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Camila

Cheguei em frente a casa de Madalena em minha moto e vi, um pouco a frente, o carro de sua mãe saindo.

Passei a noite toda me revirando na cama, sem conseguir pregar os olhos. Há todo o instante as imagens de sua mãe a arrancando de meus braços, de suas lágrimas através do vidro e o carro levantando poeira ao partir, povoavam minha mente, numa repetição contínua.

Carlos e tia Paula conversaram comigo e me disseram para ter paciência e inteligência para lidar com a situação da melhor forma possível e assim conseguir resolver isso sem que eu e, principalmente, Madalena saíssemos mais machucadas ainda. Mas, vai falar isso para meu coração?

Passei a noite inteira imaginando também maneiras de "resgatá-la" de sua casa. Talvez invadir quando todos estivessem fora e levá-la para longe?! Seria uma saída válida, como essas de cinema ou de séries de TV, onde o casalzinho apaixonado foge de casa para ficarem juntos.

"Acordei" cedo, saindo da cama às 5:10 da manhã. Fiz meu asseio matinal, vesti uma roupa mais quentinha, afinal o dia estava cinza devido as nuvens.

- O dia parece refletir meu ser. - Sussurrei de pé, próxima a piscina, olhando o céu nublado sobre minha cabeça.

Suspirei fundo, passando as mãos em meu rosto e me sentei na espreguiçadeira, deixando meu corpo cair desamparado sobre ela.

Minha mente começou a vagar por todos os momentos bons que tivemos desde que nos conhecemos. Ela era arredia comigo inicialmente, desde o começo evitava interação comigo, mas sempre tinha seus olhos curiosos sobre mim.

Sorri ao lembrar da cachoeira, o primeiro lugar onde troquei algumas palavras com ela. Todos estavam na água e ela estava de pé do lado de fora, ainda vestida, e eu, no meu atrevimento, a molhei, obrigando-a a entrar.

Nossas mãos juntas naquela matinê de carnaval no pequeno clube de Campos dos Ventos. Teve também o dia que ela me explicou o significado do nome do distrito. 'Está vendo as copas das árvores? Olha como elas formam um campo esvoaçante quando o vento bate!' Disse, deitada em minha cama enquanto apontava para as árvores que balançavam harmonicamente através da grande janela de vidro. 'Se você olhar acima daquele morro, você vê um vale e essas árvores balançando assim... daí veio o nome de Campos dos Ventos.' Finalizou com um sorriso lindo nos lábios, me fazendo rir e abraçá-la.

"Que saudade do seu sorriso!" pensei inspirando o ar com força e sentindo uma dor pungente em meu peito.

- Suas lágrimas não podem ser a última lembrança que tenho... não! Não vou ter lembrança de ninguém nos afastando... - Falei determinada e me levantei correndo, indo até a garagem.

No dia anterior, fiquei tão aturdida, que havia deixado a moto na casa de Bruna. Não tinha cabeça para pilotar, mas Carlos a buscou para mim, a estacionando no seu lugar.

Peguei a chave reserva no painel, meu capacete e saí pelas ruas. Não podia deixar isso assim, eu precisava vê-la, precisava ir até sua casa e enfrentar sua família. Não era justo ela ficar lá, desamparada, enquanto eu fico aqui, me remoendo e imaginando o que está acontecendo com ela. Essa luta era nossa, não só dela!

Era cedo, ainda não tinha dado nem 6:30 quando percorri as pequenas ruas do distrito, a toda pressa, para conseguir chegar o mais rápido possível, para alcançar sua casa e, se fosse preciso, brigaria com todos, mas não sairia de lá sem vê-la.

Agora, como dito, cheguei e vi o carro de sua mãe indo em direção contrária. João, com um sorriso que me deu nos nervos só de vê-lo, estava de pé em frente ao portão, me olhando descer da moto e retirar o capacete.

Campos dos Ventos (Romance Lésbico)Onde histórias criam vida. Descubra agora