Capítulo XXVII

8 0 0
                                    

O laboratório era uma sala não muito grande, que contava com uma escrivaninha à direita e todo o equipamento e maquinário de viagem, incluindo um receptáculo de vidro que era utilizado para as viagens, à esquerda. Sobre a escrivaninha havia um computador bastante antigo, no qual Estrôncio passava quase todas as horas de seu dia, programando e pesquisando. No geral, era um lugar bastante simples e prático.

— Logo que foi aberta a porta, foram encontrados os seguintes vestígios — continuou Sniffer, desta vez enfiando a mão no bolso interno de seu sobretudo para, acreditou Ângelo, pegar algum tipo de anotação. Porém, o investigador apenas pegou um lenço e assoou brevemente seu nariz, devolvendo-o para o bolso logo em seguida. — Primeiro, manchas de sangue pelo chão. Este sangue parece ter sido pingado no chão, sendo que alguém pisou sobre ele com os próprios pés. Não havia sinais de calçados, mas do próprio pé despido. Para marcar toda a palma do pé, deveria haver uma quantidade relevante de sangue, como foi o caso. Nestas pegadas, uma cicatriz ou corte foi identificado no negativo das pisadas deixadas pelo chão. Outra característica é que o hálux está na...

— Hálux? Em nossa língua isto significa...? — interrompeu Ângelo.

— O dedão do pé, tal como a marca deixada pela sua falange distal, indicam que o pé em referência foi o esquerdo. O esquerdo pisou no sangue, quero dizer — explicou Sniffer, que recebeu como resposta as expressões confusas de Ângelo e Ferdinand. Antecipando qualquer pergunta, o investigador logo tratou de simplificar: — Distal é a ponta do dedo do pé, essa parte mais gordinha. Bem, senhores, usando o linguajar comum, a pegada deixou uma imagem negativa onde a marca mais gordinha está na extrema direita do pé esquerdo. Entenderam?

— Sim, sim, continue... — respondeu Ferdinand, enquanto Ângelo se perguntava no que, diabos, aquilo iria influenciar nas conclusões. De qualquer maneira, o mais bizarro era como aquele sangue havia parado ali e quem era o dono das pegadas. Estas eram as questões mais importantes, na visão de Ângelo, não se o dono da pegada possuía a parte gordinha do dedão do pé.

— Outro aspecto desta pegada é que, na medida em que a pessoa andava, ela ia sumindo. A pegada para em frente ao computador, na escrivaninha, e depois segue para a esquerda do quarto, em direção a um equipamento esquisito localizado ao lado de uma cabine de vidro — disse Sniffer, gesticulando com os dedos sobre a superfície da mesa, tentando ser bastante didático em sua explicação. — O segundo aspecto ainda se refere à pegada na frente do equipamento. Ela ficou estática em frente àquele maquinário, e depois simplesmente não apareceu mais em canto nenhum, como se a pessoa não tivesse mais andado. Parece que quem estava ali havia sumido de um minuto para o outro, entenderam?

Ângelo e Ferdinand trocaram olhares confusos e permaneceram calados.

— Pois é, nem eu! — completou Sniffer, após ver que nenhum dos dois havia compreendido como aquilo era possível. — O terceiro detalhe se refere aos vestígios de sangue encontrados no encosto da cadeira da escrivaninha, que provavelmente caiu no momento em que foi utilizada como apoio. O quarto aspecto se refere aos rastros de sangue em cima da mesa, indicando dedos molhados que seguem até o teclado do computador. O quinto, por sua vez, diz respeito às digitais com sangue no teclado do computador e no botão de liga/desliga de seu gabinete. Estão acompanhando?

Tanto Ângelo quanto o arcebispo acenaram com a cabeça, refletindo sobre a cena que havia acontecido. Até onde Sniffer havia contado, um sujeito sangrando apareceu no laboratório, pisou em seu próprio sangue e deixou pegadas pelo chão. Então, foi até a escrivaninha, usou uma das cadeiras como apoio no momento de andar e, chegando no computador, deixou suas digitais com sangue no teclado e no botão de ligar/desligar. Até aí, tudo certo.

— O estranho, meus caros, é que a sexta evidência menciona que não há vestígios de digitais na maçaneta da porta, sendo que a mesma estava trancada. Só conseguimos abrir a porta depois que o reverendo me deu a chave do laboratório — disse Sniffer, em um tom fantasmagórico, fazendo com que Ângelo se arrepiasse. Tudo indicava que um fantasma havia atravessado as paredes para amaldiçoar aquele laboratório. Ângelo já tinha avisado Estrôncio que aquele mecanismo de viagem era do mal, mas ele não acreditou! Restou comprovado, naquele momento, que algo de diabólico estava por trás de todo o projeto. — Foram coletados o sangue e as digitais para serem analisados em laboratório policial, sendo que terei os resultados daqui a algumas horas. Foram retirados o gabinete e o teclado do computador para que possamos fazer uma cópia do que havia ali dentro. A propósito, alguém sabe dizer se existia alguma senha para a entrada no sistema do computador?

As Últimas LembrançasWhere stories live. Discover now