as vozes chamando pelo meu nome; depois, o nome de Giovanni escrito no espelho do meu banheiro. Achei que só podia ser uma espécie de sinal, sei lá. Foi por isso que, imediatamente, fui em busca do padre Giovanni, mas então descobri que ele já estava morto! Por isso estou aqui agora.

— Mãe de Deus... — respondeu Estrôncio que, após perceber todo o desespero estampados nos olhos de Ângelo, passou a acreditar.

— Pois é, padre. Você sabe de alguma coisa que eu não sei? Algo que justifique estes sinais que recebi, talvez? 

— Não, Ângelo, não sei de nada. Até prefiro não falar muito sobre isso... — disse o padre, desviando o olhar e mostrando-se ainda mais  abalado com aquela pergunta. De repente, algo aterrador lhe surgiu à cabeça, uma consequência de tudo o que vinha acontecendo. — Ângelo, você sabe que na investigação sobre o responsável pela morte do padre Giovanni eles virão atrás de nós, não sabe?

— Padre, eu já tinha tanta coisa na cabeça que nem me toquei dessa possibilidade. — De fato, era óbvio que os investigadores viriam para cima de Ângelo e Estrôncio, já que ambos possuíam mais contato com Giovanni do que qualquer outro padre. Ao menos era nisso que Ângelo acreditava, mas não podia ter certeza, pois não conhecia a vida social de Giovanni a fundo.

— O que vamos falar pra eles?

— Acho que devemos dizer apenas a verdade, mas tentando omitir o projeto. — Quando disse isso, Ângelo reparou que Estrôncio fizera uma cara estranha, como se não tivesse gostado da ideia. — Padre, omitir não é mentir.

— Eu sei, Ângelo... Talvez não haja outra escapatória.

— Padre, só por curiosidade, o senhor sabe quem chefiava o projeto?

— Ora, sempre soube que era Giovanni, por isso não entendo qual o motivo para alguém fazer uma coisa dessas.

Percebendo que Estrôncio não sabia a respeito do Conselho, Ângelo apenas gesticulou positivamente com a cabeça, preferindo ocultar este detalhe por uma questão de proteção.

— Padre, vou retornar aos meus aposentos e aguardar por lá — disse o Mensageiro.

— Está bem, se eu souber de alguma coisa, passo lá e lhe conto. — Apesar de ter aceitado a ideia de Ângelo e ter parado de chorar, Estrôncio ainda parecia muito descontrolado, pois seu tom de voz oscilava, sem contar a gagueira. Aquela era uma reação muito estranha, já que Ângelo não imaginava que ele e Giovanni tivessem sido tão amigos quanto estava aparentando.

— Ok, padre, combinado. — Estava prestes a sair do apartamento quando se lembrou de uma coisa: — Ah, padre, só uma pergunta. Este dispositivo que eu tenho por baixo da pele do tórax é recarregado com as informações necessárias para uma volta, não é? Nada mais que isso?

As Últimas LembrançasWhere stories live. Discover now