▲Meus olhos se abriram, mas não senti meu corpo. Minha visão se ajustava a claridade do céu que fora pincelado por tons de laranja e rosa. Tentei me mover, mas era prisioneira de mim mesma. Um corpo sem controle.
Foquei o horizonte onde o sol se punha percebendo a estranheza do lugar, era como um cenário incompleto. As cores não coloriam todo o céu, perdiam-se a distância e encontravam a escuridão. O mar era tranquilo como um lago e uma brisa era o que fazia balançar.
Escuto passos atrás de mim, mas não consigo me virar. Não tenho medo dentro de mim, talvez fosse a estranha segurança que o lugar passava, ou o fato de como eu parecia estar esperando por aquele som. Duas pessoas sentam ao meu lado, mas ainda não olho para elas, estou fixada no horizonte.
Meus lábios se movem sem meu controle.
– Essa é uma das memórias que quero guardar. NóS.
Minhas palavras se perdem no silêncio, mas, um de cada lado, duas mãos tocam as minhas em resposta. Sinto um beijo ser depositado no topo da minha cabeça e olho para cima vendo o garoto, Nate, Ågaris, o Hayden original. Ele sorria para mim com uma leve tristeza escondida.
– Todos temos que guardar essa memória. Tudo pode ser perdido, exceto por NóS.
Tudo então ficou preto. ▲
/---\
Acordei com a cabeça latejando. Minha visão borrada demorou a se ajustar a escuridão. Eu sentia que dias se passaram desde que eu apagara, mas ao olhar no GPS percebi que não passaram mais que dois minutos.
Respirei com dificuldade sentindo tudo doer dento de mim. Um som ensurdecedor se repetia e o vento forte levantava poeira. Um helicóptero, deduzi. Grunhi girando para o lado sem forças, o objeto voador se distanciava. Não precisei de muito tempo para entender o que estava acontecendo. Tentei levantar, mas meu corpo ainda pesava, qualquer movimento era doloroso demais.
"Alguns deuses pedem sacrifícios, eu peço um pensamento." Hayden era o sacrifício que eles queriam. "Todos temos que guardar essa memória. Tudo pode ser perdido, exceto por NóS." As palavras ecoavam em minha mente de forma ensurdecedora. "NóS".
Minha dor física diminuía aos poucos. Me forcei a sentar perdendo Hayden de vista. Não podiam levá-lo, não Hayden. O que seria de mim sem ele? Aquele era o fim? Eles teriam me tirado a única coisa que me sobrara? Meu estômago se tornou um buraco negro. Meu peito estava tão apertado que parecia querer perfurar a si mesmo.
Ele o levou, tirou tudo de mim, o mundo, as pessoas, a sanidade, Hayden.
Sentei com lágrimas de ódio em meus olhos. Eles poderiam me tirar tudo, qualquer coisa, mas não Hayden. Ele era meu, meu amigo, minha criação, minha sanidade. Hayden era parte de mim, real ou não. Eu o salvaria, faria todos pagarem por isso, não importava quem fossem eles. Não importava quem eram NóS.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Forgotten
Science Fiction"Nada fazia sentido. Um dia todas as ruas estavam cheias de pessoas se esbarrando umas nas outras, no outro eu abri os olhos e não havia sobrado ninguém" #4 em Ficção Cientifica (14/MAR)