Capítulo 4

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Lydia

— Sabe que não vou passar pela fronteira. — Disse ela.

A medida que se aproximavam, o calor que sentia preencher suas veias ficava mais forte. Sem prestar atenção ao caminho coberto por raízes e arbustos da trilha esquecida para o rio, ela tropeçou ligeiramente, mas a mão de Olsen alcançou rapidamente seu braço, impedindo-a de cair.

— Não seja tola. — Ela ouviu Olsen dizer ao pegar uma faca comprida de sua bolsa e cortar alguns dos arbustos que impediam a passagem.

— Obrigada. — Ela falou sorrindo.

Crescer com um dos lugares mais perigosos e misteriosos de todo o Reino de Elthe no quintal de suas casas, rendiam boas histórias de terror e também característicos avisos. Desde pequenos ouviam um mantra de todos os adultos da vila: "Não cheguem perto da floresta branca, ou terão uma morte lenta e extremamente dolorosa. "

Lydia riu e seguiu em direção ao rio com Olsen em seu encalço. Mesmo em plena primavera era possível sentir a temperatura caindo a cada passo que davam subindo o morro em direção ao rio, a neblina densa começava a atrapalhar a visibilidade e o vento fazia um alto barulho de assobio.

— Não podemos caçar com essa visibilidade. — Olsen falou.

— Sabe que isso não vai ser problema. — Retrucou a jovem.

Uma garoa fina e gélida caía sobre o rosto de Lydia, o cheiro de folhagem molhada lhe encheu as narinas. Lydia sentiu os pelos de sua nuca se arrepiarem e um buraco crescer em seu estômago quando ouviu o barulho do feroz Forulean. Ela conhecia bem o que viria. Lydia, desde a primeira vez que viera perto do rio Forulean, sentira como se algo na Floresta Branca a chamasse. Não pelo seu nome, e sim pela sua alma, pelo seu sangue. Ela se sentia poderosa e compreendida, como se pertencesse a aquele lugar. A floresta cheirava a terra molhada.

Ela ainda não podia ver o penhasco do rio Forulean, ainda assim, sentiu como se um cobertor de energia a envolvesse e fizesse todo seu corpo formigar. A floresta branca ressoava uma melodia estranha e cálida, mas de uma complexidade sem tamanho. Lydia se sentia quase nostálgica.

— Não sei porque sempre me convence a vir. Está louca. — Olsen sussurrou. — Estamos loucos.

Mesmo compelida a se aproximar mais, ela não ousava. As histórias que contavam sobre a Floresta de gelo eram aterrorizantes. Diziam que criaturas das sombras viviam lá, e que sugavam a alma daqueles que eram corajosos ou tolos o suficiente para se aproximar. Diziam que a Floresta Branca tinha vida, que até as arvores poderiam dar um fim doloroso aos desavisados.

Quando já podiam ouvir as águas correntes do rio, Olsen finalmente encontrou o que poderia ser uma trilha de um cervo. Ele apontou para as pegadas e galhos quebrados e Lydia assentiu, ainda tomada pelo torpor causado pela energia da floresta. Não falariam mais. Começaram a andar silenciosamente, saindo da trilha e se embrenhando floresta a dentro. Lydia percebeu um movimento a alguns metros de distância, à esquerda dos dois. Ela parou e fez sinal para Olsen, e eles logo se camuflaram em arbustos e sombras próximos.

Alguns minutos depois o viram, era um cervo, ele estava pastando tranquilamente onde a grama verde era mais alta, o lugar estava perfeito para um tiro, longe o suficiente para ser um tiro interessante.

Lydia era muito boa com um arco, melhor do que qualquer um residente da vila, e mesmo Olsen admitia isso. A energia da Floresta Branca fez seus dedos coçarem quando finalmente preparou o arco e mirou no cervo. Ela com certeza não erraria. Olsen ao seu lado, não emitia nenhum som.

Ela inspirou fundo uma vez, e esvaziou a mente, sentiu seu corpo formigando pela atração da Floresta Branca. Seus músculos se enrijeceram, começando a reclamar pelo tempo em que estava segurando a corda do arco tensionada. Inteiramente concentrada no cervo, atirou. Os dois ouviram o barulho da flecha cortando o ar e depois atingindo o ponto certeiro na carne do cervo, que caiu no chão, imóvel. Olsen a olhou exultante.

— Outro belo tiro. — Disse Olsen correndo em direção ao Cervo com um sorriso.

Lydia deu um sorriso torto, convencida, indo atrás de Olsen. Viu-o pegar uma faca e com ela cortar a barriga do cervo para, ali mesmo, limpar as entranhas do animal. Ele separou as tripas em uma sacola. Depois amarrou uma corda juntando as quatro patas do animal, soltou um pequeno rugido ao tentar levantá-lo. Lydia revirou os olhos e foi em direção ao animal. Ela era forte, e sabia disso, poderia aguentar sem problemas o peso do cervo durante o caminho de volta.

— Nem pense nisso. — Ele a interrompeu. — Você achou, você atirou, você caçou, vou me sentir um inútil se tiver que carregar o cervo, apenas porque é pesado demais.

Lydia riu.

— Não tenho culpa se é um fracote.

Os dois tomaram a trilha de volta a Rainelle, felizes por terem conseguido carne para a festa que se aproximava. A medida que se afastava da floresta a energia dentro dela se esvaía, e o buraco dentro de si aumentava, era como se estivesse ficando vazia.

A Canção do Antigo (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora