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O bar não ficava tão longe da fazenda.

Era um caminho de trinta minutos, no máximo. Mas naquela noite, pareceu uma viagem interminável.

Melissa apoiou a cabeça na janela e praticamente desmaiou. Eu tentei mantê-la acordada, tentei conversar, mas ela não parecia interessada. O máximo que consegui como resposta foram alguns resmungos que entendi como "covinhas idiotas", "tanquinho idiota", e outras variáveis de "idiota".

Mantive o rádio ligado e, enquanto batucava os dedos no volante, perguntava-me como eu tinha acabado naquela situação.

Eram quase três da manhã quando passamos pelas porteiras da fazenda. Estacionei a caminhonete e grunhi sozinho, sabendo que teria que estar de pé dali duas horas.

Mel resmungou sonolenta no banco do passageiro. Virei o rosto para ela e estudei os traços adormecidos, ainda sem entender como eu tinha chegado até ali, cuidando de uma garota alcoolizada que me odiava.

Saí do veículo e dei a volta para abrir a porta dela. Ela quase caiu quando concluí o movimento, mas o cinto de segurança a manteve no lugar. Tive que desfivelar com cuidado, apanhando-a no meu colo para levá-la para dentro da casa.

— Você me deve por isso – disse para a garota sonolenta nos meus braços, carregando-a com facilidade.

Enquanto tentava equilibrá-la e abrir a porta ao mesmo tempo, Mel riu ao pé do meu ouvido e distribuiu alguns beijos tímidos no meu pescoço.

Apertei os lábios e olhei torto para o céu escuro e estrelado sobre nossas cabeças, percebendo que meu pedido por misericórdia havia sido devidamente ouvido e claramente ignorado.

— Eu nunca disse isso antes, mas você precisa parar de me beijar – alertei entre os dentes, mas a minha súplica serviu apenas para fazê-la rir mais.

Melissa afundou o rosto quente no meu pescoço e brincou com os botões da minha camisa, escorregando os dedos para o meu peito e correndo a unha contra a minha pele.

— Você é o demônio – sussurrei, levando-a pelo corredor.

Mel gargalhou e o som fez os pelos da minha nuca arrepiar.

Apesar do meu comentário, quando a coloquei na cama, a última coisa com o que ela se parecia era um demônio. Ao contrário, Melissa nunca tinha estado tão angelical quanto naquele momento.

Ela fechou os olhos e se aninhou como um gato manhoso entre os lençóis, os cachos vermelhos desmanchados pelo travesseiro.

Os traços estavam relaxados e aquela linha nervosa que sempre esteve entre suas sobrancelhas franzidas, hoje não estava lá. O sorriso safado que surgiu nos lábios rosados quando ela voltou a olhar para mim, também era novidade. Ela piscou os longos cílios e deu um tampinha atrapalhado ao lado dela na cama, convidando-me.

Respirei fundo e balancei a cabeça para mim mesmo.

— Jesus Cristo.

Ela riu, moleca, e eu procurei me concentrar em tirar suas botas pesadas, ela não poderia dormir usando aquilo.

Consegui tirar um dos pés com dificuldade, já que aquele calçado de salto alto era mais apertado do que eu tinha imaginado. Quando me apoiei na cama para tirar a segunda bota, Melissa me puxou pela camisa, fazendo-me deitar em cima dela.

— Melissa... – repreendi, tentando me levantar.

Ela manteve as mãos firmes na minha roupa e esfregou o nariz no meu rosto.

— Sabe o que é triste? – perguntou baixinho.

Seu tom embargado chamou a minha atenção. Mesmo tentando puxar a camisa de volta e me apoiando em um dos braços para não depositar todo o peso sobre ela, eu ergui o rosto, olhando em seus olhos nublados quando ela voltou a falar.

— Se você tivesse apenas se importado o suficiente para tentar me conhecer... Se tivesse sido um cara legal e tivesse me respeitado... Se você tivesse trocado algumas palavras comigo, tivesse se apresentado, dito que gostou dos meus olhos ou o meu sorriso... – engoliu em seco, aproveitando da minha distração para me abraçar com as pernas.

Melissa ofegou em aprovação quando me entrelaçou contra ela. Eu mesmo tive que me concentrar para não fechar os olhos e aproveitar a sensação de estar entre suas coxas quentes.

— Se você tivesse sido diferente, eu teria dito sim.

Arregalei os olhos, surpreso, e tentei me levantar mais uma vez.

— Melissa...

— Eu teria ido a um encontro com você – voltou a me puxar, subindo as mãos por meus ombros, dedilhando a minha nuca e embrenhando os dedos nos meus cabelos. — Teria feito alguma piada ruim que você não ia gostar, referências nerds que você não ia entender e elogios sobre você que não ia acreditar... Eu teria deixado você se aproximar, teria te deixado entrar e me conhecer... A verdadeira Melissa.

Abri a boca, perplexo, sem saber o que pensar. Mel deu um sorriso triste, os glóbulos brilhavam de forma melancólica, e ela esfregou o nariz no meu, o hálito quente batendo no meu queixo.

— E eu teria feito isso há mais tempo – soprou antes de me puxar e colar os lábios nos meus.

Ela fechou os olhos, eu arregalei os meus.

Melissa se enroscou no meu corpo e me beijou com aquela boca quente e macia. Ela nunca tinha estado tão perto antes. Seu cheiro, seu calor, suas pernas ao meu redor...

Tudo o que eu queria era realmente beijá-la. Abrir a boca e encontrar a sua língua, descobrir o seu gosto. Mas eu sabia que não devia, sabia que não podia tirar proveito dela naquele estado vulnerável, e esse pensamento me fez abrir os olhos que eu nem tinha notado que tinha fechado.

Mel aos poucos escorregou a boca da minha até arfar embaixo de mim. Sua cabeça descansou sobre o travesseiro e o abraço das suas coxas afrouxou.

Mantive-me debruçado sobre ela por mais um segundo, correndo o olhar por suas linhas adormecidas antes de respirar fundo e me colocar de pé.

Eu não entendi por que o meu rosto estava formigando. E por que eu me senti tão imundamente culpado pelo o que ela tinha dito. Mas, mesmo sem compreender, mesmo atônito, eu engoli em seco e finalmente tirei a sua outra bota, cobrindo a garota inconsciente na minha cama.

— Desculpe – pedi, sabendo que ela não podia mais me ouvir.

Busquei a chave no meu bolso e fui até a escrivaninha, abrindo a gaveta.

Peguei a correntinha dourada entre os meus pertences, passando o dedo pelo resquício de terra que insistia em permanecer no pingente de coração.

Não havia sido fácil achar o colar de Mel. Não estava no lago dos patos como ela tinha suspeitado, mas sim, no lamaceiro próximo à entrada da fazenda de Zayn.

Sentei-me na beirada da cama, ouvindo a respiração dela aos poucos ficar mais e mais profunda. E pelo resto da noite, eu continuei ali, pensativo, tentando ler a história da verdadeira Melissa naquela simples correntinha.

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Fuck Me [HS]Onde histórias criam vida. Descubra agora