Capítulo XXV

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— Sim? É ele falando... — disse Ferdinand, após atender. — O quê? Como assim...? Coloque imediatamente toda a guarda suíça para procurá-lo, cômodo por cômodo, rua por rua, em todo o Vaticano! Certo... Mantenha-me informado.

Algo de errado havia acontecido, e Ângelo não precisou ser um gênio para perceber isto através da expressão preocupada do arcebispo.

— O padre Estrôncio sumiu.

— Como assim sumiu? — Ângelo não podia acreditar que aquilo estava de fato acontecendo. Parecia que já havia acordado com o pé esquerdo, mas aquela notícia só o fez desconfiar ainda mais de Estrôncio. Primeiro, as mentiras; agora, uma fuga inesperada. — Falei com ele há pouco tempo, antes de viajar!

— Viajar? Estava planejada uma viagem mesmo depois do que houve a Giovanni?

— Pois é, reverendo, essa é mais uma historia sem explicação convincente. Eu tinha ido até o laboratório conversar com Estrôncio sobre o padre Giovanni, não o encontrei e decidi ir até a casa dele. Ele me atendeu e pareceu profundamente chocado com o que havia acontecido com Giovanni. Bem... mas durante a conversa falamos sobre o funcionamento do dispositivo instalado no meu peito — começou a explicar, novamente se remexendo na cadeira. — Ele havia dito que o dispositivo somente funcionaria para uma viagem, sendo que as informações de destino e retorno seriam inseridas momentos antes no laboratório. Porém, quando voltei para casa e toquei sem querer no dispositivo, ele funcionou! Então, quem recarregou, se ele havia me dito que não tinha recarregado? E tem mais uma coisa: como foi possível carregar os dados de viagem estando longe do laboratório?

— Você já testou para ver se o dispositivo está funcionando agora?

— Não, reverendo! Depois do ocorrido, fiquei com receio. Gostaria de falar com Estrôncio antes de tentar novamente.

— Ora, teste-o agora, então — incentivou Ferdinand, que devia estar morrendo de vontade de ver com seus próprios olhos como que o dispositivo iria funcionar.

— Agora, sem um clima? — perguntou o Mensageiro.

— Ângelo, nós não vamos namorar, é só pra testar o equipamento.

— Tudo bem, reverendo, tudo bem — aceitou Ângelo, mesmo que contrariado. Então, se ajeitando na cadeira, estufou o peito e o bateu com a mão direita, do jeito costumeiro. — Spock, um pra descer.

Maravilhado com aquela cena, o arcebispo caiu na gargalhada, o que deixou Ângelo bastante constrangido.

— Está rindo do quê, senhor?

— Por que tudo isso? Você tem a fantasia de estar na, na... Como se chama mesmo aquela nave espacial? — disse Ferdinand, fazendo o possível para falar entre uma risada e outra, enquanto também tentava se lembrar do seriado de tevê. — É daquele filminho, não é? O... Como é mesmo o nome?

— Reverendo, o sonho antecede a ação, e isso acontece com toda a humanidade — disse Ângelo, sem qualquer esboço de sorriso na face. Se havia algo que não o fazia rir eram as piadas referentes aos seus seriados favoritos e palavras cruéis referentes a animais. — E outra: aquele não é um filminho. Chama-se Star Trek, série criada na década de 1960, e uma das mais exibidas até hoje. Terceiro, o senhor disse que o mais importante são os resultados, portanto, não entendo qual o motivo desses seus belos dentes de marfim estarem apontados para mim, neste imenso sorriso.

— Tudo bem, tudo bem — disse o arcebispo ainda aos risos, erguendo aos mãos ao alto, como se estivesse se rendendo às reclamações de Ângelo. — Entendi. Pelo visto, não está carregado.

— Pois é, reverendo, ele demora um pouco, mas se estivesse carregado, ele já teria me dado aquela sensação de enjôo e já teria funcionado — explicou o Mensageiro, mantendo sua expressão séria de antes. — Há outra coisa, ainda.

As Últimas LembrançasWhere stories live. Discover now